MP 1.085 e o Monstro de Horácio

Introdução

Dobro-me à tarefa de interpretar e conjugar as disposições contidas na Medida Provisória 1.085/2021, baixada no lusco-fusco do ano findo, cotejando-as com a legislação do sistema registral brasileiro, buscando uma interpretação coerente e aproveitando o que de bom a medida provisória possa nos revelar.

Apresento à reflexão dos leitores alguns aspectos que poderiam ter sido objeto de debates e estudos antes que se consumasse a publicação da dita MP. São ideias e reflexões que julgo ainda válidas e que podem ser úteis, a fim de contribuir com o transcurso do processo legislativo ou de posterior regulamentação pela Corregedoria Nacional de Justiça.

Grande parte do texto já havia sido objeto de debates marginais travados no âmbito do IRIB – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil, entidade que tive a honra de presidir à época em que as discussões se iniciaram e tomavam corpo. Foi, então, produzida e apresentada a Nota Técnica 2/2020, de 6 de agosto de 2020, em que se concluía que as disposições legais e normativas já existentes seriam mais do que suficientes para que os cartórios de registro de imóveis pudessem operar o Registro de Imóveis Eletrônico, de forma totalmente digital[1].

No entanto, as discussões transcorreram num circuito estrito que envolveu agentes do governo federal, interlocutores do mercado e setores da própria categoria profissional. Ainda assim, como quem aparece de surpresa na festa sem ser convidado, oferecemos críticas bem fundamentadas ao projeto, quando, ainda no ano de 2020, as ideias germinavam e eram agitadas interna corporis entre alguns poucos registradores[2].

Lamenta-se que não tenha havido uma discussão pública travada diretamente com as lideranças mais qualificadas da corporação registral, nem com a comunidade jurídica. Não se ouviu, tampouco, a Academia, nem se auscultou os registradores que congregam em organismos internacionais como o IBEROREG – Rede Registral Ibero americana e IPRA-Cinder – International Property Registries Association, entidades com as quais o IRIB mantém estreitos laços de cooperação técnica, científica e doutrinária de onde se poderia haurir bons exemplos a inspirar iniciativas de modernização dos registros prediais brasileiros.

Uma proposta de reforma legal, de tamanha magnitude, deveria ter sido posta em audiência pública, quando não enviada como projeto de lei ao Congresso Nacional, o que deveria ter sido feito. Ainda agora tomamos conhecimento de que o PL 4.188/2021, que tramitava em regime de urgência, o rito especial foi suprimido pela Mensagem de Cancelamento de Urgência n. 67/2022, do Executivo Federal. Foi retirada a urgência do texto com o fim de ser “inserido na MP (medida provisória) 1.085 e o tema continua sendo prioritário”, segundo noticiou o Portal R7[3].

Tenho absoluta certeza de que os técnicos do governo, instados por registradores e imbuídos da melhor boa-fé, estabeleceram uma interlocução que se revelou, afinal, ruinosa. Faltou aos interlocutores a experiência provada na diuturnidade do mister registral vivida nas pequenas, médias e grandes serventias do Brasil, além da minguada representação institucional. Perdeu-se uma rara oportunidade de atualizar o marco legal do Registro Imobiliário e reformar, com zelo e prudência, a conhecida Lei 6.015/1973, contribuindo com o impulso de modernização do sistema, fato reclamado pela sociedade, pelo mercado e pela própria administração.

A iniciativa do Ministério da Economia ainda assim é louvável. Ela deveria ter passado pelos canais de representação institucional da categoria, vale dizer, pelo IRIB, entidade que indiscutivelmente representa todos os registradores imobiliários brasileiros e que foi a responsável pelas boas iniciativas que frutificaram ao longo dos últimos 50 anos.

O texto revela algumas boas ideias que, a seu tempo, serão destacadas e valorizadas no labor a que me dedico de anotar e comentar esta MP passo a passo. Não desconsidero os imensos riscos de comentar uma norma inçada de reconhecidas dificuldades, potencializadas pela atecnia na redação de seus dispositivos, mas é o que nos cabe agora.

Enfim, temos a missão de enfrentar a iniciativa e tentar, da melhor maneira possível, contribuir para o sucesso das reformas, escoimando do texto suas imperfeições – desde sempre percebidas e explicitadas –, destacando outras que são virtuosas e sobre as quais voltaremos oportunamente, na série de textos que se seguirão nos comentários aos artigos e dispositivos da referida Medida Provisória 1.085/2021.

O ponto nuclear do sistema é a falta de sistema

Destaco, de início, que até mesmo uma abordagem de caráter abrangente e compreensiva da norma, representa, para o intérprete dedicado, uma tarefa dificultosa. Para que se possa criticar esta medida provisória é necessário, antes de tudo, reconhecer e compreender o sistema sobre o qual ela se assenta e alcançar os objetivos por ela perseguidos[4]. Mas o exegeta, desde logo, se apercebe que não há sistema e tudo parece não passar de um sarampão reformista.

SERP – um acessório em busca do principal

Há um sujeito indeterminado na lei, abundam adjetivos extravagantes à caça de um bom substantivo. Pergunta-se: O que é isto que a norma deixa antever e pressupõe? Responde-se: O Registro Eletrônico de Imóveis; mas, deixe-me revelar um  pequeno detalhe: ele não existe!

Os cartórios brasileiros atuam e funcionam como na década de 70 e continuarão a fazê-lo, malgrado o fato de terem recebido o epíteto moderno de “registro eletrônico de imóveis” e vincularem-se a um ente espectral e inespecífico chamado “Sistema” Eletrônico de Registros Públicos, SERP.

Assim é que o Oficiais de Registro receberão títulos em XML e dele farão uma transmigração midiática da novilíngua digital para uma linguagem natural, legível por humanos, para, só então, consumar os atos registrais em forma narrativa, fixando-os em um pedaço de cartolina. Afinal, os livros tradicionais (art. 173 da LRP) não foram suprimidos, nem encerrados, e os chamados Repositórios Confiáveis de Documentos Eletrônicos (RCDE) sequer foram especificados, embora previstos no Provimento CNJ 89/2019 (inc. II, § 3º, do art. 8º).

Milhares de registradores se perguntam: Como a MP pode entrar em vigor imediatamente (inc. II do art. 21 da MP), derrubando prazos e acolhendo títulos em meios eletrônicos, sem que as plataformas digitais do SERP sequer existam? Emitirão certidões da situação jurídica dos imóveis (§ 9º do art. 19 da LRP) pressupondo-se a existência de um registro estruturado eletronicamente que de fato não existe? Adotaremos o modelo big bang registral, aposentando de imediato os livros tradicionais após regulamentação do registros eletrônico e do SERP?[5]

As plataformas de interoperabilidade intrassistêmica e o SAEC (Sistema de Atendimento Eletrônico Compartilhado) já estão em operação, regulamentados pela Corregedoria Nacional de Justiça. Seria necessário derribar o edifício construído ao longo de mais de uma década para colocar em seu lugar um ente inconsistente e mal-ajambrado?

A lei distingue títulos “eletrônicos” (na prática, mera cópia especular em PDF, a ser transmitido via SERP), dos demais, apresentados em forma eletrônica (ou não) diretamente nas serventias. Dispõe a norma que os primeiros serão registrados em prazo menor (inc. II, § 1º do art. 188 da LRP), criando uma regra não isonômica, discricionária, além do fato de que a distinção, hoje, é simplesmente inócua e sem sentido, já que o registro não é eletrônico, exigindo a custosa e burocrática operação de transubstanciação dos meios.

O Registro Eletrônico de Imóveis não existe, os livros tradicionais não foram encerrados, nem os repositórios eletrônicos foram criados. Não há nada que justifique esta medida provisória inteiramente carente de relevância. Patenteia-se que toda a parafernália interoperacional se acha dependente apenas de um bom regulamento (inc. II do art. 7º c.c. art. 19 da MP), como se acha na Nota Técnica 2/2020 do IRIB.

Parece que adentramos os átrios de um admirável mundo velho com um pé fincado no século XX e o outro no século XIX.

Eis que o acessório se torna o principal

Certa feita, utilizei uma expressão bastante dura para qualificar o fenômeno de surgimento de centrais eletrônicas nos Estados, entes dotados, à margem da lei, de atribuições próprias de registradores: chamei o fenômeno de neoplasia registral. Esse movimento caracterizava uma deformação que promovia o crescimento, sem controle, de ramais acessórios (centrais) em detrimento do núcleo principal (cartórios), cobrando taxas ilegais dos usuários para prestar um serviço “mais eficiente”, “mais rápido”, “célere” esquecendo-se das regras estampadas no art. 4º, no inc. II do art. 30 e art. 38 da Lei 8.935/1995 e da ação de uma corregedoria permanente atuante que deveria zelar pela eficiência do serviço em todo o país. O último dispositivo citado é lapidar: o “juízo competente zelará para que os serviços notariais e de registro sejam prestados com rapidez, qualidade satisfatória e de modo eficiente, podendo sugerir à autoridade competente a elaboração de planos de adequada e melhor prestação desses serviços”.

O intérprete deve se perguntar: o que é principal no contexto dessa MP? O que é acessório?

O núcleo parece ser o SERP – embalado pelo mitologema do sistema eletrônico como sinônimo de eficiência e modernidade. Já o acessório serão os milhares de cartórios espraiados por todo o território nacional.

Há uma recidiva centralista e os cartórios passarão a funcionar tracionados por um sistema extravagante. O órgão, que sempre deveria ser o elemento meramente acessório e instrumental, torna-se mais importante do que o próprio organismo, comprometendo-o progressivamente. Ao final e ao cabo, todos nós sabemos o que ocorre: aniquila-o![6]

SERP – e a função pública delegada

É da nossa história institucional, há mais de uma centúria, a consagração  da delegação das atividades notariais e registrais a pessoas naturais singulares, provadas pelo concurso público[7]. A CF recolheu a larga tradição do direito brasileiro de outorga da delegação de notas e de registro a particulares em colaboração com a administração, na condição de delegados de função ou de ofício público, como pontifica BANDEIRA DE MELLO[8].

A MP indica entre os objetivos do SERP uma série de atividades que, a rigor, são próprias de registradores. Sob esse prisma, calha tecer algumas observações.

Seria possível dotar um ente coletivo personalizado (SERP) do poder de dação de fé pública, autenticação e certificação de atos e fatos jurídicos?

Nos diz RICARDO DIP que a função de registro de imóveis não é uma atividade própria de pessoas coletivas. A delegação se dá a pessoas físicas que podem, para o bom e eficiente desempenho de suas funções, administrar e gerenciar a atividade, inclusive podendo compartilhar recursos para a boa prestação de serviços[9]. Ao registrador, dirá DIP – “e não propriamente ao cartório de registro[10] (nem, por certo, ao ‘serviço’, mero aspecto funcional de um órgão) – é que a lei atribui ‘a prática dos atos relacionados na legislação pertinente aos registros públicos’” (art. 12 da Lei 8.935/1994). E conclui de modo preciso:

“Autenticidade e fé pública – requisitos correlacionáveis e substanciais para a consecução da meta registrária de outorga de segurança e, com ela, de certeza – não poderiam, ao menos de congruo, para não dizer essencialmente, outorgar-se a uma pessoa coletiva.

Coisa diversa é que se confiram simultânea ou sucessivamente a várias pessoas físicas, mas não como atributo radicável no próprio suposto coletivo. Não é admissível hipostasiar nas pessoas coletivas atributos que, por sua mesma natureza, só se encontram nas pessoas físicas: falar em inteligência, vontade, prudência e justiça de pessoas coletivas é apenas transferir-lhes metaforicamente faculdades e hábitos que se encontram, realmente, nas pessoas físicas delas participantes”[11].

Parece extreme de dúvidas que a delegação deva ser outorgada pelo Estado a uma pessoa física. Segundo ALIENDE RIBEIRO, ao passo que o Poder Público conserva a titularidade do serviço, ele “transfere sua execução a particulares (pessoas físicas com qualificação específica e que foram aprovadas em concurso público de provas e títulos) em unidades (ou feixes de competências) definidas pela Administração”. A outorga da delegação à pessoa natural – diz ele – “guarda correspondência com a atividade jurídica relativa a tais profissões oficiais (ou profissões públicas independentes)[12]. Na feliz expressão do desembargador paulista, “a delegação não se delega”[13].

O Estado pode transferir aos particulares o desempenho de uma atividade pública. Ocorre por via da concessão ou permissão de serviço público, quando se tratar de atividade material, isto é, prestação de comodidade de obra ou coisa. Já no caso de delegação de ofício público, tem-se por objeto uma atividade jurídica e profissional que é, justamente, o caso dos oficiais de Registro de Imóveis[14].

Essa distinção é clássica em nosso Direito. O STF não destoaria dessa longeva orientação doutrinária. Na ADI 2.415-SP, por exemplo, o Min. AYRES BRITO fixou um importante balizamento para que se compreenda e enquadre a atividade registral e notarial brasileira na matriz constitucional. Vale a leitura do aresto e se verá que a subdelegação de atribuições e funções, próprias de delegatários, a pessoa jurídica de direito coletivo privado (no nosso caso, o SERP), desnatura a própria atividade. A delegação somente pode recair sobre pessoa natural. Eis o extrato do julgado:

I – Trata-se de atividades jurídicas que são próprias do Estado, porém exercidas por particulares mediante delegação. Exercidas ou traspassadas, mas não por conduto da concessão ou da permissão, normadas pelo caput do art. 175 da Constituição como instrumentos contratuais de privatização do exercício dessa atividade material (não jurídica) em que se constituem os serviços públicos.

II – A delegação que lhes timbra a funcionalidade não se traduz, por nenhuma forma, em cláusulas contratuais.

III – A sua delegação somente pode recair sobre pessoa natural, e não sobre uma empresa ou pessoa mercantil, visto que de empresa ou pessoa mercantil é que versa a Magna Carta Federal em tema de concessão ou permissão de serviço público.

IV – Para se tornar delegatária do Poder Público, tal pessoa natural há de ganhar habilitação em concurso público de provas e títulos, e não por adjudicação em processo licitatório, regrado, este, pela Constituição como antecedente necessário do contrato de concessão ou de permissão para o desempenho de serviço público.

V – Cuida-se ainda de atividades estatais cujo exercício privado jaz sob a exclusiva fiscalização do Poder Judiciário, e não sob órgão ou entidade do Poder Executivo, sabido que por órgão ou entidade do Poder Executivo é que se dá a imediata fiscalização das empresas concessionárias ou permissionárias de serviços públicos. Por órgãos do Poder Judiciário é que se marca a presença do Estado para conferir certeza e liquidez jurídica às relações interpartes, com esta conhecida diferença: o modo usual de atuação do Poder Judiciário se dá sob o signo da contenciosidade, enquanto o invariável modo de atuação das serventias extraforenses não adentra essa delicada esfera da litigiosidade entre sujeitos de direito.

VI – Enfim, as atividades notariais e de registro não se inscrevem no âmbito das remuneráveis por tarifa ou preço público, mas no círculo das que se pautam por uma tabela de emolumentos, jungidos estes a normas gerais que se editam por lei necessariamente federal[15].

Do mesmo jaez, o RE 842.846, oriundo de Santa Catarina, da relatoria do Min. LUIZ FUX. Destaco, pela clareza do texto, o seguinte:

“Os serviços notariais e de registro, mercê de exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público (art. 236, CF/88), não se submetem à disciplina que rege as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos. É que esta alternativa interpretativa, além de inobservar a sistemática da aplicabilidade das normas constitucionais, contraria a literalidade do texto da Carta da República, conforme a dicção do art. 37, § 6º, que se refere a “pessoas jurídicas” prestadoras de serviços públicos, ao passo que notários e tabeliães respondem civilmente enquanto pessoas naturais delegatárias de serviço público, consoante disposto no art. 22 da Lei nº 8.935/94”[16].

Enfim, as atividades próprias dos registradores, suas funções delegadas, não podem ser reconduzidas e trespassadas, por via de subdelegação, a entes privados coletivos e personalizados (§ 4º do art. 3º da MP 1.085/2021), sob pena de subversão do próprio sistema e mesmo de eventual inconstitucionalidade.

O ONR-SREI previu um modelo que se compagina com o modelo constitucional e que pode ser resumido da seguinte maneira: universalização de acesso com a repartição e distribuição de competências jurídico-registrais a pessoas naturais aprovadas em concursos públicos.

Afinal, o que é o SERP?

O nome já o revela: é um “sistema”. Sistema de informação. O Registro de Imóveis Eletrônico converteu-se num sistema centralizado de gestão e trânsito de dados registrais, com objetivos claramente definidos no art. 3º da MP 1.085/2021 que é, em essência, prover o trânsito de dados e produzir informação automatizada.

Causa perplexidade que se possa atribuir a um “sistema” faculdades, poderes e atribuições que são próprias, singulares, especializadas e trespassadas, pela via constitucional da delegação, a registradores singulares. O mister jurídico da atividade própria do oficial não se compagina com as atividades desempenhadas por um “sistema” eletrônico de informações centralizadas.

Entretanto, é preciso não confundir alguns aspectos envolvidos no contexto desta discussão.

Em primeiro lugar, os instrumentos e ferramentas tecnológicos, que são postos a serviço de juristas práticos em apoio às suas atividades de registração, não podem chegar a substituir esses profissionais do direito e transcender o seu mister registral. Depois, precisamos distinguir o que vem a ser o SERP em cotejo  com o SREI – Sistema de Registro [Eletrônico] de Imóveis, fruto conceitual concebido ao longo de muitos anos em projetos coordenados pelo CNJ e pela Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo (Provimento CNJ 89/2019 e Provimento 42/2012, respectivamente).

O SREI foi concebido, originalmente, como plataforma eletrônica de compartilhamento de recursos tecnológicos entre os registradores de todo o país. Chamei a plataforma nos seus primórdios de “Círculo Registral”[17]. Nunca se cogitou da criação de uma central aglutinadora de dados e prestadora de serviços registrais próprios e indelegáveis[18].

As experiências de São Paulo revelavam exatamente isso: as novas tecnologias foram adotadas como extensão natural do registrador, dando-lhe meios para compartilhar recursos, universalizar acesso aos usuários dos serviços e para os favorecer com técnicas de economia de escala no uso racional de recursos materiais e humanos[19]. Elas não foram pensadas para se converter em um transcendente sistema de informações.

Já o SERP representa um deslocamento de atribuições próprias do Oficial do Registro de Imóveis, na medida em que realoca esses profissionais na posição de sujeitos siderados num conjunto complexo, que tende a coordená-los, sob sua lógica, para a colimação de seus próprios fins. O sistema ostenta certas e singulares propriedades que tendem, ao longo do tempo, a assumir progressivamente as funções desses profissionais do direito: afinal, esse parece ser o seu diagrama genético: deus ex machina.

Em tempos de ereção de cripto-soluções descentralizadas, vendidas como remédio para todos os vícios tipicamente humanos – como os NFT´s baseados em blockchain, em que se garante que o algoritmo “would reliably determine the results and return the outputs[20], pensar em centrais, como o SERP, soa-nos um irremediável soluço reacionário.

Entretanto, é ainda pior. Quando se pensa que os “protocolos divinos” do sistema criptográfico podem oferecer soluções paliativas ao sistema estatal de prevenção, adjudicação, defesa e garantia de direitos, até mesmo NICK SZABO seria capaz de nos convencer do acerto de soluções apresentadas ainda em 1998:

Straightforward transcription of written records into a centralized online repository would make many of these problems even worse – electronic records can be highly vulnerable to loss and forgery, and insiders are the most common source of such attacks. This paper proposes a secure, distributed title database to prevent such attacks against property rights in the future”.

Ele concluiria, afinal, que a descentralização é a solução: “this technology will give us public records which can survive a nuclear war[21].

Aproveito esse delicioso mote para registrar que os nossos registros imobiliários descentralizados, ainda quando contem com as novas ferramentas tecnológicas compartilhadas, podem resistir a hecatombes representadas inclusive pelas tentativas de subversão de sua própria natureza, reduzidos que podem ser a meras instâncias de combinação e processamento de dados.

Dados não são informação, que não é a proclamação oficial de situações jurídicas válidas e eficazes. Abandonamos a ideia de “sistema registral” (analógico e digital), que têm componentes interrelacionados, um propósito, estrutura, identidade, e avançamos rumo a um sistema de informação – “conjunto de componentes inter-relacionados que coletam (ou recuperam), processam, armazenam e distribuem informações destinadas a apoiar a tomada de decisões, a coordenação e o controle em uma organização”[22].

Espere: um disclaimer!

Deixe-me lhe dizer, caro leitor, e com inteira franqueza: não afirmo que os sistemas de informação não possam teoricamente transcender o elemento humano no mister registral. São especulações que se acham em curso[23].

Não sou ingênuo, nem muito menos um ludita resistente a todo e qualquer avanço das novas tecnologias. Esta mutação paradigmática há de ser bem pensada e debatida por nossa comunidade de juristas, antes que avancemos nesta twilight zone das novas tecnologias aplicadas a atividades eminentemente jurídicas. Elas são dependentes de um juízo prudencial que redunda em potentes efeitos de mutação jurídica da propriedade privada. Afinal, está em causa um interesse da sociedade na proteção de seus direitos fundamentais.

Estaremos preparados para substituir o modelo de proclamação jurídica da propriedade por sistemas de definição do status dominial dos brasileiros por reconhecimento e combinações de padrões de dados? Estaremos prontos para assumir um padrão criptorregistral?

A substituição do registrador singular por um poderoso sistema de informações centralizado está a reclamar a colaboração e o aporte de conhecimento de cientistas especializados, nesta área do conhecimento humano, para nos esclarecer o que representam tais sistemas nas sociedades interligadas digitalmente e quais os papeis reservados aos registradores neste cenário disruptivo.

O “sistema registral” brasileiro nasceu em 1846 – com seus livros principais e indicadores auxiliares, seus carimbos, selos, arquivos, escreventes, auxiliares, cartórios etc. – e chega à sua maturidade na assimilação prudente de novas tecnologias compartilhadas. Corremos o risco de sermos ultrapassados por sistemas de informações que em tudo são simulacros digitais dessemelhantes a qualquer sistema de decisão jurisprudencial.

É uma decisão de alto risco que pode nos levar a muitas oportunidades. O problema é que ninguém está pensando nem nos riscos, nem nas oportunidades a partir de uma perspectiva acadêmica, corporativa e institucional.

O “solucionismo tecnológico”

Não parece crível que o governo tenha simplesmente desconsiderado o esforço gigantesco representado pela concepção, modelagem e especificação do SREI – Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis, em vias de implementação progressiva pela Corregedoria Nacional de Justiça do CNJ.

Trabalho afanoso e que consumiu mais de uma década de pesquisas em laboratórios de inovação, com o empenho de recursos públicos devotados à modelagem e especificação do sistema de registro de imóveis eletrônico – SREI. O projeto foi capitaneado pelo CNJ e atraiu um renomado grupo de cientistas e juristas vinculados à Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (LSITEC)[24].

Além da especificação, os registradores, congregados no Núcleo de Estudos Avançados de Registro de Imóveis eletrônico (NEAR), realizaram a prova de conceito do SREI, demonstrando a aplicabilidade concreta do modelo concebido pelo CNJ[25]. Daí à regulamentação pela Corregedoria Nacional de Justiça foi um passo (Provimento CNJ 89/2019). Seguiram-se dezenas de decisões e de atos normativos para brindar a sociedade brasileira com um bom sistema de registro de imóveis eletrônico. Tudo isso foi debalde? Por que se ignorou todo esse legado? Por que o governo não buscou ao menos conhecer essas iniciativas que suportam dezenas de atos normativos em vigor baixados pelos tribunais estaduais e pelo CNJ? Por que não se buscou a interlocução com quem estava intimamente ligado ao tema da modernização tecnológica do sistema registral brasileiro em bases estritamente institucionais?

Todo esse esforço acha-se em vias de ser praticamente descartado – justamente quando ganha velocidade na sua implementação.

As reformas podem revelar a faceta de um admirável mundo distópico das novas tecnologias, que é propriamente um tema ideológico. Há, ínsita na iniciativa, uma boa dose de idealismo panglossiano, que se afigura como algo parecido ao Paradoxo de Jevons. A introdução de novas tecnologias no Registros Públicos, presumidamente mais eficientes, sem a correspondente adequação dos meios, pode magnificar a burocracia, consumir mais recursos humanos e materiais que os modelos tradicionais, tornando o sistema disfuncional.

Parafraseando a cientista ADRIANA UNGER, uma tecnologia inadequada aplicada aos Registros Públicos, quando não prejudica os cartórios, também não os auxilia e favorece[26]. Ao final e ao cabo, a solução concebida será mais uma etapa redundante na esteira processual, sem representar, verdadeiramente, um aperfeiçoamento sistemático do Registro de Imóveis brasileiro.

Seria despiciendo afirmar que não somos contra o uso da tecnologia. Entretanto, a ideologia do “solucionismo tecnológico”, antevista e denunciada por EVGENY MOROZOV, leva muitos a crer que todos os problemas humanos poderão ser resolvidos com o uso de tecnologia e muita normação[27]. Smart contracts, registro centralizado de garantias, IGG, NFT´s, blockchain, SERP, mudanças climáticas, escrófulas, combate à pobreza e guerra à corrupção… tudo isso poderá ser resolvido com base em soluções tecnológicas higiênicas, expungindo-se, pela via legiferante, as nódoas que inquinam o sistema de publicidade com filigranas jurídicas custosas e burocráticas. É um discurso envolvente, convenhamos.

Conselheiro Acácio rides again

Dizer que os “registros serão escriturados, publicizados e conservados em meio eletrônico”, nesta altura das discussões, revela apenas uma desconcertante tautologia, uma reiteração enfadonha e ociosa de disposições legais antecedentes. Afinal, isso já estava dito com todas as letras nos arts. 37 e seguintes da Lei 11.977/2009, com reprise na Lei 13.465/2017.

 O prazo definido no art. 39 da Lei 11.977/2009 (aliás, não revogado) esgotou-se em 2014… E agora um novo prazo se impõe, pendente ainda de regulamentação da Corregedoria Nacional de Justiça (art. 7º da MP).

E voltamos ao início: o tema é, sempre foi, de caráter estritamente regulamentar. Não era necessária, nunca foi, a edição de uma medida provisória.

SERP e o Monstro de Horácio

A CF/1988 inaugurou uma nova ordem notarial e registral. A Lei 8.935/1994 estabeleceu um marco organizativo da atividade. A chamada Lei Orgânica dos Notários e Registradores remarca, em várias passagens, a especificidade de cada “natureza”, apontando para o processo de progressiva desacumulação e singularização de tais atividades em atenção à natureza de cada qual. A orientação se patenteia no disposto no art. 26 da dita lei que reza não serem “acumuláveis” os serviços enumerados no art. 5º (notários e registradores em suas especialidades). O art. 49 remata: “quando da primeira vacância da titularidade de serviço notarial ou de registro, será procedida a desacumulação, nos termos do art. 26”.

O princípio é este: desacumulação e singularização afetada pela natureza de cada especialidade.

O SERP remonta a estereótipos que conformavam os chamados “serviços auxiliares da justiça”, como previstos na ordem constitucional anterior[28]. A reconfiguração da atividade pelo SERP não é somente disforme, mas francamente regressiva. Evoca-se as ideias de McLUHAN. Segundo o teórico canadense, os novos meios eletrônicos representam um novo ecossistema. Contudo, o que se vê, nesta modelagem legal, é que o “novo ambiente” registral eletrônico se reconforma às avessas no velho ambiente mecanizado e narrativo. O “conteúdo” do registro eletrônico se reconverte com apoio na velha gramática do registro, transformando a instantaneidade, a simultaneidade e desprezando a “escala, cadência e padrão”, reinstala a sucessão de atos lançados de forma narrativa na matrícula (inc. I do art. 231 da LRP, não modificado pela MP).

Lembra-me o Monstro de Horácio – metáfora utilizada pelo deputado ARAÚJO LIMA nos debates legislativos que redundaram na Lei 1.237, de 24 de setembro de 1864. Ele cravou de modo lapidar esta deliciosa expressão. O resultado legislativo não pode revelar uma máquina desmantelada, “um monstro de Horácio”[29]. A gralha enfeitou-se com as penas do pavão.

SERP, ONR, SREI e as centrais das especialidades

Como se vai coordenar a sopa de letrinhas criada pela MP? O ONR e toda sua base legal e normativa não foram revogados, mas coexistem numa espécie de relação precária e instável. E conflituosa. São diversas especialidades, múltiplos interesses, finalidades próprias e singulares.

Tampouco se tangeu o FIC-SREI previsto nos §§ 9º e 10º da Lei 13.465/2017, além de se ter fragmentado a coerência sistemática do SREI (§2º do art. 5º) – ainda que se possa argumentar, com boa dose de racionalidade, que o ONR não é o SERP que ainda é nonada. Espera-se que a regulamentação haja bem em curar essa entropia normativa.

Por outro lado, as especialidades já têm suas bases informatizadas, já prestam serviços por meios eletrônicos. Melhor (e mais racional) seria criar uma infraestrutura de interoperabilidade entre as centrais já existentes, coisa que um simples portal na internet, implantado pelas próprias especialidades, regulamentado e fiscalizado pelo Poder Público competente (Judiciário), já resolveria adequadamente.

Além disso, o usuário do sistema registral imobiliário não necessita, na esmagadora maioria dos casos, transitar pelos escaninhos eletrônicos das especialidades numa barafunda tecnológica que liga o nada ao lugar nenhum. As transações, dignas de regulação, são as intrassistêmicas, operações realizadas entre as várias especialidades de registros públicos, com o fim de prestar um serviço mais eficiente e menos oneroso aos interessados.

Insisto, a criação do SERP é matéria eminentemente regulamentar. A interoperabilidade não demanda mais do que inteligência, planejamento e adequada regulação. A MP vai em outra direção e instaura uma cizânia entre as especialidades.

Não calha, aqui, discutir as questões que espocam nos debates acirrados que se travam neste exato momento e que versam, basicamente, sobre as dificuldades imensas para aplicação prática das inovações postas em vigor. Certamente, a MP não agradou a gregos, quiçá terá atendido a interesses de alguns troianos, criando, na melhor das hipóteses, uma oceânica expectativa na sociedade que temo seja rapidamente frustrada.

Doing wrong business

A MP parece ser um efeito rebote do projeto Doing Business, justamente depois do projeto ter sido declarado morto pelo próprio Banco Mundial[30].

O DB era uma iniciativa importante? Claro, havia aspectos positivos e isso nunca se negou, embora fosse necessário ajustar o foco e verificar em que medida a sua metodologia estava adequada para avaliar e ponderar a natureza singular e específica do sistema registral brasileiro, filiado aos sistemas de registros de direitos.

Há um fetiche aninhado naquelas formulações simplistas e reducionistas. BENITO ARRUÑADA, já em 2007, se perguntava – is ‘Doing Business’ damaging business?[31] O economista e catedrático espanhol se deteve na cuidadosa tarefa de explicitar as graves distorções que acabam por prejudicar as reformas institucionais[32].

Nunca é demais relembrar que a atividade registral nos países da Europa Continental (e mesmo no Reino Unido) não se compagina com cadastros ou com modelos plug-and-play que são próprios de entidades registradoras afeiçoadas ao MERS (Mortgage Eletronic Registry System)[33]. Rapidez nem sempre é sinônimo de eficiência e segurança, como terão apreendido os norte-americanos com o colapso de sua entidade registradora no bojo da crise das hipotecas podres[34]. A tendência do direito brasileiro parece ser emular os institutos dos gringos. Estamos fiduciarizando créditos com representações cartulares (digitais) que nascem para circular em entidades registradoras. Qualquer semelhança deste sistema de informações com o MERS é mera certeza.

De fato, a tendência claramente perceptível da reforma aponta na direção da desestruturação do modelo institucional, promovendo a centralização de dados registrais (SERP)[35], supressão progressiva da qualificação registral (registro por indicação em formulários eletrônicos em XML), subdelegação de atribuições, contubérnio entre as especialidades, tudo em troca de expectável rapidez, comodidade e modicidade nas operações.

Acha-se em curso uma evidente descaracterização dos chamados “registros de direitos”, degradando-os a simples “registros de documentos”[36]… Isso, quando não se transfigura o modelar sistema registral pátrio em cadastros imobiliários[37] ou a meros repositórios de dados – ainda que estes sejam, na idade dos dados, ativos muito valiosos. Porém, como dito, dados não são informação que não se confunde com os registros que consubstanciam a chamada publicidade jurídica. São coisas muito distintas e nenhum jurista, jamais, confundiria seus termos.

Não se diga que não alertamos os nossos interlocutores acerca das graves distorções que guardavam o projeto, decalcado da metodologia do World Bank. O tema do Doing Business seria amplamente discutido no transcurso do XVIII International Congress of IPRA-CINDER, realizado em Amsterdam, Holanda, em 2012. Rapidez não é sinônimo de eficiência e segurança, já o dissemos, especialmente quando está em causa um mister de cariz eminentemente jurídico, dependente de um juízo prévio de qualificação, garantia de estabilidade e segurança jurídicas[38].

Não se deve perder de vista, por fim, que a atribuição legal para a formação de índices de preços do mercado imobiliário é atividade própria do Estado e de seus cadastros imobiliários. Há previsão regulamentar que comete essa atividade ao IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística[39]. Esta é uma típica atividade de um bom cadastro técnico multifinalitário. É atribuição estatal. Não tem muito sentido atribuí-la a uma pessoa jurídica de direito privado.

Conclusão: rejunte de fragmentos de uma obra despedaçada

É necessário, mais do que nunca, contribuir positivamente para que o projeto possa germinar e prosperar, escoimando-o das imperfeições no transcurso do processo legislativo. Faz-se necessário o rejunte de fragmentos de uma obra despedaçada.

A crítica não se dirige direta e exclusivamente ao Governo Federal, nem às entidades que apostaram no discurso modernizador alardeado como slogan de duvidoso acerto. A crítica é, na verdade, uma autocrítica. Sim, os registradores imobiliários não foram capazes de oferecer à sociedade um projeto adequado, racional e tecnicamente bem ajustado em atenção às demandas da sociedade, coordenando-as com as tradições de um sistema jurídico honorável, estável e eficiente, obra de grandes juristas consolidada ao longo do último século.

Sabemos como uma ideia fora do lugar se inicia, mas não sabemos até que ponto pode chegar. A MP instaurou um conflito desnecessário na classe notarial e registral, inoculou o germe da desconfiança interpartes, criou expectativas nos agentes do mercado, desconsiderou, olimpicamente, o trabalho realizado pelo Poder Judiciário – seja pelas Corregedorias Estaduais ou pela Corregedoria Nacional de Justiça – descartando as conquistas de várias décadas.

Não é pouco o que se fez, mas a nossa resiliência é ainda maior.


Notas

[1] Nota Técnica 2/2020, de 6/8/2020. Acesso: https://bit.ly/3qgSWPL. Afastando qualquer interpretação no sentido de que o IRIB, sob minha presidência, se omitiu em face dos convites enviados para apreciar e manifestar publicamente nossa opinião, indico o dossiê que se acha aqui: https://cartorios.org/2020/09/19/dinamizacao-do-credito/.

[2] Ainda, em 2020, fizemos uma crítica pontual a vários dispositivos que, afinal, vieram na MP 1.085. Consulte: https://cartorios.org/2020/09/29/dinamizacao-do-credito-indice/.

[3] R7 PLANALTO. Nota de Mariana Londres. Brasília, 2/3/2022, 21h56. Acesso: https://bit.ly/3HJUURw. Nesta madrugada, vejo que em decorrência da retirada da urgência constitucional, o PL 4.188/21 passa a tramitar sob o regime de prioridade e estará sujeito à apreciação do Plenário.

[4] Há fundadas razões para objetar a falta de urgência e relevância de uma medida provisória que projeta no tempo sua plena eficácia (art. 21), além da dependência de regulamentação de muitos dispositivos pela Corregedoria Nacional de Justiça. É evidente que a matéria se acomodaria muito melhor num projeto de lei.

[5] O modelo de big-bang do registro eletrônico foi debatido no âmbito da comissão criada elo CNJ (SREI-CNJ-LSITEC). O registrador NICOLÁS NOGUEROLES escreveu sobre o tema. Vale a pena refletir sobre a experiência europeia de transmigração mediática (de medium). NOGUEROLES, Nicolás. ¿Reforma big-bang o reforma gradual? Inglaterra y Alemania: dos reformas recientes. Acesso: https://folivm.files.wordpress.com/2011/04/dos-maneras-de-reformar-ref-big-bang-2.pdf.

[6] JACOMINO, Sérgio. IRIB – até aqui viemos e daqui outros haverão de partir. São Paulo: Observatório do Registro, 2021, acesso: https://cartorios.org/2021/06/05/irib-carta/; vide também: JACOMINO, Sérgio. Sendas para o futuro do Registro de Imóveis. São Paulo: Observatório do Registro, 2018. Acesso: https://cartorios.org/2018/08/17/sendas-para-o-futuro-do-registro-de-imoveis/.

[7] Só para não passar como mera peça de retórica: Decreto 3.322, de 14 de julho de 1887, pelo qual se determina “que os officios de Justiça sejam providos nas Províncias pelos respectivos Presidentes mediante concurso”. Vide: JACOMINO, Sérgio. Concursos e hereditariedade. São Paulo: Observatório do Registro, 2007. Acesso: https://cartorios.org/2007/11/20/concursos-e-hereditariedade/.

[8] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 258, “e”.

[9] Aliás, calha destacar que a criação de Centrais Eletrônicas de Serviços Eletrônicos Compartilhados, criadas nos estados por força do Provimento CNJ 47/2015, jamais visou trasladar atribuições que são próprias de registradores para ditas centrais. A criação de plataformas de compartilhamento buscou imprimir maior eficiência na prestação dos serviços registrais (art. 4º cc. art. 38 da Lei 8.935/1994). Vide: JACOMINO, Sérgio.  Compartilhamento de recursos X centralização e prestação de serviços in O CNJ, o ONR, o SREI e as Centrais de Cartórios. São Paulo: Observatório do Registro, 2021, acesso: https://cartorios.org/2021/09/13/onr-e-cnj/.

[10] Sobre a ideia de que seria o próprio cartório o ente personalizado prestador dos serviços notariais e registrais, confira o decidido no Processo CG 1.044/1995, Cândido Mota, parecer de MARCELO MARTINS BERTHE e CLÁUDIO LUIZ BUENO DE GODOY de 27/9/1995, aprovado por votação unânime pelo Egrégio Conselho Superior da Magistratura de São Paulo, em 2/5/1996. As atribuições e competências notariais e registrais foram cometidas diretamente à pessoa dos delegatários. Acesso: http://kollsys.org/az.

[11] DIP, Ricardo. Da responsabilidade civil e penal dos oficiais registradores. RDI 53, jul./dez. 2002, p. 89.

[12] ALIENDE RIBEIRO. Luís Paulo. Regulação da Função Pública Notarial e de Registro. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 60 passim. Vide especialmente o item 2.2.1. O grifos são nossos.

[13] ALIENDE RIBEIRO. Luís Paulo. Delegação não se delega. 4º Ciclo de Debates: Café com Jurisprudência. São Paulo: Escola Paulista da Magistratura, 13/4/2012.

[14] BANDEIRA DE MELLO, Oswaldo Aranha. Princípios Gerais de Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1974, p. 364-5, n. 34.5

[15] ADI 2.415/SP, j. 22/9/2011, pleno, Dje 9/2/2012, Rel. Min. AYRES BRITTO. Vide igualmente: JACOMINO, Sérgio. O CNJ, o ONR, o SREI e as Centrais de Cartórios. São Paulo: Observatório do Registro, 2021. Acesso: https://cartorios.org/2021/09/13/onr-e-cnj/. Criticando dispositivo análogo, consulte: JACOMINO, Sérgio. Para-registração – um fenômeno da modernidade? São Paulo: Observatório do Registro, 2021. Acesso: https://cartorios.org/2020/09/29/para-registracao-um-fenomeno-da-modernidade/.

[16] RE 842.846-SC, j. 27/2/2019, Rel. Min. LUIZ FUX.

[17] Na gestão do Des. MARCELO BERTHE na 1ª Vara de Registros Públicos foi criado um sistema rudimentar de comunicação que foi batizado de “Círculo Registral”. Vide: OS 7/2007, de 20/8/2007, DJ 27/8/2007. Acesso: http://kollsys.org/9oo. Posteriormente, a experiência se ampliaria. Vide: JACOMINO, Sérgio. Círculo Registral – cartórios de SP integrados em rede na internet. São Paulo: Observatório do Registro, 16/3/2011, acesso: https://wp.me/p6rdW-o1.

[18] Há uma exploração de um tema que pode representar eventual desconhecimento ou desonestidade intelectual. Fala-se, amiúde, que o SREI/ONR concentraria dados, prestaria serviços de registro em sentido próprio, malferindo, assim, a LGPD, além de outros argumentos desse mesmo jaez. Tratei de refutar vários desses artigos que espocavam sincronicamente na imprensa na exata medida em que as medidas de concretização do SREI ganhavam impulso no CNJ. Para conhecer a nossa posição, criei um pequeno dossiê que o leitor pode acessar aqui: https://bit.ly/ONRcentral.

[19] Esta compreensão consubstanciou o voto do Min. DIAS TOFFOLI em voto proferido no PP 00003703-65.2020.2.00.0000. Acesso: http://kollsys.org/p2e. Para um aprofundamento indico: JACOMINO, Sérgio. Agonia central – ou anomia registral? – bis. São Paulo: Observatório do Registro, 23/10/2021, acesso: https://wp.me/p6rdW-2Lt.

[20] SZABO. Nick. The God Protocols. Satoshi Nakamoto Institute, 1997. Acesso: https://nakamotoinstitute.org/the-god-protocols/.

[21] Do mesmo autor: Secure Property Titles with Owner Authority. Satoshi Nakamoto Institute, 1998. Acesso: https://nakamotoinstitute.org/secure-property-titles/.

[22] LAUDON, Kenneth;  LAUDON, Jane. Sistemas de Informações Gerenciais. 9. ed. São Paulo: Pearson, 2011, p. 12 passim.  

[23] MCKAY, Carolyn. Predicting Risk in Criminal Procedure: Actuarial Tools, Algorithms, AI and Judicial Decision-Making. Sydney Law School Research Paper 19/67, 2019.

[24] Conheça em detalhes o Projeto SREI/CNJ/LSITEC aqui: https://folivm.com.br/cnj/.

[25] Conheça em detalhes a POC (Prova de Conceito) do SREI aqui: https://near-lab.com/2020/02/14/poc-srei/.

[26] JACOMINO, Sérgio. Registro Eletrônico – ontem, hoje e a construção do amanhã. São Paulo: Observatório do Registro, 2020. Acesso: https://cartorios.org/2020/06/10/registro-eletronico-ontem-hoje-e-a-construcao-do-amanha/.

[27] MOROZOV, Evgeny. To save everything, click here: the folly of technological solutionism. New York: PublicAffairs, 2013.

[28] Para um aprofundamento do tema, a propósito desta mesma proposta acolhida pelo SPE/ME, consulte: JACOMINO, Sérgio. As especialidades notariais e registrais e sua natureza. São Paulo: Observatório do Registro, 2021. Acesso: https://cartorios.org/2021/02/27/as-especialidades-notariais-e-registrais-e-sua-natureza/.

[29] Vide discurso na sessão de 6/6/1855 proferido pelo deputado ARAÚJO LIMA acerca da reforma da legislação hipotecária do Império. A expressão foi tomada de célebre poema de Horácio: “Se equina cerviz à cabeça humana o pintor / quisesse juntar, e atar plumas várias / a membros colhidos de cá e de lá, de modo que em peixe torpemente / atro termine uma mulher, formosa em cima, /admitidos ao espetáculo, conteríeis o riso, amigos?”. Vide: SANTOS. Marcos Martinho dos. (Trad). O monstrvm da arte poética de Horácio. Letras Clássicas, Universidade de São Paulo, n. 4, p. 191-265, 2000.

[30] ARRUÑADA, Benito. RIP Doing Business. São Paulo: Migalhas, 2021. Acesso: https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-notariais-e-registrais/352730/rip-doing-business.

[31] ARRUÑADA, Benito. Acesso: https://arrunada.org/blog/is-doing-business-damaging-business.

[32] ARRUÑADA, Benito. How Doing Business jeopardizes institutional reform. Acesso: https://ideas.repec.org/p/upf/upfgen/1088.html.

[33] DIP, Ricardo; MÉNDEZ GONZÁLEZ, Fernando P; JACOMINO, Sérgio. Registro Público de Imóveis Eletrônico: Riscos e Desafios. São Paulo: Quinta Editorial, 2012. Vide p. 51 e ss.

[34] Vide: MÉNDEZ GONZÁLEZ. Fernando; DIP, Ricardo; JACOMINO, Sérgio. Registro de Imóveis eletrônico. Risco e Desafios. São Paulo: Quinta Editorial, 2012, passim. Acesso: https://archive.org/details/registro-de-imoveis-eletronico.

[35] Inacreditavelmente, a centralização de dados registrais foi defendida em webinar promovido por associação de advogados e registradores: https://youtu.be/1D70_k3BQPY.

[36] Para uma visão panorâmica sobre os sistemas registrais, consulte: JARDIM, Mónica. Os sistema registrais e a sua diversidade. Argumentum Journal of Law, v. 21, n. 1, 2020. Acesso: http://ojs.unimar.br/index.php/revistaargumentum/article/view/1316/779.

[37] Era o caso do SINTER, criado pelo Decreto 8.764/2016. Para uma visão geral, acesse: JACOMINO, Sérgio. O SINTER e os irmãos siameses da gestão territorial – Decretos Federais 8.764 e 8.777 de 2016 em debate. Revista de Direito Imobiliário, São Paulo, n. 81, jul./dez. 2016.

[38] Fernando P. MÉNDEZ GONZÁLEZ indica um sumário rico e substancioso de artigos críticos acerca da metodologia do Doing Business. Consulte Mercado hipotecario y sistemas registrales. Especial referencia a la ejecución hipotecaria. In: 18th IPRA-CINDER International Land Registration Congress. Madrid: CORPME, 2012. p. 226, passim.

[39] Vide o Decreto nº 7.565 de 15/9/2011.

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