
O CNJ baixou na semana passada a Resolução 127, de 15 de março de 2011, que dispõe sobre o pagamento de honorários de perito, tradutor e intérprete, nos conhecidos e já delicados casos de deferimento de benefício da justiça gratuita de maneira cada vez mais ampla.
Publicado no Diário da Justiça 49/2011, em 18.3.2011 (p. 2-3), o ato normativo do CNJ pode ser consultado aqui: Resolução CNJ 127, de 15 de março de 2011.
Esta medida é muito oportuna e visa a corrigir uma enorme distorção que vem comprometendo a regular prestação jurisdicional e agravando, de maneira aguda, os problemas relacionados com a gestão privada dos serviços notariais e registrais, que acabam sofrendo as consequências de uma leitura radicalmente equivocada (e paternalista) da vetusta Lei 1060, de 5 de fevereiro de 1950.
Há alguns dias atrás, a Ministra Cármen Lúcia sentenciou:
Mesmo na atividade privada, e não apenas no setor público, trabalho sem pagamento é escravidão e pagamento sem trabalho é doação. (Valor econômico de 17.2.2011)
Ninguém em sã consciência poderá discordar da ilustre Ministra. Os registradores imobiliários brasileiros vêm experimentando, ao longo do tempo, a carga de suportar políticas públicas sem o correspondente estipêndio do trabalho realizado. Aos olhos desimpedidos da lâmina ideológica, isso é simplesmente uma forma de trabalho escravo.
Gratuidades – miopia política
Aqui mesmo, neste espaço, venho ao longo dos anos sustentando que a imposição de gratuidades mais do uma forma de trabalho escravo é uma maneira estúpida de intentar solucionar o grave problema da habitação no país. E isto por uma razão muito simples: os registradores brasileiros são considerados peça fundamental em todo e qualquer programa sério de regularização fundiária e impor-lhes a gratuidade, sem correlatas medidas compensatórias, não é exatamente uma boa ideia.
A MP 459, que originou a Lei 11.977/2009, é paradigmática nesse sentido. Foi imposta goela abaixo de todos os profissionais do Registro que atuam na área, poupando, sintomaticamente, os interesses das grandes corporações do mercado e das instituições do crédito imobiliário. A equação dessa gratuidade gravosa e interessada pode ser vista aqui .
RESISTÊNCIA PASSIVA
Os resultados vistos até aqui, salvo as iniciativas honrosas que são oriundas da própria categoria, constituem-se numa espécie de crônica de estresse anunciado. Obrigados a realizar a regularização fundiária (ou o registro dos contratos do MCMV) graciosamente por meio de uma benesse imposta manu militare (a pena de multa de 100 mil reais é uma exorbitância), em cada coração e mente medra uma resistência surda, passiva, que se expressa com toda a sua energia no repúdio silencioso a essa medida injusta, inconstitucional, além de estúpida e contraproducente.
Era necessário construir uma equação econômica e financeira para viabilizar o projeto em escala nacional e remunerar com justiça e congruência todos os profissionais envolvidos. Caminhávamos no sentido de se buscar soluções em escala, tirando o máximo proveito de recursos tecnológicos cujo principal efeito era e é a derrubada de custos. Mas lamentavelmente as pontes ruiram e os entendimentos, já avançados, voltaram à estaca zero.
Serviços auxiliares da Justiça
O mesmo cenário hoje se divisa no caso dos serviços auxiliares da Justiça – peritos, tradutores, intérpretes – profissionais que a medida do CNJ visou contemplar.
A Resolução visa irradiar para os tribunais de todo o país o que já vinha sendo aplicado no âmbito da Justiça do Trabalho e Justiça Federal (Resoluções 35/07 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho e 558/07 do Conselho da Justiça Federal).
Já tive ocasião de reportar os problemas de gratuidades exógenas colhendo atores que não integram os estritos limites do processo (Gratuidades – chegaremos aos limites da razoabilidade?). Neste texto, reproduzo uma sentença da Vara de Registros Públicos de São Paulo que expõe com nitidez os problemas que a Resolução do CNJ visa a resolver.
Não é possível, simplesmente, impor uma condição tão aviltante para o regular exercício de uma atividade profissional.
Órgãos da fé pública
Os serviços notariais e registrais integram de maneira sui generis o Judiciário brasileiro. Qualificados como órgãos prestadores de serviços notariais e de registro que atuem por delegação do poder público na EC 45 (art. 103-B, § 4º, III) os notários e registradores representam uma especialização da função judiciária e deveriam, em igualdade de condições com os serviços auxiliares da Justiça, experimentar as mesmas condições de valorização e dignidade profissional.
Volto ao assunto!
RESOLUÇÃO Nº 127, DE 15 DE MARÇO DE 2011
O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições constitucionais e regimentais,
CONSIDERANDO a necessidade de observância do princípio da eficiência administrativa pelo Poder Judiciário, inserto no artigo 37, caput, da Constituição Federal;
CONSIDERANDO a necessidade, em muitos processos, de produção de prova pericial para demonstração da procedência da pretensão posta em juízo e a regra geral vertida no art. 19 do Código de Processo Civil, de antecipação da despesa do ato pela parte que o requer;
CONSIDERANDO os incisos XXXV, LV e LXXIV do artigo 5º da Constituição Federal, garantidores do amplo acesso à Justiça e da assistência judiciária integral e gratuita às pessoas que comprovarem insuficiência de recursos pelo Estado;
CONSIDERANDO a existência de regulamentação da matéria nas esferas trabalhista e federal, a teor das Resoluções 35/07 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho e 558/07 do Conselho da Justiça Federal;
CONSIDERANDO a necessidade de regulamentar o pagamento de honorários periciais, na esfera cível, no âmbito da Justiça Estadual de primeiro e segundo graus, quando o responsável pelo pagamento destes é contemplado com a assistência judiciária gratuita;
CONSIDERANDO a missão de planejamento estratégico do Poder Judiciário cometida constitucionalmente ao Conselho Nacional de Justiça, nos moldes do art. 103-B, § 4º, I, da Constituição Federal, com o escopo de uniformizar os procedimentos com relação ao tema;
R E S O L V E:
Art. 1º Recomenda-se aos Tribunais que destinem, sob rubrica específica, parte do seu orçamento ao pagamento de honorários de perito, tradutor ou intérprete, quando, nos processos de natureza cível, à parte sucumbente no objeto da perícia for deferido o beneficio da justiça gratuita.
Art. 2º Os Tribunais poderão manter banco de peritos credenciados, para fins de designação, preferencialmente, de profissionais inscritos nos órgãos de classe competentes e que comprovem a especialidade na matéria sobre a qual deverão opinar, a ser atestada por meio de certidão do órgão profissional a que estiverem vinculados.
Art. 3º As Presidências dos Tribunais ficam autorizadas a celebrar convênios com profissionais, empresas ou instituições com notória experiência em avaliação e consultoria nos ramos de atividades capazes de realizar as perícias requeridas pelos juízes.
Art. 4º A designação de perito, tradutor ou intérprete é cometida exclusivamente ao juiz da causa, sendo-lhe vedado nomear cônjuge, companheiro(a) e parente, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, de magistrado ou de servidor do juízo.
Parágrafo único. Poderá o juiz, ainda, substituir o perito, tradutor ou intérprete , desde que o faça de forma fundamentada.
Art. 5º São requisitos essenciais para a percepção dos honorários periciais, de tradutor ou intérprete, nas hipóteses em que a parte responsável pelo pagamento, porque sucumbente no objeto da perícia, é beneficiária da justiça gratuita, a fixação deles por decisão judicial e o trânsito em julgado da decisão.
Art. 6º O valor dos honorários periciais, de tradutor ou intérprete, a serem pagos pelo Poder Judiciário em relação a pleito de beneficiário de gratuidade de Justiça, será limitado a R$ 1.000,00 (um mil reais), independentemente do valor fixado pelo juiz, que considerará a complexidade da matéria, os graus de zelo profissional e especialização do perito, o lugar e o tempo exigidos para a prestação do serviço e as peculiaridades regionais.
§ 1º O montante que eventualmente ultrapassar o valor previsto no caput poderá vir a ser cobrado pelo perito, nos termos do art. 12 da Lei 1.060/50.
§ 2º Ainda que haja processos incidentes, tais honorários deverão ser fixados em valor único, em razão da natureza da ação principal.
§ 3º A fixação dos honorários de que trata este artigo, em valor maior do que o limite estabelecido neste artigo, deverá ser devidamente fundamentada, podendo o juiz ultrapassar em até 5 (cinco) vezes o limite máximo definido neste artigo.
Art. 7º Poderá haver adiantamento de despesas iniciais de perito, em valor equivalente a R$ 350,00 (trezentos e cinquenta reais), se este, comprovadamente, demonstrar a necessidade de valores para a satisfação de despesas decorrentes do encargo recebido, efetuando-se o pagamento do saldo remanescente após o trânsito em julgado da decisão.
Parágrafo único. Havendo reversão da sucumbência, quanto ao objeto da perícia, caberá ao Executado ressarcir o erário dos honorários periciais adiantados, sob pena de execução específica da verba.
Art. 8º Se vencida na causa entidade pública, o perito, tradutor ou intérprete serão pagos conforme ordem de pagamento apresentada ao Tribunal respectivo.
Art. 9º O pagamento dos honorários periciais, de tradutor ou intérprete efetuar-se-á mediante determinação do presidente do Tribunal, após requisição expedida pelo juiz do feito, observando-se, rigorosamente, a ordem cronológica de apresentação das requisições e as deduções das cotas previdenciárias e fiscais, sendo o valor líquido depositado em conta bancária indicada pelo perito.
§ 1º As requisições deverão indicar, obrigatoriamente: o número do processo, o nome das partes e respectivos CPF ou CNPJ; o valor dos honorários, especificando se de adiantamento ou se finais; o número da conta bancária para crédito; natureza e característica da perícia; declaração expressa de reconhecimento, pelo Juiz, do direito à justiça gratuita; certidão do trânsito em julgado e da sucumbência na perícia, se for o caso; endereço, telefone e inscrição no INSS do perito.
§ 2º O valor dos honorários será atualizado pelo IPCA-E ou outro índice que o substitua, a partir da data do arbitramento até o seu efetivo pagamento.
Art. 10 Os valores de que trata esta Resolução serão reajustados anualmente, no mês de janeiro, por meio de Portaria do Presidente do Tribunal, com base na variação do IPCA-E do ano anterior ou outro índice que o substitua, desde que haja disponibilidade orçamentária.
Parágrafo único. O disposto nos arts. 6º e 7º desta Resolução será aplicado aos honorários periciais devidos pelo Instituto Nacional de Seguro Social em ações de acidente de trabalho.
Art. 11 Os Tribunais farão controle informatizado dos dados da ação, da quantidade de processos e de pessoas físicas assistidas, bem como do montante pago aos peritos.
Art. 12 Caberá às Corregedorias dos Tribunais acompanhar o cumprimento desta Resolução no âmbito de suas competências.
Art. 13 A presente resolução entra em vigor 60 (sessenta) dias após a sua publicação.
Ministro Cezar Peluso, Presidente
Colegas Registradores:
UM PROBLEMA DEVERAS INTERESSANTE QUE COLOCO PARA APRECIAÇÃO: PREFEITURA DO INTERIOR DE SÃO PAULO NOTIFICOU HERDEIROS DE UM OFICIAL MAIOR FALECIDO, ENQUADRANDO-OS COMO RESPONSÁVEIS TRIBUTÁRIOS POR SUCESSÃO. OCORRE QUE UM DOS IRMÃOS FOI DESIGNADO OFICIAL MAIOR E ADMINISTRA O CARTÓRIO JUNTAMENTE COM UM ESCREVENTE. PERGUNTO: SENDO O CARTÓRIO UMA ENTIDADE PRIVADA, QUE AUFERE EMOLUMENTOS QUE É O LUCRO DA MESMA, NÃO SERIA O CARTÓRIO O CONTRIBUINTE E OS DOIS GESTORES OS RESPONSÁVEIS SOLIDÁRIOS PELO TRIBUTO? O CARTÓRIO, COMO BEM, NAO FOI ARROLADO NAS PRIMEIRAS DECLARAÇÕES DO INVENTÁRIO DO OFICIAL MAIOR FALECIDO.
AGRADECERIA MUITO UMA ORIENTAÇÃO.
OBRIGADO.
OSWALDO RODRIGUES
OAB/SP 22909