Tempo de simulacros e ilusionismos este em que vivemos. A população consome a seiva informacional hoje tornada tão essencial quanto indispensável para dar um “sentido” às vidas exauridas pelo consumismo e idiotia. Faturar politicamente com os prestímanos de plantão parece ser o exercício político preferido. Trata-se de completa subversão da politicidade.
Um exemplo bastante eloqüente é o Decreto 52.658, de 23 de janeiro de 2008. Um bom regulamento que parte, todavia, de um falso pressuposto. Diz Alencar Burti (Um passo importante):###
“O decreto assinado pelo governador José Serra, por proposta da Comissão Estadual de Desburocratização, presidida pelo secretário Guilherme Afif, dispensando nas repartições públicas o reconhecimento de firma e autenticação de documentos em cartórios, quando não exigidos por legislação específica, representa um passo importante no sentido de reduzir a burocracia para as empresas e os cidadãos em suas relações com o Poder Público do Estado de São Paulo”.
Reduzir a burocracia para as empresas e cidadãos.
Seria interessante lançar um olhar no importante estudo do Banco Mundial Doing business que decompõe o processo de registro nas Juntas Comerciais e o expressa em etapas perfeitamente identificadas. Para se iniciar um negócio no Brasil é necessário consumir algumas etapas. Vejamos algumas delas na Capital de São Paulo:
- Checar a existência de disponibilidade de nome empresarial: 1 dia.
- pagamento de taxas de registro: 1 dia.
- Registro e obtenção do NIRE: 1 dia.
- CNPJ, INSS e Receuita Federal: 1 mês.
- INSS – matrícula: 1 dia.
- Taxa de inspeção: 1 dia.
- Autorização para impressão de notas fiscais: 1 dia.
- Registro no Município de São Paulo (SFDE): 5 dias.
- Registro TFE (Município de SP): 1 dia
- Autorização para impressão de notas fiscais da Secretaria de Finanças e Des. Econômico: 1 dia.
- Notas fiscais com número de CNPJ – impressão: 3 dias.
- Licença do Corpo de Bombeiros: 120 dias
- Inspeção do Corpo de Bombeiros (vide acima)
- Alvará de Funcionamento.
- Registro no PIS: 1 dia.
- Abertura de conta de FGTS: 1 dia.
- Registro no CAGED – Cadastro Geral de Empregados e Desempregados): 1 dia.
- Registro nos sindicatos patronal e empregados: 5 dias.
Ao final consumimos 152 dias para abertura de uma empresa em São Paulo.
Sobre o registro da empresa – o que de perto pertine aos notários e registradores -, o estudo do Banco Mundial aponta:
Depending on the company activities (business or civil), its corporate acts (articles of association and amendments) should be registered either with the Board of Trade Junta Comercial) or with the Registry of Civil Companies. The registration cost for a limited liability company before the Board of Trade of the state of São Paulo is about BRL 60,000. The cost for registration of a limited liability company before the Registry of Civil Companies depends on the amount of corporate capital of the company to be incorporated.
Only for “civil companies” must signatures on articles of incorporation be authenticated before a notary public before registration and filling with a registry of civil companies. To take advantage of expedited registration of the company’s articles of association and amendments with the Board of Trade of the State of São Paulo, most entrepreneurs choose to register either with Sindicato da Micro e Pequena Indústria de São Paulo (SIMPI) at http://www.simpi.com.br/ or with Associação Comercial de São Paulo (ACSP) at http://www.jucespacsp.com.br/.
An additional fee of BRL100 applies for expedited service. In this case, the registration will be completed within 24 hours. The entrepreneur completes the form online (at http://www.jucesp.sp.gov.br/) and takes it with the corporate acts (articles of association and amendments) to be registered with the Board of Trade (Junta Comercial).
For a limited liability company, registering before the Board of Trade of the state of São Paulo costs about BRL 60,000. To accelerate document registration, the Board of Trade of the state of São Paulo is implementing an electronic system that accepts both electronic and physical forms (so far, however, this has not reduced registration time)”.
É inacreditável:
1) Que o serviço de registro mercantil seja agilizado por intermediários. Logicamente, há custos envolvidos e a sobretaxa acaba alimentando um negócio que viceja à margem dos Registros Públicos, com o risco, nada desprezível, de suplantá-los e superá-los, pela progressiva capacitação econômica desses agentes. Trata-se de impressonante estratégia de privataria.
2) Que se tenha institucionalizado a “taxa de urgência” na “Board of Trades”, nossa conhecida Junta Comercial do Estado de São Paulo.
3) Que se indique na tabela que o prazo para registro seja de 1 dia na Jucesp.
Abaixo uma pequena tabela – que pode ser vista aqui na íntegra – em que se sumariza as agruras dos empresários para a constituição de um empresa. A tabela inclui o número de passos necessários para a formalização de uma empresa.
Procedimentos (número): 18 Duração (dias): 152 Custo (% PIB per capita): 10.4.
Notem, especialmente os notários, que o impacto de sua atividade na constituição de uma sociedade é simplesmente desprezível! (principalmente se levarmos em conta as empresas que são registradas na Jucesp, para sermos inteiramente coincidentes com a avaliação do Governo de São Paulo que leva em consideração esses registros).
Conclusões sumárias:
1) A notarização não se acha entre os procedimentos (18), logo não pode ser apontada como a vilã burocrática como que fazer crer vestais governamentais.
2) Dos 152 dias necessários para formalização de um empresa certamente o empresário não consome 1 segundo com a atividade notarial. Eventualmente consumirá umas poucas horas para o registro no RCPJ.
3) O Brasil, por conta dos anéis burocráticos do Estado ineficiente, ocupa a 26a. posição nos países da região, na frente somente de países como Equador, Bolívia, Suriname, Haiti e Venezuela.
Afinal, quem tem culpa nos cartórios?
Caro Dr. Sérgio.
Sobre o assunto, postei em meu blog (rochamauro.blogspot.com) o comentário abaixo reproduzido.
Abraços.
Mauro Rocha.
QUIZ – Quem pagará o pato?
Imagine que a sociedade comercial XYZ Ltda. tenha colocado à venda um determinado imóvel de sua propriedade.
Sabendo disso, o estelionatário José Metralha elabora um falso instrumento de alteração contratual transferindo a gerência e administração da sociedade para os executivos Acerola e Laranjinha, procede ao arquivamento do instrumento na Junta Comercial, aproveitando-se da dispensa legal de reconhecimento de firmas dos efetivos sócios-quotistas e realiza a venda do imóvel para João de Deus, terceiro de boa-fé, mediante escritura lavrada pelo Notário Público, devidamente assinada pelos executivos nomeados e regularmente registrada pelo Oficial de Registro Público competente.
Considerando que, conforme o Governador do Estado de São Paulo, a referida alteração contratual tem o pressuposto da “honestidade e boa-fé e partindo do princípio de que os documentos apresentados são verídicos, sob pena da nulidade dos atos no caso de ocorrer o contrário”, pergunta-se:
Quem arcará com o prejuízo decorrente da nulidade da operação:
(a) O Governador que dispensou o reconhecimento de firmas;
(b) Os membros do Comitê Estadual de Desburocratização, o presidente do Instituto Hélio Beltrão, o presidente da Fecomercio, o presidente da Associação Comercial de São Paulo, o presidente do Sescon/SP, o presidente da Fiesp, o conselheiro e o diretor superintendente do Sebrae/SP e demais comensais presentes à cerimônia de assinatura do referido decreto;
(c) A sociedade comercial XYZ Ltda;
(d) O estelionatário José Metralha e os executivos Acerola e Laranjinha;
(e) O notário e o registrador públicos;
(f) O comprador de boa-fé João Deus.
Responda quem quiser!