Code is law e as libélulas do Tio Jaca

dragon

Já lhes falei do Tio Jacaré. É um velho tio, irmão mais velho de minha mãe (Deus a tenha) e que vive nos fundos de nossa casa. Já nem sei quantos anos possa ter. Sempre esteve ali, imóvel, feito uma inscrição na pedra, parece jamais se desvanecer no tempo. Diz que se alimenta de mel, castanhas e, à tardinha, toma o seu chá de romãs. Ama teias de aranha e decifra os intrincados mosaicos inscritos nas asas das libélulas – “nelas se acha inscrito o sentido da vida”, sussurra. O velho cumprimenta as mandrágoras, saúda os pequenos lagartos e caça cometas nas noites escuras.

Deixem-me lhes dizer que ontem cruzei com o tio no fundo do jardim. Gosta de me provocar, o velho. E foi logo dizendo:

Code is law – diz o professor Lawrence Lessig. Você sabe… a depressão dos registros públicos favorece a indústria da informação. As máquinas impõem seu código e “naturalmente” as suas regras. A sua eficácia decorre do poder de império das máquinas e de seus programadores. Esse poder será emanação de um hiperestado que se forma na nuvem de elétrons.

“Um Leviatã de silício”, empolguei-me. No topo da pirâmide de Kelsen, um algoritmo de inteligência artificial, distribuindo justiça, ordem e estabilidade aos caos… Ele me interrompe solenemente:

– O código suplantará o homem? Diga-me, Cartophylax?! Já não será possível a filosofia, nem mesmo a religião? Tudo estará encerrado num saco atômico em cujos portais os sentidos humanos depõem seus instrumentos de percepção? Não nos restará mais do que encerrar-nos sob a cogula e viver como o Camponês do Garona – “un vieux laic s’interroge à propos du temps présent”.

Não sei, Tio, não sei de nada disso.

Não sei, Tio, não sei de nada disso.

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