Subdelegação de funções e a floração de atividades para-registrais

McLuhan

No post Subdelegação de funções e a subversão do sistema registral e notarial, publicado em 15/9/2018, toquei num tema que parece ter se convertido numa vexata quæstio a suscitar paixões, a dividir opiniões — algumas veiculadas em entidades corporativas de registradores, outras transitadas em círculos estritos de autoridades.

Bom que tenhamos ânimo para discutir e aprofundar temas tão delicados e que podem representar uma mudança significativa no padrão adotado até aqui para o desenvolvimento do que, neste contexto, se chamou impropriamente de Registro de Imóveis eletrônico.

O tema é delicado e sensível porque atrai para o debate público tendências de prefiguração de um fenômeno, que à falta de melhor expressão, tenho qualificado como subdelegação de funções próprias de registradores a células para-registrais. A expressão é adrede provocativa e aponta para um fenômeno que tem chamado muito a minha atenção. Como diz McLuhan, os novos meios tecnológicos não só carregam, mas traduzem e transformam o emissor, o destinatário e a mensagem (Mcluhan. Marshsall. Understanding media – the extensions of Man. Cambridge: MIT, 1994, p. 90).

O advento de novos meios de comunicação e informação e sua assimilação pelos notários e registradores tem transformado o próprio sistema notarial e de Registro de Imóveis, e poucos se têm dado conta deste fato e das implicações jurídicas e tecnológicas daí decorrentes.

Um bom exemplo é a formação e consubstanciação de títulos privados no âmago das centrais estaduais ligadas a registradores. Ocorre uma “transubstanciação” que se opera in itinere quando se desencadeia o intercâmbio de informações entre o emissor e o receptor de mensagens cifradas em linguagem de máquina (XML). Esses tramos eletrônicos titularizam, dão forma, a atos ou negócios jurídicos. A máquina se converte numa espécie de “CyberNotary”.

Podem ser colhidos outros exemplos: notificações consubstanciadas pela máquina para constituição em mora de devedores nas alienações fiduciárias, pesquisas patrimoniais universalizadas, criação de repositórios eletrônicos compartilhados entre todos os registradores congregados na rede (CNIB – Central Nacional de Indisponibilidade de Bens), etc. Estas eram tarefas próprias de registradores, potencializadas agora por uma tecnologia transformadora que faz nascer novos e instigantes desafios.

Marshall_McLuhan

Vejamos o mesmo fenômeno a partir de outra perspectiva. No interior das serventias hoje viceja uma nova categoria de profissionais que há bem pouco não se cogitava fosse necessária: programadores de computadores, analistas de sistemas, especialistas em segurança de dados, gestores de processos e projetos, técnicos em informática, redes, hardware, etc. Como quadrá-los na antiga categoria de prepostos e suas espécies auxiliares e escreventes (art. 20 da Lei 8.935/1994)? Os prepostos já não executam tarefas próprias de registração e averbamento, nem atuam como auxiliares nesses tradicionais misteres.

Não há almoço grátis

Todos os novos serviços, acima aludidos, são oferecidos ao mercado por tais entidades para-registrais e remunerados diretamente pelos próprios interessados. Essas taxas não são emolumentos, nem com eles se confundem, à míngua de expressa previsão legal. Nem mesmo se pode admitir que possam ser consideradas “taxas extras” de serviços eventuais – como produção de cópias reprográficas, diligências, etc. Notem: não se trata de uma atividade eventual e episodicamente necessária para concretizar um ato próprio de registro – como solicitar certidões de outras especialidades, por exemplo. Na verdade, estamos diante de um órgão que sintetiza algo que é o próprio labor do registrador.

Como nascem essas entidades para-registrais? Como se criam novos serviços? A configuração proporcionada pelo ecossistema de prestação de serviços registrais por meios eletrônicos nos coloca diante de um importante desafio: como financiar a transformação tecnológica das unidades titularizadas pelos oficiais de Registro de Imóveis de todo o país? Como colocar em prática o que se acha previsto na Recomendação 14 do CNJ?

Esse é ponto: financiamento de um sistema eletrônico que é expressão homóloga dos cartórios tradicionais.

Vimos que o ministro Alexandre de Moraes sinalizou, em recente despacho, que a “validade de atos administrativos concretos formalizados por autoridades e entidades de classe em todo o país deverá ser apurada pelas instâncias ordinárias de controle, inclusive no tocante à responsabilidade pessoal, cível e penal, dos agentes públicos envolvidos na prática desses atos”. Em seguida, determinou que se oficiasse às Corregedorias Gerais dos Estados para que prestassem informações sobre esses serviços e sobre a cobrança de taxas:

Conforme salientado em decisões anteriores, a validade de convênios e parcerias formalizados por autoridades e entidades de classe deverá ser apurada pelas instâncias ordinárias de controle, no caso, as Corregedorias dos Tribunais de Justiça. O tão só fato de tais instrumentos não mencionarem as normas impugnadas na presente Ação Direta não permite a conclusão de estarem em conformidade com a decisão cautelar proferida nestes autos.

Em vista disso, e visando a colher mais informações para a compreensão do  tema, determino a intimação das Corregedorias dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal para que, no prazo de 10 (dez) dias, apresentem informações detalhadas sobre a celebração de convênios entre Cartórios e órgãos públicos, especificando-se o conteúdo dos mesmos com a indicação das atividades prestadas e eventual contrapartida financeira, além de indicarem as providências adotadas para a fiscalização e controle dessas parcerias”. (Despacho de 24/10/2018, acesso aqui).

Registro, aqui, minha compreensão de que talvez não seja possível retroceder e invalidar todos os convênios que foram firmados pelas centrais com entidades públicas e privadas para prestação de serviços por meios eletrônicos. O que ressalto, sempre, é a necessidade de que essas iniciativas devam ser bem orientadas, buscando realizar o futuro da atividade registral com os pés fincados na tradição.

Venha pensar o futuro do Registro de Imóveis no Brasil

iriblogo       ABDRI - logo

O IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil e a ABDRI – Academia Brasileira de Direito Registral Imobiliário, por seus presidentes, João Pedro Lamana Paiva e Sérgio Jacomino, têm o gosto de convidar todos os interessados em temas relativos ao desenvolvimento técnico e institucional do Registro de Imóveis no Brasil para compor grupo de trabalho a ser constituído no bojo de convênio acertado entre as duas entidades.

Escopo do trabalho

O grupo visa a empreender estudos, debates, encontros, workshops em que o tema do aperfeiçoamento tecnológico do Registro de Imóveis e o seu desenvolvimento institucional serão o foco dos trabalhos.

Quem pode participar?

Todos os registradores brasileiros e demais interessados poderão participar dos estudos e discussões. As atas e documentos serão divulgados aqui: http://www.folivm.com.br.

Membros

O grupo de trabalho já se acha constituído no âmbito do NEAR – Núcleo de Estudos Avançados sobre Registro de Imóveis Eletrônico. A ideia é atrair registradores de todo o Brasil para discutir não somente os temas relacionados com o Registro de Imóveis Eletrônico, mas o desenvolvimento do próprio sistema registral brasileiro.

Na primeira etapa, foram selecionados 12 membros paulistas. Abre-se, agora, a possibilidade de participação de interessados de todo o Brasil.

Os interessados deverão se inscrever no formulário abaixo, manifestando seu interesse e a disposição para contribuir com os estudos relativos ao tema.

Os inscritos serão escolhidos pode deliberação conjunta do IRIB e ABDRI. Continuar lendo

NEAR – Núcleo de Estudos Avançados sobre Registro de Imóveis Eletrônico

ACADEMIA BRASILEIRA DE DIREITO REGISTRAL IMOBILIÁRIO

PORTARIA 1/2016 

SÉRGIO JACOMINO, Presidente da Academia Brasileira de Direito Registral Imobiliário – ABDRI, no uso e gozo de suas prerrogativas estatutárias,

CONSIDERANDO o advento do Decreto Federal 8.764 e do Decreto Federal 8.777, ambos de 10 de maio de 2016;

CONSIDERANDO a circunstância de que o Provimento CNJ 47/2015, que regulamentou o Sistema de Registro de Imóveis Eletrônico – SREI, baixando diretrizes gerais para o seu funcionamento, deixou a cargo das Corregedorias Estaduais o estabelecimento de regras técnicas para a operação das Centrais de Serviços Eletrônicos Compartilhados;

CONSIDERANDO que a Eg. Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo abriu o Processo CG 2013/144.745 para acompanhamento do desenvolvimento do SREI – Sistema de Registro de Imóveis Eletrônico, do qual participam membros desta Academia;

CONSIDERANDO, que o atual Código de Processo Civil, eu seu art. 196, estabelece que compete ao Conselho Nacional de Justiça e, supletivamente, aos tribunais, “regulamentar a prática e a comunicação oficial de atos processuais por meio eletrônico e velar pela compatibilidade dos sistemas, disciplinando a incorporação progressiva de novos avanços tecnológicos e editando, para esse fim, os atos que forem necessários, respeitadas as normas fundamentais deste Código”, o que impõe o estudo e o oferecimento de sugestões para regulamentação da matéria no âmbito registrário;

CONSIDERANDO, especificamente, o disposto no art. 837 do atual Código de Processo Civil que prevê a penhora online, “obedecidas as normas de segurança instituídas sob critérios uniformes pelo Conselho Nacional de Justiça”;

RESOLVE:

Art. 1º Criar o Núcleo de Estudos Avançados sobre Registro de Imóveis Eletrônico NEAR com a finalidade de desenvolver discussões, debates, estudos, oferecendo sugestões para o desenvolvimento do SREI – Sistema de Registro de Imóveis Eletrônico, especialmente com vistas a colaborar com o Conselho Nacional de Justiça e com as Corregedoria Estaduais para o contínuo desenvolvimento do processo de modernização do sistema registral pátrio.

Art. 2º Para compor o núcleo, são indicados:

I – Marcelo Martins Berthe, Desembargador Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo;

II – Dr. Antônio Carlos Alves Braga Jr., Magistrado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo;

III – Dr. Josué Modesto Passos, Magistrado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo;

IV – Dr. Daniel Lago Rodrigues, Oficial de Registro de Imóveis em São Paulo;

V – Dr. Ivan Jacopetti do Lago, Oficial de Registro de Imóveis em São Paulo;

VI – Flauzilino Araújo dos Santos, Oficial de Registro de Imóveis em São Paulo;

VII – Leonardo Brandelli, Oficial de Registro de Imóveis em São Paulo;

VIII – Ulysses da Silva, Oficial de Registro de Imóveis em São Paulo aposentado;

IX – Mst. Adriana Unger, engenheira mecatrônica;

X – Manuel Dantas Matos, membro do Comitê Gestor da ICP-Brasil.

XI – Daniela Rosário Rodrigues, Registrador em São Paulo

XII – Nataly Angélica da Cruz Teixeira, Especialista em preservação documental;

Parágrafo único A secretaria geral do NEAR ficará a cargo do Presidente da ABDRI, Sérgio Jacomino.

Art. 2º Os trabalhos desenvolvidos no âmbito do NEAR serão publicados em redes sociais, especialmente na página web da ABDRI.

São Paulo, 23 de maio de 2016.

SÉRGIO JACOMINO

Presidente