Legitimação de posse à brasileira

Venho insistindo, há anos, que o problema de grilagem de terras não pode ser enfrentado com base em estúpidos preconceitos. O mais resistente deles, o mais entranhado na comunidade jurídica, é aquele que identifica nos cartórios a matriz essencial da grilagem de terras.

Vale a pena ler atentamente a reportagem abaixo. Nela se compreenderá que é preciso inteligência e coragem para enfrentar o real problema de legitimação de posse à brasileira.

Quem não tem culpa no cartório, que atire a primeira pedra!

BRASÍLIA (DF) – Sem poder para mandar prender integrantes de uma máfia de grileiros com atuação no Amazonas, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) “expropriou” as terras que eram ilegalmente negociadas pelo grupo e devolveu, em setembro, 587 mil hectares de terras griladas na região ao governo federal, uma área do tamanho do Distrito Federal.

Os imóveis, localizados no município amazonense de Pauini, ficam em área de segurança nacional e eram grilados num esquema complexo que envolvia cartórios, empresas privadas e, segundo desconfiam procuradores federais, também juízes do Amazonas. As terras griladas eram vendidas para empresas, principalmente de Mato Grosso do Sul e de São Paulo, que tinham consciência das irregularidades, mas estavam interessadas em usar o terreno para negociar com a União o abatimento de dívidas com o INSS.

O esquema começava com a disputa por um terreno menor, nesse caso de 1.400 hectares, localizado no município de Pauini. Os grileiros ocupavam a região, entravam na Justiça comum com ações por usucapião e demarcação de terra, registravam a propriedade em diversos cartórios sem nenhum documento que comprovasse a posse da área e, a partir daí, iniciavam um processo de aumento e “clonagem” das terras. A cada registro novo que faziam da mesma terra em cartório diferente, aumentavam a extensão da propriedade. O terreno que antes media 1.400 hectares chegou, por esse caminho, a 640 mil hectares.

Após toda essa seqüência de ilegalidades, juízes de primeira instância do Amazonas proferiam decisões confirmando a transferência das terras da União para particulares. Era o último passo para coroar o esquema de grilagem. Além das irregularidades flagrantes do processo, os juízes passavam por cima da legislação para dar ganho de causa aos grileiros. Como as áreas eram de segurança nacional, qualquer decisão desse tipo cabia à Justiça Federal. Os juízes, portanto, não tinham competência para analisar os casos.

“Constata-se que, embora houvesse toda a gama de precedentes de prática de grilagem no Amazonas, o procedimento adotado pelo Conselho da Magistratura do Estado do Amazonas no presente caso foi contrário à lei, merecendo rigorosa interferência desse Conselho Nacional de Justiça”, argumentaram no pedido encaminhado em abril ao CNJ.

O conselheiro Antonio Umberto, relator do caso no CNJ, confirmou que a Justiça do Amazonas cometeu irregularidades e determinou o cancelamento da decisão do Conselho da Magistratura e dos registros nos cartórios de ofício. Porém, nenhum juiz será investigado ou punido.

Em 2001, o Ministério do Desenvolvimento Agrário pediu à Corregedoria-Geral de Justiça do Tribunal de Justiça do Amazonas o cancelamento dos registros dos imóveis nos cartórios. Uma comissão especial foi criada para investigar e corrigir as irregularidades. Essa comissão cancelou uma das matrículas da terra, que aumentara a extensão da gleba para 640 mil hectares, mas esqueceu-se de anular as inscrições anteriores. Com isso, uma matrícula anterior serviu para procriar novas matrículas ilegais que ampliaram as terras para 587 mil hectares.

Perdido no cipoal jurídico do Estado, o caso chegou ao CNJ por representação dos procuradores do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

16/10/2008 20:15 – NG/GR/TERRAS GRILADAS/AMAZONAS
CNJ devolve a governo federal terras griladas no Amazonas
Por Felipe Recondo

Brasília, 16 (AE) – Sem poder para mandar prender integrantes de uma máfia de grileiros com atuação no Amazonas, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) “expropriou” as terras que eram ilegalmente negociadas pelo grupo e devolveu, em setembro, 587 mil hectares de terras griladas na região ao governo federal, uma área do tamanho do Distrito Federal.

Os imóveis, localizados no município amazonense de Pauini, ficam em área de segurança nacional e eram grilados num esquema complexo que envolvia cartórios, empresas privadas e, segundo desconfiam procuradores federais, também juízes do Amazonas. As terras griladas eram vendidas para empresas, principalmente de Mato Grosso do Sul e de São Paulo, que tinham consciência das irregularidades, mas estavam interessadas em usar o terreno para negociar com a União o abatimento de dívidas com o INSS.

O esquema começava com a disputa por um terreno menor, nesse caso de 1.400 hectares, localizado no município de Pauini. Os grileiros ocupavam a região, entravam na Justiça comum com ações por usucapião e demarcação de terra, registravam a propriedade em diversos cartórios sem nenhum documento que comprovasse a posse da área e, a partir daí, iniciavam um processo de aumento e “clonagem” das terras. A cada registro novo que faziam da mesma terra em cartório diferente, aumentavam a extensão da propriedade. O terreno que antes media 1.400 hectares chegou, por esse caminho, a 640 mil hectares.

Após toda essa seqüência de ilegalidades, juízes de primeira instância do Amazonas proferiam decisões confirmando a transferência das terras da União para particulares. Era o último passo para coroar o esquema de grilagem. Além das irregularidades flagrantes do processo, os juízes passavam por cima da legislação para dar ganho de causa aos grileiros. Como as áreas eram de segurança nacional, qualquer decisão desse tipo cabia à Justiça Federal. Os juízes, portanto, não tinham competência para analisar os casos.

“Constata-se que, embora houvesse toda a gama de precedentes de prática de grilagem no Amazonas, o procedimento adotado pelo Conselho da Magistratura do Estado do Amazonas no presente caso foi contrário à lei, merecendo rigorosa interferência desse Conselho Nacional de Justiça”, argumentaram no pedido encaminhado em abril ao CNJ.

O conselheiro Antonio Umberto, relator do caso no CNJ, confirmou que a Justiça do Amazonas cometeu irregularidades e determinou o cancelamento da decisão do Conselho da Magistratura e dos registros nos cartórios de ofício. Porém, nenhum juiz será investigado ou punido.

Em 2001, o Ministério do Desenvolvimento Agrário pediu à Corregedoria-Geral de Justiça do Tribunal de Justiça do Amazonas o cancelamento dos registros dos imóveis nos cartórios. Uma comissão especial foi criada para investigar e corrigir as irregularidades. Essa comissão cancelou uma das matrículas da terra, que aumentara a extensão da gleba para 640 mil hectares, mas esqueceu-se de anular as inscrições anteriores. Com isso, uma matrícula anterior serviu para procriar novas matrículas ilegais que ampliaram as terras para 587 mil hectares.

Perdido no cipoal jurídico do Estado, o caso chegou ao CNJ por representação dos procuradores do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). (Agência Estado)

16/10/2008 – CNJ devolve a governo federal terras griladas no Amazonas

Data: 16/10/2008 – Veículo: DIÁRIO DO PARÁ – PA
Editoria: REGIONAL 

http://www.linearclipping.com.br/funai/detalhe_noticia.asp?cd_sistema=45&codnot=529210

2 comentários sobre “Legitimação de posse à brasileira

  1. Alguém deveria se debruçar sobre o problema dos “ciclos de concessão de usucapião”. Em síntese: a propriedade é,hoje, adquirida por meio da prescrição aquisitiva, mas nos anos seguintes, será transmitida por meio de esquálidos contratos particulares (as famosas “escrituras particulares”); daqui a vinte, trinta anos, nova sentença declaratória de usucapião será exarada; e assim sucessivamente. No caminho, quebra a toda sorte de princípios registrais!

  2. Caro Lafaiete.
    Além do usucapião cíclico, usado como remédio para a doença causada pela total falta de respeito aos profiláticos princípios registrais e notariais, ainda temos a fomentar os grilos, a total desidia da União, dos Estados e Municípios em começar e terminar as discriminatórias (nas 3 fases) de terras devolutas. Estou num município onde 70% ainda é terra devoluta não discriminada e nos outros 30% ainda não se encerram a demarcação e legitimação das posses, dando margem a uma sem fim de cessões de direitos possessórios e hereditários que sequer passam perto das portas dos Registros de Títulos e documentos.
    Pior de tudo, contudo, é ouvir dos doutos e proprietários que “ali é tudo assim mesmo e está tudo certinho”
    Conviveremos com este barulho até quando??

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