Simulação e a qualificação registral – bis

Neste mesmo blogue lançamos a seguinte questão: pode o registrador qualificar um título de venda e compra, de extração notarial, e impedir o seu acesso baseado em elementos que levam à convicção de tratar-se de simulação? O texto pode ser visto aqui.

Posteriormente, no DJe de 12.9.2016, a Corregedoria-Geral de Justiça de São Paulo foi instada a decidir um caso em que o tema da ocorrência de eventual simulação foi enfrentado e a decisão, neste caso concreto, foi em sentido contrário à anteriormente debatida.

Façamos desde logo uma advertência. Não se trata, aqui, de censurar ou de criticar as decisões que os registradores, em sua ordem, tomaram no exercício regular de sua função. Ambas as posições são respeitáveis. A lei garante a independência jurídica do profissional do direito que atua na qualificação dos títulos (art. 28 c.c. art. 3º da Lei 8.935/1994). O objetivo destas breves considerações é eminentemente acadêmico.

O tabelião de notas e o registrador imobiliário devem deter-se, antes da prática de atos de seu ofício, diante de “fundados indícios de fraude à lei, prejuízo às partes, ou dúvidas sobre as manifestações de vontade”. É a dicção das Normas de Serviço de São Paulo. Não será bastante a suspeita fundada em impressões subjetivas – tanto do notário quanto do registrador.

No caso em tela, o fato de terem sido firmados os instrumentos notariais em dias consecutivos não é motivo suficiente para configurar os “fundados indícios” de fraude à lei. “Não se descarta, frise-se, a possibilidade de ter havido simulação. Porém, não compete ao Sr. Oficial investigar elementos subjetivos inerentes à formação do título”, decidiu a CGJSP.

A r. decisão traz à balha o escólio de Narciso Orlandi Neto:

“Problemas relativos ao consentimento das partes dizem respeito ao título, tanto quanto sua representação e a elaboração material do instrumento. Assim, se houve fraude, se a assinatura do transmitente foi falsificada, se o instrumento público não consta dos livros de nenhum notário, se a procuração que serviu na representação de uma das partes é falsa, se o consentimento do alienante foi obtido com violência, são todos problemas atinentes ao título. Podem afetar o registro, mas obliquamente. Só podem determinar o cancelamento do registro, em cumprimento de sentença que declare a nulidade do título e, em conseqüência, do registro.” (Retificação do Registro de Imóveis, Ed. Oliveira Mendes, pág. 192).

O tema é atual e merece dedicada atenção dos profissionais da fé pública.

Procedimento administrativo disciplinar. Tabelião de Notas. Falta funcional. Simulação – vício de consentimento.

PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR – Suposta simulação contratual, como forma de violar direitos sucessórios – Não cabe ao Sr. Oficial fazer análise minudente das declarações de vontade dos contratantes. Eventual simulação há de ser alegada em vias ordinárias, não se podendo impor ao Sr. Oficial que obstasse o registro. Recurso Desprovido. (Processo CG 0012232-84.2014.8.26.0606, Suzano, j. 9/8/2016, DJe 12/9/2016, des. Manoel de Queiroz Pereira Calças).

Simulação e a qualificação registral

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Pode o registrador qualificar um título de venda e compra, de extração notarial, e impedir o seu acesso baseado em elementos que levam à convicção de tratar-se de simulação?

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis que tem por objeto uma escritura de compra e venda em que o preço do negócio, equivalente a R$ 5.000,00, foi considerado vil, levando-se em consideração que a disparidade entre o valor da venda e o venal de referência, na data do instrumento correspondia a R$ 419.314,00.

O Registrador argumentou que, apesar de denominado compra e venda, o negócio aparenta ser uma simulação, com características de doação. Ressaltou a coincidência dos sobrenomes da vendedora e compradora, “denotando algum grau de parentesco entre elas.”

A magistrada, calcada na doutrina de Carlos Roberto Gonçalves, para quem a simulação é “uma declaração falsa, enganosa, da vontade, visando aparentar negócio diverso do efetivamente desejado” e com fundamento no inc. II do art. 167 do CC., julgou a dúvida procedente e confirmou a denegação do registro. Além disso, deixou consignado na r. sentença que “a consideração de um negócio por outro trará repercussão na esfera tributária” e que ao registrador “cumpre fiscalizar o pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhe forem apresentados em razão do ofício, na forma do art. 289 da Lei nº 6.015/73, sob pena de responsabilização pessoal, salvo hipótese de isenção devidamente demonstrada”.

É certo que pode ainda ocorrer um recurso e o tema seja revisitado pela instância superior.

Compra e venda – simulação. Valor irrisório. Nulidade. Qualificação registral – impostos.Dúvida – simulação de venda e compra – valor do objeto irrisório em face do real – nulidade – procedência. Processo 1062805-07.2016.8.26.0100, São Paulo, j. 12/8/2016, DJe 16/8/2016. Dra. Tânia Mara Ahualli. Legislação: CC art. 167, II; LRP art. 289.