Caro E.
Aí está você, caro amigo. Imbatível, infatigável, incorruptível… Despacha azafamado suas cartas urbanas, gizando uma cartografia humana e social apinhada de significados. Desce a ladeira lotado, esparramando sentidos!

Eu estou aqui mesmo – cansado, com a boca escancarada e cheia de dentes, esperando a banda passar.
Dr. Ermitânio sempre me diz, num abuso de sua paráfrase predileta: “é preciso matar a morte!”. Quando desafiado, emparedado por alguma charada metafísica, brada: “matar-me podes; mais do que isso, não!”.
Acho que nunca lhe apresentei o velho Ermitânio Prado. Ao meu lado cochila, esparramado na cadeira Sheriff. Subiu embalado pelas gotinhas que caem nesta manhã plúmbea. Esquece da gota, que tanto o flagela.
Dr. Ermitânio Prado, advogado e sócio fundador do Clube Inglês, instalado por longos anos no casarão que pertenceu à D. Veridiana – agora um prédio qualquer cadastrado e tombado pelo Condephaat e que já não serve pra mais nada… Velho empedernido, conselheiro do Jockey, leitor das Seleções Reader´s Digest. Ultimamente anda aborrecido com as teses de doutorado de história – papelada a que se dedica com furor de enciclopedista. Pesquisa a nossa Medicina Animæ à busca de laivos, mais do que livros, como quem cata piolhos.
O Leão do Jockey se aborrece com as teses de história. Sempre diz que é jornal de anteontem que jamais foi publicado e brada de seu estrado: “O Eldorado das ciências históricas é o derruimento babélico dos sentidos pela construção de uma novilingua!”.
Sobre as categorias do materialismo dialético, implica:
– A chave geral é tão útil para o sistema quanto fornicar uma rameira para manter sua virgindade! A categoria das categorias, o princípio mais principal das ciências sociais, é sua chave essencial em busca de uma fechadura que jamais se fecha!
Revoluteia perigosamente a bengala e a aponta em riste:
– Fechadura que não se fecha nem se abre! Falsidade solerte! Nem é fechadura; nem abertura. É certa ciência que sonha que é chave e fechadura em si mesma!
Para ele, a academia excretou uma história pretensiosa: “com suas categorias alquímicas, transubstanciou os sentidos e fez o ouro dos tolos”.
Desfere um golpe certeiro com o bastão adornado e encara ameaçadoramente o maço de papel borrado de história.
Penso que a história já era!