Registro de imóveis eletrônico – uma reflexão tardia?

Flauzilino

Flauzilino Araújo dos Santos

O Sistema de Registro de Imóveis foi constitucionalizado como um dos pilares garantidores do Estado Democrático de Direito e a âncora para a concretização do direito de propriedade e de sua função social. A opção do constituinte nacional foi a de manter um serviço público exercido em caráter privado, conforme artigo 236, da Constituição Federal. Nesse modelo, a outorga administrativa da delegação do serviço público é somada ao seu exercício em caráter privado, de sorte que princípios empresariais autônomos próprios do setor privado são somados com critérios administrativos de prestação, regulamentação e fiscalização de serviços públicos. O resultado é a prestação de um serviço público iluminado por valores, princípios e procedimentos empresariais inerentes à iniciativa privada.

Realmente, o Registro de Imóveis é um instrumento da sociedade brasileira, na medida em que protege o cidadão no seu direito fundamental à propriedade, até mesmo em face do próprio estado, quando esse direito é ameaçado. Mas é, também, pela solidez alcançada como instituição jurídico-social, no plano normativo, doutrinário, jurisprudencial e alto grau de confiança popular. As pessoas confiam no Registro de Imóveis!

Assim, pode ser dito que o Registro de Imóveis é um player importante na competitiva cadeia dos negócios imobiliários, por seu apoio ao funcionamento do mercado. O mercado imobiliário é um mercado econômico, mas é, também, um mercado de direitos. O Registro de Imóveis não cria o mercado, mas é uma ferramenta sem a qual este não pode desenvolver-se adequadamente, visto que contribui para sua expansão sustentável, relativamente aos itens que lhe correspondem: segurança jurídica e transparência dos negócios inerentes. A transparência decorrente da publicidade registral faz com que o mercado seja, como um todo, mais confiável e eficiente.

O que é ruim para os Estados Unidos é péssimo para o Brasil.

Chain of titleUm amigo enviou-me a indicação de um livro recentemente lançado nos Estados Unidos e que rendeu uma pequena resenha na FSP do dia de hoje (2/7). Trata-se do Chain of Title: How Three Ordinary Americans Uncovered Wall Street’s Great Foreclosure Fraud, de David Dayen.

Logo pensei na expressão de Juracy Magalhães que fez fortuna na época da ditadura militar: “o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”?

O sistema hipotecário norte-americano (e seus complexos modelos de securitização e mobilização do crédito imobiliário), chama a atenção por influenciar, ainda hoje – após o cataclismo norte-americano -, o mercado brasileiro.

Com a legitimação de recentes decisões de tribunais superiores dá-se um grande impulso a tendências emulativas de registros públicos por empresas de informação. Falo especificamente da recente decisão do STF que reconheceu a validade jurídica de registros administrativos. Em recente julgamento, o ministro Marco Aurélio entendeu inexistir um conceito constitucional fixo, determinado e estático de registro público. Segundo ele “compete à lei ordinária a regulação das atividades registrais”, abrindo as portas pra criação de registros de segurança jurídica por mera iniciativa legislativa. O art. 236 da CF foi relativizado (comentários aqui).

Cláudio Machado é um amigo atento. Soube identificar os elos que nos ligam ao fragoroso colapso do sistema hipotecário norte-americano e seu modelo de registro eletrônico posto nas mãos de instituições financeiras. Ele, que não é da área registral imobiliária, sabe que algo assim está em marcha no Brasil com os recentes regulamentos do Banco Central do Brasil afiançando sistemas de registros de direitos privados, organismos paralelos e homólogos aos velhos e bons Registros Públicos. Já tive ocasião de comentar (e criticar) essa tendência. Uma série de artigos sobre o assunto pode ser consultado aqui.

Vemos agora que além da fraude de identidade (identity theft – artigos aqui) temos a “fraude do despejo”, fase terminal de complexos processos de cessão de direitos que acabam na titularidade de credores completamente desconhecidos dos devedores e deixados sem qualquer rastro nos sistemas de registro. Algo assim ocorre aqui mesmo, no Brasil, fato que comentei e critiquei em Registro público de imóveis eletrônico: riscos e desafios, escrito em parceria com Fernando P. Méndez González e Ricardo Dip (São Paulo, Quinta Editorial, 2012, 167 p.).

O modelo americano, impulsionado pelo seu impressionante MERS – Mortgage Eletronic Registry System (em tradução livre: Sistema de Registro Hipotecário Eletrônico), representou, segundo Dayen “o maior atentado contra o direito do consumidor já ocorrido nos EUA”.

O exemplo americano pode ser pedagógico para os brasileiros. Estamos emparedados e sob cerrado ataque estatizante (como no paradigmático Projeto SINTER e sua infraestrutura de captura de dados registrais – v. série de comentários aqui) ao lado de tendências privatizantes radicais, retirando os registros da órbita das atividades públicas, reguladas e fiscalizadas pelo Poder Judiciário, depositando-as em discretos e opacos bancos de dados de empresas transnacionais.

Toni Sciaretta na FSP recomenda o livro que, segundo ele, explica didaticamente o funcionamento do crédito imobiliário norte-americano. O ponto alto do livro, diz, “é discutir a vergonha que o americano de classe média sente de ficar com o nome sujo na praça e de ser despejado”.

Poderia inverter a blague e dizer, com uma nesga de tristeza: o que é ruim para os Estados Unidos é péssimo para o Brasil.

V. Livro mostra lado cruel da crise das hipotecas nos EUAresenha de Toni Sciaretta, FSP de 2.7.2016.

Seminário usucapião em debate

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Sérgio Jacomino – Presidente da ABDRI

Carta do Presidente da ABDRI

Prezados colegas, amigos e amigas.

Esta carta é dirigida a todos os que prestigiaram o nosso evento e àqueles que, por esgotamento das vagas, não puderam estar conosco no evento Usucapião Extrajudicial – colóquio Gilberto Valente da Silva.

Esta é uma uma carta de agradecimento, prestação de contas e um convite à reflexão.

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ABDRI abre vagas para pesquisadores

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Grupo de pesquisa e produção científica
sob a coordenação do Prof. Dr. Leonardo Brandelli

A ABDRI – Academia Brasileira de Direito Registral Imobiliário abre inscrições para o grupo de pesquisa e produção científica, sob a coordenação do Prof. Dr. Leonardo Brandelli, com vistas à produção de material científico de qualidade para publicação nas áreas de Direito Registral, Direito Civil, e Direito Notarial.

Os encontros terão periodicidade mensal, e ocorrerão na biblioteca pessoal do Prof. Dr. Leonardo Brandelli ou na biblioteca da Academia Brasileira de Direito Registral.

O processo seletivo consistirá em entrevista e análise do curriculum vitae.

Número de vagas: 10.

Restrição: o interessado não poderá estar inscrito no concurso para outorga de delegações em andamento.

Data para inscrição: De 15 de março a 15 de abril de 2016.

Os interessados deverão preencher o formulário abaixo e aguardar contato para envio de curriculum vitae. 

Coimbra – lição de sonho e tradição

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Inscrições abertas

Entre os dias 19 e 20 de abril de 2016, na Faculdade de Direito de Coimbra, Portugal, juristas e acadêmicos estarão reunidos para mais um encontro acadêmico tendo por objeto os direitos reais, registrais e notariais.

Evento tradicional, que consolida os laços de amizade e cooperação, Coimbra acolhe juristas portugueses e brasileiros que aprofundam o diálogo jurídico que nos une em tradição e atualidade.

“O Atlântico nos une”, como registrou o Professor Doutor José de Faria Costa.

Bem vindos!

Mónica Jardim
Presidente do CeNoR

INSCRIÇÕES: III Encontro de Direitos Reais, Direito dos Registros e Direito Notarial (https://lusobrasileiro.wordpress.com/).

 

Encontro discute direitos reais em Coimbra

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Vem aí o III Encontro de Direitos Reais, Direito dos Registros e Direito Notarial organizado pelos CeNoR – Centro de Estudos Notariais e Registrais da Universidade de Coimbra, Escola Superior do Ministério Público de São Paulo, Academia Brasileira de Direito Registral Imobiliário, ARISP – Associação de Registradores de Imóveis de São Paulo e Conselho Federal do Colégio Notarial do Brasil.

Anote em sua agenda:

Data: 19 e 20 de abril de 2016

Local: Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra – Portugal

Dentre os temas programados, destacamos:

  • Ata Notarial e Certificado Notarial.
  • Mandatos – alienação de bens imóveis – requisitos e formalidades. A questão de aferição da capacidade das partes.
  • A união homo-afetiva ou pluri-afetiva no Brasil e a União de fato entre pessoas do mesmo sexo em Portugal e a intervenção notarial.
  • Direitos Reais de Garantia, “ônus” e garantias ocultos.
  • Ideias Fundamentais sobre o trust imobiliário.
  • Direito Registral e Urbanismo.
  • Usucapião administrativo – o novo CPC brasileiro e a experiência
    portuguesa.

 

Confirmaram sua presença os seguintes palestrantes, moderadores e debatedores: Prof. Doutora Mónica Jardim, Presidente do CENoR, Dr. José Ascenso Maia, Representante do Conselho Diretivo do IRN, Mestre João Maia Rodrigues, Bastonário da Ordem dos Notários, Desembargador Luís Paulo Aliende Ribeiro, Dra. Tânia Mara Ahualli, magistrada em São Paulo, Dr. Sérgio Jacomino, Presidente da ABDRI, Dr. Ubiratan Pereira Guimarães, Presidente do Conselho Federal do Colégio Notarial do Brasil, Dr. Francisco Raymundo, Presidente da ARISP, Dra. Denise Viana Nonaka Aliende Ribeiro, advogada, Dra. Maria Beatriz Furlan, notário em SP, Dra. Ana Paula Frontini, notária em SP, Dr. João Menezes, Dr. Josué Modesto Passos, magistrado em SP, Mestre Geraldo Ribeiro, Doutor Marcelo Benacchio, magistrado em SP, Dra. Laura Ramirez, Mestre Carlos Fernando Brasil Chaves, Mestre Rafael Vale e Reis, Dr. Rafael Depieri, Dr. Alberto Gentil de Almeida Pedroso, Dr. José Marcelo Tossi Silva, Mestre Afonso Patrão, Doutor George Takeda, registrador em SP, Dra. Elaine Barreira Garcia,. promotora de Justiça em SP, Dra.Madalena Teixeira, Margarida Costa Andrade, Mestre Dulce Lopes, Prof. Doutora Fernanda Paula Oliveira, Doutor Leonardo Brandelli, Dr. Daniel Lago Rodrigues.

Na ocasião será celebrado o convênio de colaboração acadêmica entre o CENoR e a Escola Superior do Ministério Público de São Paulo.

Aguarde maiores informações em breve.

Encontro internacional de registradores acolhe Chile

IMG_9251Reunidos hoje em Dubai os representantes do CeNoR – Centro de Estudos Notariais e Registrais de Coimbra, IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil, Corpme – Colégio de Registradores e Mercantis de Espanha e Corporação Chilena de Estudos de Direito Registral, por seus representantes Madalena Teixeira, acompanhado de Sérgio Jacomino, João Pedro Lamana Paiva, Fernando P. Méndez González e Luís Maldonado, por unanimidade, deliberaram a inclusão do Chile no grupo de estudos integrado pelos países antes referidos.

Em rápida cerimônia os países membros deram as boas-vindas a Chile, que sediará o encontro de 2017.

O tradicional vínculo entre Portugal e Brasil e Espanha, que se renova há muitos anos no Encontro Luso-Brasileiro-Espanhol de Direito Registral, agrega agora o importante país sul-americano, o que certamente valorizará os encontros que se acham em sua 11ª edição.

O próximo encontro se realizará em Santa Catarina, Brasil. O seguinte, de 2017, será sediado no Chile.

Em breve daremos mas informações.

Usucapião em debate – seminário em SP

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A ABDRI – Academia Brasileira de Direito Registral Imobiliário tem a honra de anunciar o seminário Usucapião Extrajudicial em Debate, a realizar-se no dia 5 de março de 2016, em São Paulo, Capital. Confira abaixo as informações preliminares.

Ficha de inscrição

Preencha o formulário abaixo e aguarde o nosso contato.

VAGAS ESGOTADAS

Em virtude da grande procura, as vagas foram preenchidas.

A inscrição, a partir de agora, comporá uma lista de espera. Havendo desistências, as vagas serão preenchias pela ordem de inscrição.

Agradecemos  o interesse e a compreensão.

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ABDRI recebe Comissão de Desburocratização do Senado

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ABDRI recebe Comissão de Juristas do Senado Federal

Estiveram presentes, pela Comissão: Otávio Luiz Rodrigues Jr., professor doutor de direito civil da Universidade de São Paulo; Daniel Vieira Boggia Soares, do Instituto Hélio Beltrão; Luciana Leal Brayner, Procuradora da Fazenda Nacional; Aristóteles de Queiroz Câmara, integrante da Comissão de Juristas do Senado Federal.

Os membros da Academia presentes foram: Sérgio Jacomino, registrador e Presidente da ABDRI; des. Luís Paulo Aliende Ribeiro, desembargador do TJSP; Leonardo Brandelli, registrador e coordenador editorial do IRIB; Daniel Lago Rodrigues, registrador e Secretário Geral da ABDRI; Antônio Ranaldo Filho, registrador em SP.; Flauzilino Araújo dos Santos, registrador e Vice-Presidente da ARISP; Patrícia André de Camargo Ferraz, registradora e coordenadora editorial da AnoregBR; George Takeda, registrador e membro da diretoria da ARISP.

Como convidado especial, compareceu Dom Fernando P. Méndez González, registrado espanhol, diretor de relações internacionais do Colégio de Registradores de Espanha.

A reunião transcorreu com muitos e francos debates e foi considerada por todos como muito proveitosa. Foram apresentados vários projetos que visam modernizar e desburocratizar os processos de registro de imóveis.

Fernando Méndez González iniciou os trabalhos com uma breve exposição das recentes experiências dos registradores europeus em face das transformações tecnológicas pelas quais tem passado os registros de imóveis do bloco. Fernando foi o fundador da Associação Europeia de Registradores de Imóveis (ELRA – European Land Registry Association) além de ter colaborado com instituição dos registros públicos na Federação Russa.

Sob a coordenação de Leonardo Brandelli, os registradores apresentaram vários projetos de reforma legal, realizando uma exposição dos motivos que fundamentam as propostas.

A Comissão de juristas do Senado Federal receberam muito bem as propostas e convidaram os registradores para participar das reuniões da Comissão.

Segundo Jacomino, “a interlocução com os membros da Comissão de Juristas foi muito proveitosa e esclarecedora. Os registradores presentes souberam sustentar as ideias de reforma do sistema registral, defendidas pelos juristas presentes, preservando e valorizando os eixos fundamentais sobre os quais o Registro de Imóveis se assenta. Somente assim poderemos caminhar com segurança no sentido de aperfeiçoar o nosso sistema que tão bons serviços tem prestado à sociedade brasileira”.

Em breve daremos novas informações sobre os projetos.

Fotos: acesse aqui (by Carlos Petelinkar).

Bens coletivos e individuais – breves considerações

by Ulysses da SIlva*

Não é fácil identificar o estágio da evolução da espécie humana em que o homem conscientizou-se da existência de  bens  individuais e coletivos. O que sabemos é que, nos primeiros tempos, contados em muitos milhares de anos, ele vivia em grupos,  deslocava-se de um lugar para outro, dependia da caça e da coleta de frutos para sobreviver em um mundo hostil e ninguém era dono de nada. É possível prever, entretanto, que  já começava a se esboçar em sua  mente a distinção entre bem particular, como a sua lança, e bem comum, como a caverna onde o grupo se abrigava.

O tempo seguiu o seu curso e, por volta de 12.000 anos atrás, uma revolução alterou o destino do homem errante, caçador e coletor, fazendo-o sentir a necessidade de mudar o seu comportamento em relação à natureza. Iniciou, então, o plantio de grãos para alimentação,  a criação de animais úteis e a construção de casas individuais nas proximidades das plantações. Com o progresso da agricultura, logo passou a  perceber, com um pouco mais de clareza, a  diferença entre os seus próprios bens e os da coletividade.

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