Instrumentos particulares, títulos digitalizados – requisitos técnicos. As reformas sucessivas da Lei 14.382/2022

O advento da Lei 14.382/2022 representou o despontar de um novo paradigma no sistema registral pátrio: a ereção do Registro de Documentos (ou menos que isso: registro de meras indicações eletrônicas), em oposição ao chamado Registro de Direitos, modelo adotado no Brasil desde as origens da publicidade hipotecária, em 1846, filiado às matrizes da Europa Continental[1]. O SREI – Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis vinha se estruturando, aperfeiçoando e modernizando sob os auspícios de um seleto grupo de registradores com a supervisão e coordenação do CNJ[2].

Lamentavelmente, as iniciativas foram colhidas por uma medida provisória (MP 1.085/2021) que nos brindou muitas e profundas mudanças, algumas muito boas, outras nem tanto. Como temos buscado demonstrar na série de artigos publicados no site Migalhas Notariais e Registrais, para nossa sorte (ou azar) ficamos a meio caminho das reformas pretendidas por seus protagonistas. A razão é simples: não se reforma uma instituição multissecular a partir de impulsos de açodado furor reformista[3]. Temos agora uma central de centrais (SERP) que a muito custo busca se estruturar. É um modelo manco e imperfeito, falto de referências a que pudesse se filiar de molde a alicerçar a propalada “modernização” do sistema registral pátrio. [ íntegra].

Et nascetur ridiculus mus…

A viragem do sistema, que intenta reconformar o direito notarial e registral brasileiro à imagem e semelhança de sistemas alienígenas – especificamente o modelo representado pela UNCITRAL – descaracteriza a atividade típica de juristas profissionais e adota o sistema de trânsito e inscrição de borderaux (notice), numa espécie de repristinação do modelo abandonado há mais de um século pelo Registro Imobiliário pátrio[4].

O modelo de Registro recomendado pela UNCITRAL (e por alguns registradores[5]) se baseia no conceito de registro atualizado por mera indicação (notice = extrato). No ambiente de transações eletrônicas, prescinde-se da formação  de um título e da prova pré-constituída a cargo de um órgão da fé pública (notário), tonando despicienda a qualificação registral exercida por um jurista especializado e independente. A inscrição, neste modelo, é “feita por meio do envio de um simples aviso (notice) que provê e atualiza o registro centralizado de informações básicas sobre os direitos de garantia a que se refere: (a) a identidade das partes; (b) descrição dos ativos onerados; e (c) o valor máximo para o qual a garantia é concedida e a duração solicitada do registro”[6].

Este sistema registral, como dissemos, prescinde do notariado latino, in verbis: o objetivo “é facilitar que os credores garantidos comprovem a existência e a data de criação de seus direitos de garantia. Nesses casos, o registro pode substituir o serviço de um notário”[7]. Portanto, um processo de registro “rápido e de baixo custo”[8], suficiente para garantir o crédito. “A ideia básica” – diz o guia  –  “é permitir o registro sem formalidades adicionais (como autenticações [affidavits] e notarização de documentos) desde que sejam pagos os valores de registro exigidos e preenchidos os campos de informação devidos no extrato”[9].

As alterações perpetradas contra o sistema tradicional do registro e das notas são expressão de um “voluntarismo idealista”, como notou RICARDO DIP. É paradoxal, diz ele, “que se repita, entre nós, um fenômeno que faz tempo assediara países europeus: a americanização do direito, que, em nosso caso, tomou a forma de uma orientação tecnicista, empolgada por um parâmetro utilitarista”[10]. Está em causa a “deslatinização” das notas e dos registros imobiliários brasileiros, fato denunciado por ele:

“A americanização no campo do direito notarial tem levado a uma paulatina deslatinização de nosso notariado, que se vai, gradualmente, inclinando a um dado hibridismo com elementos da família anglo-saxã do notariado, mas também com elementos do notariado administrativista”.

A criação de centrais de registradores nos estados brasileiros, impulsionados pela entidade representativa de todas elas – que se autodenominou, por fenômeno de antonomásia, “Registro de Imóveis do Brasil” – contribuiu de forma decisiva para o processo de desconstrução da tradição do direito notarial e registral. Segue RICARDO DIP:

“Exemplos dessa combinação de causas desconstrutivas da latinidade notarial e registrária podem recrutar-se da experiência atual brasileira, em que se têm atribuído atividades próprias das notas e dos registros a grupos privados, frequentemente entidades de classe, o que se cumpre, no entanto, e em boa parte das vezes, por meio de resoluções e provimentos judicial-administrativos” (…)[11].

Esta agremiação corporativa heterodoxa está prevista na Lei do SERP. Nós mesmos já indicáramos, em várias passagens, que a inflexão verificada nos últimos tempos acabaria por nos conduzir a novos modelos de organização corporativa e institucional, dissonantes do perfil constitucionalmente consagrado. As atividades próprias dos registradores, suas funções delegadas, “não podem ser reconduzidas e trespassadas, por via de subdelegação, a entes privados coletivos e personalizados”[12].

Monstro de Horácio, dependente inteiramente de regulamentação, o novo paradigma, inaugurado pela lei, insinuou-se no direito civil brasileiro como corpus alienus. O SERP é uma péssima resposta à caça de uma boa pergunta. Alardeado aos quatro ventos como iniciativa modernizadora do Registro de Imóveis, constatamos, desolados, e parafraseando Horácio: parturient montes nascetur ridiculus mus[13]

Esta longa digressão vestibular visa a contextualizar as medidas sucessivas à reforma representada pelo advento da Lei 14.620, de 13/7/2023, que, entre outros dispositivos, reformou o inc. II do art. 221 da LRP e o art. 17-A, inserido na Lei das Assinaturas Eletrônicas (Lei 14.063/2020). As questões relacionadas com a revalorização da notarização e autenticação de títulos encaminhados a registro renovam a necessidade e a importância da discussão dos seguintes pontos: que Registro de Imóveis a sociedade almeja? Serão os notários ainda parte essencial do sistema de segurança jurídico-preventiva? Como os registradores devem examinar os instrumentos particulares que acedem às serventias imobiliárias por meio das plataformas eletrônicas?

São questões que este artigo pretende enfrentar, contribuindo com o debate e a regulamentação da dita lei.

Reforma da reforma da reforma

Já havíamos nos debruçado sobre alguns destes temas por ocasião do advento da MP 1.085/2021, da Lei 14.382/2022 e da MP 1.162, de 2023[14]. Agora, com a conversão desta última na Lei 14.620, de 13/7/2023, vale a pena revistar os assuntos agitados. Vamos aos dispositivos que nos interessam por ora:

LRP:

Art. 221 – Somente são admitidos registro: (…)

II – escritos particulares autorizados em lei, assinados pelas partes e pelas testemunhas, com as firmas reconhecidas; (…)

§ 5º  Os escritos particulares a que se refere o inciso II do caput deste artigo, quando relativos a atos praticados por instituições financeiras que atuem com crédito imobiliário autorizadas a celebrar instrumentos particulares com caráter de escritura pública, dispensam as testemunhas e o reconhecimento de firma.  

A Lei nº 14.063, de 23 de setembro de 2020: (…)

“Art. 17-A. As instituições financeiras que atuem com crédito imobiliário autorizadas a celebrar instrumentos particulares com caráter de escritura pública e os partícipes dos contratos correspondentes poderão fazer uso das assinaturas eletrônicas nas modalidades avançada e qualificada de que trata esta Lei.

Parágrafo único. (VETADO).” (NR)

Partimos do pressuposto de que todas as disposições normativas anteriormente vigentes perderam a eficácia em face da nova e clara disposição legal – especialmente porque estamos diante de dispositivos consagradas na própria Lei de Registros Públicos. A regra geral, ali insculpida, é clara: os instrumentos particulares devem trazer as assinatura de todas as partes, além das testemunhas, todas com firmas reconhecidas, i. e., autenticadas por notários – ou como se diz, devem ser “notarizadas”.

Houve uma reviravolta significativa. Ao passo que o CPC foi alterado para dispensar a firma de testemunhas nos casos de assinatura eletrônica aposta aos títulos executivos extrajudiciais – “quando sua integridade for conferida por provedor de assinatura” (§ 4º do art. 784 do CPC)[15], na LRP, o rigor formal, ao contrário, se acentuou. No fundo, o provedor de assinatura eletrônica não passa de terceiro que pode supletivamente comprovar a autoria e integridade do contrato eletrônico por meios tecnológicos, sempre com o resguardo de seguro-garantia[16]. A garantia nestes casos sempre é de caráter econômico e tecnológico.

No caso dos instrumentos particulares admitidos a registro, a lei exige, naturalmente, maior rigor, já que o título é o sustentáculo da inscrição no modelo causalista do nosso sistema do Direito Civil, ainda não abolido[17]. Ora, contaminado ou inquinado que seja o título por qualquer defeito essencial, exsurge a hipótese de nulidade, fulminando a eficácia que decorre do ato constitutivo ou declarativo do registro. O instrumento – causa remota do registro, “motor da ação”, na feliz expressão de JOÃO MENDES DE ALMEIDA JR. –  é o documento que porta efeitos jurídicos muito próprios[18]; trata-se de “forma especial, dotada de força orgânica para realizar ou tornar exequível um ato jurídico”[19].

Quando nos referimos à “força orgânica” destes títulos, devemos recuperar, neste contexto, o sentido original do art. 10 da MP 2.200-2, de 2001, que considera “documentos públicos ou particulares, para todos os fins legais, os documentos eletrônicos de que trata esta Medida Provisória”. Ora, a equivalência se dá nos requisitos e nos efeitos que dimanam dos títulos – sejam eles instrumentos públicos ou privados, ambos com força orgânica para inovar a situação jurídica, independentemente dos meios ou suportes em que forem consubstanciados. Vale dizer, se é exigida a escritura pública (como regra geral) e a notarização do instrumento particular (a teor do inc. II do art. 221 da LRP), o título eletrônico, para todos os efeitos legais, deve observar iguais requisitos, de molde a atrair as presunções que decorrem da lei e que se consubstanciam pela atuação notarial.

Confundem-se, muitas vezes adrede, o representante digital (digital surrogate) com o documento autêntico – o título original com o digitalizado[20]. Uma “cópia” não pode converter-se, como que num passe de mágica, em “original”, por mais admiráveis que se revelem os artefatos tecnológicos[21]. Para todos os efeitos legais, autêntico é o “documento quando o tabelião reconhecer a firma do signatário” (inc. I do art. 411 do CPC c.c. inc. IV do art. 7º da Lei 8.935/1994). A escritura pública faz prova da formação e dos fatos que o notário captar, traduzir e consagrar em suas notas (art. 405 do CPC). Insista-se: a atuação notarial faz “prova plena” (art. 215 do CC).  ALVES BRAGA JR. apanhou muito bem este quadro:

“Convém aqui observar que a situação dos traslados digitais notariais é diversa dos instrumentos particulares em geral. Os instrumentos particulares devem conter as assinaturas de todos os contratantes, anuentes e testemunhas. Deste modo, para uso dos meios eletrônicos, o instrumento particular tem que ser produzido nativamente como documento digital e trazer os certificados digitais de tantos quantos sejam os subscritores, já que a digitalização de instrumento impresso, mesmo com aplicação de certificado digital, representaria mera cópia autenticada, e, portanto, não apta a registro”[22].

Não se nega, por óbvio, que a assinatura eletrônica possa provar a autenticidade, integridade e autoria dos documentos (inc. II do art. 411 do CPC), porém cum grano salis, i. e., com diferentes graus de segurança e eficácia (inc. II do art. 3º da Lei 14.063/2020), sabendo-se de antemão que a assinatura eletrônica qualificada é “a que possui o nível mais elevado de confiabilidade a partir de suas normas, de seus padrões e de seus procedimentos específicos” (dicção do § 1º do art. 4º da Lei das Assinaturas Eletrônicas). Por esta razão, para os efeitos de se promover a mutação jurídico-real (“atos de transferência e de registro de bens imóveis”, na dicção da lei) é exigível a assinatura eletrônica na modalidade qualificada (inc. IV, § 2º, do art. 5º da Lei 14.063/2020).  

Extrato de instrumentos particulares

A Lei 14.382/2022 previu uma nova modalidade de título – o extrato. Na reforma da reforma da reforma, o envio de extratos ao Registro de Imóveis, quando cabível, deverá ser feito: (a) por notários (inc. III, 1º, do art. 6º, in fine), entidades financeiras do crédito imobiliário (inc. IV) ou (c) qualquer interessado (inc. III), in verbis:

Art. 6º Os oficiais dos registros públicos, quando cabível, receberão dos interessados, por meio do Serp, os extratos eletrônicos para registro ou averbação de fatos, de atos e de negócios jurídicos, nos termos do inciso VIII[23] do caput do art. 7º desta Lei.

III – Os extratos eletrônicos relativos a bens imóveis deverão, obrigatoriamente, ser acompanhados do arquivamento da íntegra do instrumento contratual, em cópia simples, exceto se apresentados por tabelião de notas, hipótese em que este arquivará o instrumento contratual em pasta própria.

IV – os extratos eletrônicos relativos a bens imóveis produzidos pelas instituições financeiras que atuem com crédito imobiliário autorizadas a celebrar instrumentos particulares com caráter de escritura pública poderão ser apresentados ao registro eletrônico de imóveis e as referidas instituições financeiras arquivarão o instrumento contratual em pasta própria.

Em relação ao inc. IV, a hipótese é reprodução de dispositivos das normas administrativas que vigoraram no Estado de São Paulo por certo tempo[24], regras estas que vêm de ser reformadas em face do advento da Lei 14.382/2022. A nova disposição normativa acha-se hoje consagrada nos itens 111 e subitens do Capítulo XX das NSCGJSP, que admitem o acesso de extratos de qualquer título (referidos a fatos, atos e negócios jurídicos) não mais limitando-se aos instrumentos oriundos do SFH e SFI[25].

Em relação aos notários, surgem algumas dúvidas: receberão os instrumentos no original ou cópia? Qualificarão ditos instrumentos, examinando a situação jurídica dos bens imóveis – como fazem ordinariamente antes de lavrar as escrituras? Arquivarão os contratos em “pastas próprias” ou os depositarão no SERP para envio dos extratos a registro, ex vi do inc. VIII do art. 3º da lei?

Por fim – e por exclusão –, restam os demais “interessados”. Se as exceções são tratadas nos incisos III e IV, remanesce ainda a hipótese da ocorrência de quaisquer outros interessados que postulem o envio de extratos ao Registro, “títulos” que deverão “obrigatoriamente” ser “acompanhados do arquivamento da íntegra do instrumento contratual, em cópia simples com declaração adjeta, assinada eletronicamente, “de que seu conteúdo corresponde ao original firmado pelas partes”. (§ 4º do art. 6º da Lei 14.382/2022)”.

É possível admitir esta hipótese a partir do texto da lei? Vamos examinar o assunto com mais detida atenção.

Interessados, apresentantes, partes…

Justamente neste ponto reside o calcanhar de Aquiles do sistema registral – tal e como se acha após a reforma. Vamos a alguns pontos delicados.

A lei alude no art. 6º a “interessados” – não a “qualquer pessoa” (art. 217 da LRP), nem a meros apresentantes (art. 12 c.c. art. 194 da LRP e § 4º do art. 6º da Lei 14.382/2022). Sabemos, teoricamente, as distinções entre apresentante, portador, interessado, partes, e como cada ator pode figurar no processo de registro[26]. Entretanto, na prática os conceitos se confundem e a novel lei não pode aclarar. Para nossos objetivos mais estritos, pergunta-se: como se qualificará o interesse do apresentante do extrato? Basta declaração unilateral por ele firmada? O que deve declarar? Exige-se o reconhecimento de firma ou sua assinatura eletrônica qualificada (§ 4º do art. 6º da Lei 14.382/2022)? Presume-se que ele seja mandatário tácito das partes contratantes? Devem ser outorgados poderes expressos e especiais pelas partes? Que pré-requisitos deve o interessado preencher para se qualificar como tal? Deve justificá-los e prová-los? O registrador deve qualificar o legítimo interesse e a justificação apresentada?

A questão da rogação (princípio de rogação ou de instância) se renova no âmbito desta reforma. Somente o “interessado” poderá rogar a inscrição por meio de extrato pareado por contrato e “declaração, assinada eletronicamente, de que seu conteúdo corresponde ao original firmado pelas partes” (§ 4º do art. 6º da Lei 14.382/2022).

Os regulamentos de registro de imóveis originariamente consagravam o princípio de que a parte interessada deveria ser o protagonista (parte interessada) que instaurava o processo de registro – e até mesmo para o pedido de suscitação de dúvida registral[27]. O CSMSP também destaca a importância de se qualificar o legítimo interesse para instar a inscrição[28].

Quem terá legitimidade para “autenticar” o transunto titular extratado? O interessado com interesse qualificado? O tabelião, que detém a competência legal para autenticar não só cópias “com exclusividade” (inc. V do art. 7º da Lei 8.935), mas a autoria e a integridade do título (inc. I do art. 411 do CPC c.c. art. 223 do CC)?

Um dos mais importantes protagonistas da reforma – ABRAINC, Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias – apresentou ao CNJ sugestões para a regulamentação da Lei 14.382/22[29]. Pela proposta, além dos notários e das instituições financeiras, igualmente as companhias securitizadoras, os loteadores e os incorporadores poderão enviar extratos nas condições referidas na lei. Segundo ela, a mens legislatoris revela que o “caput do art. 6º, da Lei nº 14.382/22, deixou de especificar quem poderá enviar os extratos, quais atos poderão ser por eles representados e quais bens poderão ser objeto. Essa abordagem propositalmente genérica pretendia delegar tal definição à futura regulamentação da lei pela Corregedoria Nacional de Justiça do CNJ, nos termos do inciso VIII do caput do art. 7º”[30].

Antes de sugerir a inclusão da categoria de incorporadores, loteadores e companhias securitizadoras no ato administrativo a ser baixado pelo CNJ, é necessário responder a esta singela questão: com base estritamente na literalidade da lei, quem poderá fazê-lo? Sabemos que o regulamento não pode ir além (nem aquém) do que a lei prevê, nem obviamente criar direitos e obrigações. A dispensa dos requisitos formais obrigatórios, nos termos do art. 221 da LRP, trará profundas consequências no processo de registro. Parece razoável responder, de modo consentâneo com a tradição do Direito brasileiro, que sejam exclusivamente os notários (fé pública) e as instituições financeiras do crédito imobiliário (segurança econômica, tecnológica e institucional – vide infra), mas tal conclusão não se extrai singelamente do texto da lei e a regulamentação não deixará de ser uma operação bastante delicada.

Por outro lado, quais os títulos serão admitidos nesta modalidade extratada? Diz-nos a mesma ABRAINC: Instrumento particular de compra e venda com hipoteca ou alienação fiduciária de imóvel, cédulas, garantias reais imobiliárias, aditivos e aditamentos, além de quitações de dívidas garantidas entre outros[31]. Como veremos logo abaixo, a Lei 14.620/2023, passou a exigir que os instrumentos particulares apresentados a registro deverão ter as firmas das partes e testemunhas reconhecidas, à exceção dos contratos oriundos de “instituições financeiras que atuem com crédito imobiliário”. Voltaremos ao tema logo abaixo.

Por fim, exsurge o problema da responsabilidade civil, penal e administrativa do Registrador pelo acolhimento de declaração unilateral do apresentante de que o representante digital confere com o instrumento firmado pelas partes (§ 4º do art. 6º). Diz a respeitável Associação que a regulamentação do CNJ deve desonerar o Oficial de qualquer responsabilidade por inconformidades porventura existentes, cabendo ao apresentante a “efetiva verificação da identificação e da regularidade da representação das partes que firmaram assinaturas manuscritas ou eletrônicas no instrumento que deu origem ao extrato”[32]. Ou seja, pretende-se que um ato administrativo exonere o Oficial (ou o próprio Estado[33]) da responsabilidade civil e penal decorrentes de eventuais danos causados a terceiros, “revogando” o art. 22 da Lei 8.935/1995[34] e de modo reflexo os §§ 1º do art. 236 e 6º do art. 37 da CF/1988…

Além disso, promove-se uma espécie de subdelegação de ofício e de atribuições próprias do notário[35], trespassando-as ao mero apresentante que, desse modo, poderá promover a “efetiva verificação da identificação e da regularidade da representação das partes que firmaram assinaturas [sic] manuscritas ou eletrônicas no instrumento que deu origem ao extrato.”[36].

No transcurso da série de debates sobre documentos eletrônicos e o Registro de Imóveis, um dos participantes chamou-nos a atenção para o fato de que os incisos do art. 6º (III e IV) apontariam para as duas únicas hipóteses possíveis. Assim, nesta perspectiva, poderão enviar os extratos: (a) as instituições financeiras (inc. IV) e (b) os notários (inc. III). Os privados já não poderiam encaminhar extratos para o Registro de Imóveis[37].

São questões soltas e desligadas do sistema tradicional pela reforma aziaga. O sistema deverá ser muito bem regulamentado pela Corregedoria Nacional de Justiça do CNJ, a teor do inc. VIII do art. 7º da Lei 14.283/2022, sob pena de se consumar lamentável desvirtuamento do tradicional sistema de segurança jurídica erigido ao longo de mais de uma centúria, sem o bônus de se ter alcançado uma alternativa eficiente e tecnicamente adequada.

Extratos x “instrumento contratual” – autenticidade em meios eletrônicos

Quais os requisitos formais dos extratos? O que devem conter? Quem os assinará? Quem os autenticará? Quem fará o concertação do extrato com o contrato? O § 4º do art. 6º da Lei 14.382/2022 reza:

§ 4º O instrumento contratual a que se referem os incisos II e III do § 1º deste artigo será apresentado por meio de documento eletrônico ou digitalizado, nos termos do inciso VIII do caput do art. 3º desta Lei[38], acompanhado de declaração, assinada eletronicamente, de que seu conteúdo corresponde ao original firmado pelas partes.

Temos o extrato ao lado do “instrumento contratual”, que pode ser um documento eletrônico ou digitalizado, “firmado pelas partes” (§ 4º do art. 6º da Lei 14.382/2022). Deixemos de lado o qualificativo contratual, por eventual inadequação neste contexto, já que há instrumentos não contratuais que acedem ao Registro e que poderiam, em tese, ingressar por meio de extratos (e basta verificar a abrangência do caput do art. 6º: “registro ou averbação de fatos, de atos e de negócios jurídicos”). Fiquemos, por ora, nas distinções entre documento eletrônico e digitalizado.

Grassa certa confusão entre documentos em forma eletrônica (§ 4º do art. 1º da LRP), contratos em forma eletrônica (parágrafo único do art. 167 da LRP), documentos eletrônicos (inc. II, § 1º do art. 188 da LRP e inc. VIII do art. 3º da Lei 14.382/2022), títulos em formato eletrônico (inc. inc. V do art. 3º da Lei 14.382/2022), documento digital (art. 194 da LRP), extrato eletrônico (art. 6º da Lei 14.382/2022).

O intérprete é tentado a classificar o conjunto representado por documentos, títulos, extratos em forma eletrônica como gênero – documento eletrônico –, do qual derivam as principais espécies: (a) documento nato-digital, (b) documento digitalizado e (c) documento digitalizado assinado digitalmente com certificados da ICP-Brasil.

A generalidade dos documentos eletrônicos é formada, substancialmente, por uma sequência logicamente ordenada de bits e bytes, gravada, mantida, acessada, lida e interpretada por máquinas (sistemas e algoritmos computacionais)[39]. Cada espécie de documento eletrônico apresenta características próprias e singulares e que devem ser bem compreendidas. Além disso, tanto um quanto outro, quer sejam extratos ou instrumentos, podem receber a aposição de assinaturas eletrônicas e neste caso, quando ingressam no Registro de Imóveis, tanto o documento nato-digital quanto o digitalizado, assinados com a aposição de todas as assinaturas eletrônicas qualificadas, tornam-se títulos autênticos, aptos a produzir todos os seus efeitos.

Nos casos de documentos meramente digitalizados, entendemos que, salvo a aposição de assinaturas eletrônicas qualificadas das partes, intervenientes e testemunhas, tais documentos serão meras “cópias simples”, portanto imprestáveis para sustentar o ato de registro. As “cópias simples” (inc. III, § 1º do art. 6º) deverão ser apresentadas acompanhadas “de declaração, assinada eletronicamente, de que seu conteúdo corresponde ao original firmado pelas partes”, diz a norma. Calha perguntar: esta declaração deverá ser firmada com assinatura eletrônica qualificada? Quem poderá “autenticar” as cópias? O apresentante? O interessado? E o original firmado pelas partes? Onde será mantido e arquivado?

Vimos anteriormente que compete ao notário, com exclusividade, autenticar a reprodução e autenticação de documentos e o reconhecimento de firmas (incs. IV e V do art. 6º da Lei 8.935/1994). Admitir-se que qualquer interessado ou mero apresentante possa fazê-lo pode nos levar à fragilidade do sistema registral pela inoculação do germe da insegurança jurídica no corpo do Registro. Afinal, garbage in, garbage out, ou seja, o que entra no Livro de Registro, sem que haja qualquer controle ex ante acerca da legalidade, determinação de autoria, autenticidade, integridade dos títulos, transforma o sistema de publicidade registral em mecanismo de irradiação potencializada de situações jurídicas inseguras e portanto precárias. Estaremos dependentes de confirmação judicial ex post no caso de conflitos[40]e com isso degradam-se as presunções que decorrem do ato de registro (art. 1.231 do CC). As partes deixam de premunirem-se de potentes efeitos presuntivos.

Por outro lado, será necessário o reconhecimento notarial das assinaturas eletrônicas qualificadas? Sabemos que a autenticidade das assinaturas eletrônicas qualificadas se presume, pois tal decorre diretamente da cadeia de certificados filiados à ICP-Brasil, cuja raiz é o próprio Estado brasileiro. É da autoridade estatal, ao final e ao cabo, de onde promanam as presunções de autenticidade e integridade de documentos assinados com a chave criptográfica da ICP-Brasil, independentemente de qualquer admissão prévia de validade da contraparte ou aceitação daquele a quem se oporá o documento[41]. A validade, autenticidade e integridade dos documentos assinados eletronicamente decorrem da própria lei que regula o procedimento de certificação digital, gerando importantes efeitos jurídicos – presunção relativa de autoria e autenticidade (iuris tantum)[42], como ocorre igualmente com o reconhecimento notarial de firmas.

Por fim, diz a Lei que o documento eletrônico ou digitalizado será postado por meio do SERP (inc. VIII do art. 3º da Lei 14.382/2022) que fará “o armazenamento de documentos eletrônicos para dar suporte aos atos registrais”. Tal dispositivo é aberração, além de contraditório. Ou o instrumento será arquivado nas notas do Tabelião (inc. III, § 1º do art. 6º), ou em pastas próprias das instituições financeiras (inc. IV do § 1º do art. 6º) ou no próprio Registro (inc. III, § 1º do art. 6º). Remanescesse o “instrumento contratual” no SERP, este expediria certidão dos documentos “registrados” na plataforma? Teremos um novo RTD? A plataforma dará fé da autoria, autenticidade e integridade dos documentos privados recebidos e albergados nos seus repositórios? Será possível responsabilizar – civil, administrativa e penalmente – a extravagante pessoa jurídica de direito privado (§ 4º do art. 3º da Lei 14.382/2022) em face da má gestão e erros cometidos por algoritmos ou por funcionários contratados pela associação? Seus administradores serão responsabilizados por erros, má gestão, falsidade documental etc.? Arcarão com prejuízos em decorrência da responsabilidade objetiva? O Estado será acionado? Os registradores serão solidariamente responsáveis? A Corregedoria Nacional de Justiça e as Corregedorias estaduais terão poder correcional e de fiscalização de entes privados personalizados?[43]

Por fim, pergunta-se: o recebimento do instrumento via SERP ou ONR livra-o de nódoas eventuais dotando-o de potência em ordem a inovar a situação jurídico-real? A simples passagem pelos portais tecnológicos purga os títulos de eventuais vícios? Dota-os dos requisitos exigidos por lei? A “autenticação” imprópria da plataforma supre a exigência legal do reconhecimento de firmas? Por outro lado, livra o registrador de responsabilidades civil, administrativa, penal?

A situação é semelhante àquela que, no início do século XX dividia a doutrina acerca da validade de instrumentos registrados em RTD. A certidão extraída do registro público não torna autêntico o título pelo simples fato dele ter sido registrado. CARVALHO SANTOS cravaria acertadamente que as certidões extraídas dos instrumentos particulares registrados em RTD fazem a mesma prova que os originais, vale dizer, o mesmo valor probante que os livros de registro. E conclui: “o valor probante que serve de paradigma, portanto, tem de ser o dos livros”, jamais do título neles registrado[44].

Extratos assinados digitalmente

Retrocedamos um passo. O inc. III do § 1º, do art. 6º reza:

“III – os extratos eletrônicos relativos a bens imóveis deverão, obrigatoriamente, ser acompanhados do arquivamento da íntegra do instrumento contratual, em cópia simples, exceto se apresentados por tabelião de notas, hipótese em que este arquivará o instrumento contratual em pasta própria”.

Reza o inciso que deverá ser aceita cópia simples dos instrumentos contratuais, salvo se os extratos forem apresentados pelo notário. Nesse caso, o notário receberá o instrumento perfeitamente formalizado, no original e com firmas reconhecidas? Qualificará o título? Poderá devolvê-lo com exigências?

Não há na lei qualquer indicação de que os extratos devam ser assinados pelas partes contratantes, intervenientes e testemunhas. O modelo de extratos, decalcado dos antigos borderaux do Registro de Imóveis do século XIX, eram encaminhados ao Oficial do Registro pelo Notário, que os subscrevia. Estes extratos deveriam servir de base para inscrição, prática que de fato não se consolidou, caindo em desuso – enfim, tratava-se de “uma perfeita inutilidade”[45]. Ressoando, como ecos desta discussão, resta apenas o vigente artigo 193 da LRP, que reza: “o registro será feito pela simples exibição do título, sem dependência de extratos…”.

O Provimento 149/2023, que instituiu o Código Nacional de Normas da Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça — Foro Extrajudicial (CNN/CN/CNJ-Extra), não previu o acesso do extrato. Certamente o fará nos esperáveis atos normativos que hão de vir a disciplinar o seu acesso (inc. VIII do caput do art. 7º da Lei 14.382/2022). Pela regra atual, são admitidos somente os títulos nato-digitais e digitalizados (com padrões técnicos), encaminhados eletronicamente para as unidades de Registro Imobiliário por intermédio do SERP. Nota bene: encaminhados aos ofícios, não depositados e mantidos na plataforma (art. 209 e art. 324 do dito Provimento).

Seja como for, o mais razoável, em face de todo o arcabouço do direito privado, será admitir que o “instrumento contratual”, quando apresentado por meios eletrônicos, deverá ser assinado por todas as partes, intervenientes e testemunhas, todos com firmas reconhecidas, porque assim o exige o renovado inciso II do art. 221 da LRP, seja para o exemplar arquivado nas Notas do Tabelião, que haverá de examinar a legalidade do título ao promover a confecção dos extratos, seja para o encaminhado diretamente pelo interessado (§ 4º do art. 6º da Lei), salvo, é claro, o exemplar arquivado pela instituição financeira em suas “pastas próprias”.

E assim voltamos, melancolicamente, ao velho extrato dos regulamentos do século XIX.

Instituições financeiras que atuem com o crédito imobiliário

Retornemos ao instrumento particular e ao disposto no § 5º do art. 221 da LRP. Pelo dispositivo, as “instituições financeiras que atuem com o crédito imobiliário” poderão celebrar instrumentos particulares com o caráter de escritura pública, dispensadas as testemunhas e o reconhecimento de firmas. Além disso, tais instituições poderão fazer uso das assinaturas eletrônicas nas modalidades avançada e qualificada, como previsto na Lei (art. 17-A da Lei 14.063/2020).

Já nos debruçamos sobre o plus representado pela adoção da assinatura avançada ou qualificada nos contratos de financiamento imobiliário: a regra revelou-se mais rigorosa do que a anterior, que dispensava, pura e simplesmente, qualquer modalidade de autenticação ou intervenção de terceiros fedatários nos contratos tradicionais[46]. Os instrumentos eram simplesmente subscritos pelas partes contratantes, sem qualquer outra medida autenticatória ou de reconhecimento de firmas. No balanceamento de riscos, optou-se pela segurança econômico-financeira, em detrimento da jurídica (escritura pública, reconhecimento de firmas etc.), filiando-se a uma tendência que já se inaugurara à época do advento do BNH, como se verá em detalhe logo abaixo.

A reforma da LRP em 2023 foi restritiva e o intérprete deve ajustar o foco no microssistema representado pelas “instituições financeiras que atuem com o crédito imobiliário”, sempre quando estiverem em causa os instrumentos particulares. Muito bem, quais são estas instituições?

O art. 8º da  Lei 4.380, de 21 de agosto 1964, e a Resolução BACEN 4.676, de 31/7/2018, indicam os agentes que atuam no crédito imobiliário e integram os microssistemas financeiros regulados e fiscalizados pelo Banco Central do Brasil. São eles: Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), Sistema de Financeiro da Habitação (SFH) e Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI), cada qual com suas especificidades, todos regulados e fiscalizados pelo Banco Central do Brasil[47].

No contexto da Lei 9.514/1997, poderão operar no SFI as “caixas econômicas, os bancos comerciais, os bancos de investimento, os bancos com carteira de crédito imobiliário, as sociedades de crédito imobiliário, as associações de poupança e empréstimo, as companhias hipotecárias e, a critério do Conselho Monetário Nacional – CMN, outras entidades” (art. 2º).

Parece que estão fora da exceção legal as operações de securitização e de seus meios de investimento e desintermediação – como os fundos de investimento FII, FIDCS, FIAFRO etc. As companhias securitizadoras não são instituições financeiras, nos termos do art. 18 da Lei 14.430/2022: são “instituições não financeiras constituídas sob a forma de sociedade por ações que têm por finalidade realizar operações de securitização”. Logo, não se acham abrangidos pela exceção criada pelo § 5º do art. 221 da LRP (“instituições financeiras”). A autorização e a regulação das companhias securitizadoras cabe à Comissão de Valores Mobiliários, CVM (art. 8º da Lei 6.385/1976). Além dos fundos, compete à CVM regular e fiscalizar bancos de investimento, clubes de investimento, sociedades corretoras e distribuidoras de títulos e valores mobiliários, agentes autônomos de investimentos, bolsas de mercadorias e de futuros, bolsas de valores etc.[48].

As operações de aquisição e oneração de bens imóveis, realizadas pelos administradores de fundos e congêneres, acham-se excluídas do favor concedido pela lei excepcionalmente às (a) entidades financeiras que atuam com o (b) crédito imobiliário, autorizadas a celebrar (c) instrumentos particulares com caráter de escritura pública.

Portanto, seus contratos devem ser celebrados por escritura pública. A exceção há de decorrer, sempre, de expressa disposição legal (como as CCI´s, cédulas de crédito, promessas de compra e venda e cessões, cauções, compra e venda e garantias reais no microssistema de consórcios (parágrafo único do art. 45 da Lei 11.795, de 8/10/2008) etc.

O aziago art. 38 da Lei 9.514/1997

Em vista dos ataques que o sistema notarial e registral vem sofrendo e que buscam converter em exceção o que, desde sempre, na tradição do Direito brasileiro, foi a regra – instrumentalização dos negócios jurídico-reais por escritura pública – é oportuno rever as posições assumidas anteriormente a respeito da dispensa da escritura pública notarial para algumas hipóteses controversas. É preciso, mais do que nunca, reafirmar a importância dos notários brasileiros e os chamados registros de direitos, a cargo de profissionais juristas que atuam nos registros públicos de imóveis.

O disposto no art. 38 da Lei 9.514/1997 é reconhecidamente problemático, tanto assim que sofreu várias modificações ao longo do tempo, variando, igualmente, a sua interpretação. Na 1ª Vara de Registros Públicos de São Paulo, por exemplo, se decidiria, num primeiro momento, que, para dispensa da escritura pública, seria necessário que um dos entes indicados no art. 2º da Lei 9.514/1997 participasse necessariamente do negócio jurídico, “até porque, como bem destacou o Oficial, tais agentes atuam como fiscal do ato de modo a assegurar a sua segurança, de forma similar ao que ocorre no SFH”[49].

Entretanto, esta orientação logo seria modificada pela Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo que decidiria em sentido diverso e em caráter normativo. Apreciando pedido formulado por entidade de classe, o Corregedor Geral de Justiça aprovaria parecer, de lavra do mesmo magistrado que havia decidido anteriormente pela negativa, do seguinte teor:

“Assim, se todos os contratos compreendidos na Lei nº 9.514/97 (ou resultantes da aplicação dela) podem ser lavrados por escritura pública ou instrumento particular com efeitos de escritura pública, e se nem todos os contratos previstos nessa lei são privativos das entidades que compõem o sistema financeiro, não há como vincular a utilização do instrumento particular apenas quando o negócio for lavrado por entidade integrante do SFI”[50].

Eu próprio havia me convencido de que a lei teria aberto a porta para o acesso, tout court, dos instrumentos particulares de alienação fiduciária no Registro Imobiliário[51], baseado nas iterativas decisões da Corregedoria Paulista e em parte da doutrina[52]. Porém, em vista da recente decisão do CNJ (da qual se tratará em outra oportunidade), permito-me reavaliar e abrir a discussão em face dos ponderosos argumentos expendidos no bojo do PCA 0000145-56.2018.2.00.0000[53], especialmente porque, como se pode constatar do pronunciamento público do Sr. Ministro Corregedor Nacional de Justiça, veiculado na 11ª sessão do CNJ, a Corregedoria Nacional de Justiça já se acha pronta para regulamentar a matéria em âmbito nacional[54].

Retomemos, pois, ao texto aziago do art. 38 da Lei 9.514/1997:

Art. 38. Os atos e contratos referidos nesta Lei ou resultantes da sua aplicação, mesmo aqueles que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis, poderão ser celebrados por escritura pública ou por instrumento particular com efeitos de escritura pública.

Já havia chamado o processo de reformas pontuais sucessivas do artigo 38 de “fábrica de absurdos”. A alusão a atos e contratos referidos na lei ou resultantes de sua aplicação, mesmo a constituição de direitos reais etc. esta formulação genérica não pode justificar, singelamente, a dispensa da escritura pública. Considerar que quaisquer atos e contratos, meramente referidos na lei – “mesmo aqueles que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis” – pudessem ser instrumentalizados por instrumentos particulares, tal interpretação soaria de fato excessivo. Tal transformaria a tradicional exceção em regra. Fosse assim e todo e qualquer ato ou contrato que tivesse por objeto direitos reais poderia ser formalizado por instrumento privado, bastando simplesmente ter sido referido na lei. A própria Lei 9.514/1997 alude a atos e contratos relativos a direitos reais em diversas passagens, v. g., hipoteca, cessão fiduciária de direitos creditórios, caução de direitos, alienação fiduciária de coisa imóvel (elenco do art. 17), anticrese (art. 17, § 3º), alienação fiduciária sobre bens enfitêuticos, direito de uso especial para fins de moradia, direito real de uso, propriedade superficiária (art. 22, § 1º, e seus incisos) etc.

Com base no exemplo representado pelo Decreto-Lei 70/1966, que previu que “todos” os atos nele previstos “poderão ser feitos por instrumento particular” (art. 26), poderemos chegar às mesmas conclusões consagradas há décadas: admitir-se que toda e qualquer hipoteca pudesse ser contratada por instrumento particular soaria, de fato, muito pouco razoável. E, de fato, jamais se entendeu assim. Tal exegese subverteria a tradição do direito brasileiro no mais alto grau. Até mesmo a arrematação, no caso de execução extrajudicial da alienação fiduciária (prevista na mesma Lei 9.514/1997), a alienação deve formalizar-se por escritura pública, na consideração de que os atos subsequentes à consolidação da propriedade ocorrem fora do contexto do financiamento imobiliário (art. 1º da Lei 9.514/1997). A arrematação, neste caso, não é “instrumento particular com força de escritura pública”, título hábil para ingresso no fólio registral, não se aplicando as regras do Dec.-Lei 70/1966, por força do disposto no inc. II do art. 39 da Lei 9.514/1997[55].

Instrumentos particulares com força de escritura pública

Os instrumentos particulares foram desde muito cedo admitidos no direito brasileiro. As regras exceptivas, previstas expressamente em lei, vêm sempre qualificadas com as seguintes expressões: instrumentos particulares “com caráter ou força de escritura pública”[56]. Desde há muito proliferam disposições legais assistemáticas, formando um quadro bastante confuso.

Nos alvores do BNH, ROBERTO CAMPOS, na exposição de motivos que encabeçou o projeto de lei que consagrou o instrumento particular, atribuindo-se-lhe o “caráter de escritura pública” (Lei 5.049/1996, que introduziu o § 5º da Lei do BNH), assim consignou na exposição de motivos:

“No art. 1º desse projeto de lei, são introduzidos dispositivos que visam simplificar o processo de registro de transação imobiliária, ou de contrato que onere a propriedade imóvel, desde que uma de suas partes seja o Banco Nacional da Habitação ou entidade que integre o Sistema Financeiro de Habilitação. A norma consagrada no art. 134 do Código Civil, de exigibilidade de escritura pública para os contratos de imóveis de determinado valor, visam objetivo da segurança jurídica e da realidade da operação. Quando, porém, uma das partes é um banco oficial ou entidade integrante do sistema nacional de crédito, tal cautela não se faz tão necessária, sendo, ademais, a segurança jurídica garantida pelo sistema de registro de imóveis, obrigatório em qualquer caso. Na verdade, em sendo parte no contrato órgão governamental ou entidade por ele fiscalizada, e levando-se em conta a imperiosa necessidade de se simplificar ao máximo as operações incluídas no Plano Nacional de Habitação, não há como manter exigências que impliquem uma duplicidade de garantias em prejuízo da rapidez dos negócios”[57].

A regra exceptiva mirava, essencialmente, o favorecimento dos adquirentes da casa própria e fomento do crédito imobiliário, financiamento da aquisição de moradia no microssistema das instituições integrantes do crédito imobiliário. Além disso, já se insinuava, ali, a ideia de que a segurança jurídica poderia ceder passo às garantias de caráter econômico e institucional[58]. Nasceria naquele contexto, igualmente, a figura do contrato estereotipado, modelo que inspirou a repristinação dos extratos eletrônicos em São Paulo (§ 1º do art. 60 da Lei 4.380/1964).

Além da segurança econômica que as instituições financeiras do crédito imobiliário provêm – entes  regulados e fiscalizados pelo Banco Central do Brasil – há outro aspecto: a medida visa estimular a aquisição da moradia e o faz pela concessão de crédito alavancado por meio de recursos oriundos de fontes estatais. Por essa razão, criaram-se condições favorecidas para a contratação e registro de tais contratos. No caso de escrituras e dos registros públicos, os emolumentos são fixados por lei – e não estabelecidos unilateralmente pela parte mais forte na relação contratual. Buscou-se o justo equilíbrio entre os interesses envolvidos – de um lado, o agente financeiro e longa manus do Estado na gestão de recursos públicos, de outro o adquirente dependente do crédito imobiliário para aquisição da sua moradia[59].

Neste contexto, o aspecto de tutela consumerista se vê claramente estampada na disposição do art. 63 da Lei 10.931/2004:

“Art. 63. Nas operações envolvendo recursos do Sistema Financeiro da Habitação e do Sistema Financeiro Imobiliário, relacionadas com a moradia, é vedado cobrar do mutuário a elaboração de instrumento contratual particular, ainda que com força de escritura pública”.

A letra da lei remanesce perdida no cipoal normativo que trata da matéria, à míngua de sanção pelo descumprimento da regra por agentes do mercado imobiliário. O Colégio Notarial do Brasil dispõe de pesquisa em que se demonstra, de modo convincente, que os custos dispendidos com a escrituração privada, malgrado o fato da vedação legal, são superiores aos valores cobrados pelos notários para a celebração da escritura pública[60].

Os interesses e direitos dos consumidores de imóveis oriundos de parcelamentos e incorporações imobiliárias, prestamistas no financiamento imobiliário, são amiúde desrespeitados, podendo ocorrer, eventualmente, abuso de poder econômico por parte de agentes do mercado que buscam a obtenção de vantagens indevidas, o que deve ser obviado.

Por fim, houve o veto ao parágrafo único do art. 17-A da Lei 14.063/2020, supressão importante a merecer transcrição das razões de veto:

“A proposição legislativa, ao incluir o parágrafo único no art. 17-A da Lei nº 14.063, de 23 de setembro de 2020, disporia que, nos contratos preliminares de negócios imobiliários em que fosse parte alienante a loteadora ou a incorporadora, poderia ser usada assinatura eletrônica avançada, aprovada pelo Operador Nacional do Sistema Eletrônico de Registros Públicos, e qualificada, nos termos do disposto na Lei.

Em que pese a boa intenção do legislador, a proposição legislativa contraria o interesse público ao restringir o rol de assinaturas eletrônicas passíveis de uso e impor custos desnecessários aos processos de financiamento imobiliário sem acarretar benefícios tangíveis ao Programa Minha Casa, Minha Vida, uma vez que a legislação vigente e os instrumentos já adotados para validação de documentos e processos proporcionam segurança jurídica na utilização de assinatura eletrônica para celebração de contratos em diferentes setores”[61].

O objeto da Lei 14.063/2020 era o Programa Minha Casa, Minha Vida e a previsão de dispensa das formalidades exigidas dos instrumentos administrativos utilizados para formalizar os negócios jurídicos-imobiliários já se acha bem assentada e consagrada. Parece lógico que o favor não devesse se estender aos negócios imobiliários relativos a parcelamentos e incorporações privados – justamente neste contexto em que os interesses do consumidor carecem de maiores cuidados e atenção.

Instrumentos administrativos

Os instrumentos particulares, com “força ou caráter de escritura pública”, são, portanto, um numerus clausus e as suas regras devem se coordenar com os incisos e parágrafos do art. 221 da LRP.

Já os títulos administrativos – que não deixam de ser, afinal, instrumentos “públicos” (inc. V do art. 221 da LRP) – ingressam igualmente no Registro de Imóveis sem o rigor exigido dos instrumentos particulares em geral. Eis aqui um pequeno rol, não exaustivo, dos títulos que ingressam no Registro de Imóveis com a dispensa da atuação notarial:

  1. Processo de ratificação das concessões e alienações de terras devolutas na Faixa de Fronteiras (parágrafo único do art. 5º do Dec.-Lei 1.414/1975; § 5º do art. 2º da Lei 14.004/2020;
  2. Termos, contratos e títulos de domínio expedidos pelo INCRA relativos a terras públicas federais (§ 2º do art. 5º do Dec.-Lei 2.363/1987;
  3. Bens de domínio da União (art. 2º da Lei 9.636/1998);
  4. Fundo de Arrendamento Residencial (art. 8º da Lei 10.188/2001);
  5. Programa de Subsídio à Habitação de interesse social – PSH (art. 5º da Lei 10.998/2004);
  6. Concessão de direito real de uso (inc. I do art. 48 do Estatuto da Cidade);
  7. Cessão da posse nos parcelamentos populares (§ 3º do art. 26 da Lei 6.766/1979) etc.

Todas essas modalidades excepcionam a regra da escritura pública ou da notarização dos instrumentos pelo reconhecimento das firmas, e o fazem de maneira expressa.

SERP – o hub registral

O art. 3º da Lei 14.382/2022 indica que o SERP tem por objetivo promover o intercâmbio de documentos eletrônicos e de informações entre as serventias dos registros públicos e os usuários em geral, “inclusive as instituições financeiras e as demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil e os tabeliães”.

Uma leitura ligeira poderia levar o intérprete a considerar que, além das instituições financeiras que atuam com o crédito imobiliário, outras instituições financeiras poderiam interagir com os registradores pela via do SERP, encaminhando, aos registradores imobiliários, instrumentos particulares sem as exigências formais acima indicadas.

A interpretação lógica e sistemática da lei haverá de nos levar a outra ordem de considerações e conclusões. A interação com o SERP poderá se dar entre todos os arrolados no dispositivo, é fato, mas nem todos estarão legitimados para se forrarem às exigências formais da escritura pública ou da notarização dos instrumentos particulares. Fosse assim e os “usuários em geral” poderiam lavrar instrumentos com “caráter de escritura pública” com dispensa das testemunhas e do reconhecimento de firmas das partes – como se pretende que o seja em relação às demais instituições financeiras. Insista-se: não é o fato de que o SERP possa servir de ponte entre o interessados e as unidades de Registro de Imóveis que se permitiria a dispensa dos requisitos legais exigidos dos títulos apresentados a registro. O SERP não “autentica” títulos ou quaisquer documentos, nem se presta a arquivar (“registrar” em sentido lato) quaisquer títulos ou documentos destinados expressamente ao ofício imobiliário. O SERP pode servir de portal colaborativo para compartilhamento de recursos humanos e tecnológicos pelos registradores imobiliários[62], mas não pode assimilar atribuições próprias dos agentes delegados.

A ideia malograda – por não ter sido contemplada na lei – de criação da CNG (Central Nacional de Gravames), ou do chamado Repositório Confiável de Documentos Eletrônicos – RCDE – que, segundo a mesma ABRAINC, deveria “ser implantado no mesmo prazo de implantação do SERP e disponibilizado como um sistema do ONR”[63], é uma boa ideia decalcada da experiência paulista, mas que se viu completamente desvirtuada na dita lei. Este organismo poderá acolher documentos como quitação e liberação de garantia (TQLG), termo de recebimento de valor (TRV),  documentos para averbação de titularidade de crédito decorrentes de alterações societárias, procurações públicas ou particulares etc.[64]. Muitos destes documentos, quando assinados com certificados da ICP-Brasil, poderão ser depositados em qualquer repositório, público ou privado, ou encaminhado diretamente às serventias imobiliárias. O prazo de validade de procurações, por exemplo, exigirá a expedição de uma nova certidão pelos notários. Porque não incrementar os canais de interoperabilidade entre as especialidades (“b”, inc. VII, art. 3º)?

Quando se apreciam os modelos norte-americanos, Reino Unido, Nova Zelândia, Austrália, Singapura etc., em que efetivamente se adotaram modelos eficientes e adequados de registros eletrônicos (não inteiramente livres de problemas), nos convencemos do quão distantes ficamos desses objetivos em razão de reforma que se revelou açodada e improvisada. O CNJ terá diante de si um desafio hercúleo para extrair uma ideia sistemática de dispositivos contraditórios da Lei 14.382/2022.

O Provimento CNJ 149/2023 e os títulos digitalizados com “padrões técnicos”

O advento da reforma da LRP deve nos levar igualmente a reconsiderar o disposto no Provimento CNJ 94/2020 (art. 4º), texto afinal reproduzido nos arts. 209 e 324 do Provimento CNJ 149/2023.

Como sabemos, o provimento 94, de 2020, foi baixado no curso da pandemia do COVID-19 e dispensou o preenchimento de certas formalidades, franqueando-se o acesso de títulos públicos e privados ao Registro de Imóveis por plataformas eletrônicas. Porém, o advento da Lei 14.620, de 13 de julho de 2023, vem de reafirmar a exigência de observância de requisitos formais obrigatórios para os títulos inscritíveis – especialmente pelos instrumentos particulares – e estes são os principais documentos digitalizados que são encaminhados aos Cartórios de Registro de Imóveis.

Passada a fase aguda da pandemia, e malgrado o fato da superveniência da dita lei, a regra ainda se mantém na redação atual do Código Nacional de Normas da Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça – Foro Extrajudicial (CNN/CN/CNJ-Extra). Ei-la:

Art. 209. Todos os oficiais de registro e os tabeliães poderão recepcionar os títulos nato-digitais e digitalizados com padrões técnicos, que forem encaminhados eletronicamente para a unidade do serviço de notas e registro a seu cargo e processá-los para os fins legais.

(…)

§ 2.º Consideram-se títulos digitalizados com padrões técnicos, aqueles que forem digitalizados em conformidade com os critérios estabelecidos no art. 5.º do Decreto n. 10.278, de 18 de março de 2020.

(…)

Art. 324. Todos os oficiais dos registros de imóveis deverão recepcionar os títulos nato-digitais e digitalizados com padrões técnicos, que forem encaminhados eletronicamente para a unidade a seu cargo, por meio das centrais.

 § 2.º Consideram-se títulos digitalizados com padrões técnicos aqueles que forem digitalizados de conformidade com os critérios estabelecidos no art. 5.º do Decreto n. 10.278, de 18 de março de 2020.

Não nos deteremos na apreciação dos requisitos dos títulos nato-digitais e nas demais hipóteses previstas nos incisos do parágrafo primeiro do artigo 209 do CNN/CN/CNJ-Extra. Interessa-nos, aqui, unicamente os chamados títulos digitalizados com padrões técnicos em conformidade com o art. 5º do Decreto 10.278/2020.

Em face da ocorrência de um maior número de instrumentos particulares, deles cuidaremos, mas as conclusões se aplicam às demais modalidades de títulos e documentos digitalizados e encaminhados a registro.

O Decreto 10.278/2020 – marco do governo digital

Antes de mais nada deixo consignado que não considero que o Decreto 10.278/2020 possa aplicar-se tout court à atividade notarial e registral. Manifestei-me anteriormente no sentido de que o Decreto Federal se restringiria tão-somente às hipóteses relacionadas ao âmbito da administração – “pessoas jurídicas de direito público interno, ainda quando envolva relações com particulares” (inc. I, art. 2º do Decreto 10.278/2020).

Trata-se da gestão de interesses pessoais do cidadão em face do próprio Estado (e mesmo estritamente, entre os privados – letra “b”, inc. II do art. 2º do Decreto 10.278/2020)[65]. O cidadão, a partir da Lei 13.874/2019, poderia “arquivar qualquer documento por meio de microfilme ou por meio digital, conforme técnica e requisitos estabelecidos em regulamento, hipótese em que se equiparará a documento físico para todos os efeitos legais e para a comprovação de qualquer ato de direito público” (inc. X do art. 3º da Lei 13.874/2019). A propósito, já anteriormente deixei consignado o seguinte:

“O documento, assim digitalizado, poderá ser, segundo a regra, equiparado a documento físico para todos os efeitos legais (art. 5º)[66]. Entretanto, note-se, neste dispositivo, que a oração anterior se articula com a conjunção ‘e’, ligando-a a outro período, qual seja: ‘comprovação de qualquer ato perante pessoa jurídica de direito público interno’ – vale dizer: União, Estados, Distrito Federal e Territórios, além dos Municípios, autarquias, associações públicas e as demais entidades de caráter público criadas por lei (art. 41 do CC). É evidente que a norma se preordena à veiculação de interesses próprios e individuais de cidadãos perante a administração pública (art. 9º do Decreto Federal 9.094 2017)”[67].

Além disso, o art. 5º do Decreto acha-se subordinado à epígrafe – “Requisitos na digitalização que envolva entidades públicas”, circunscrevendo o âmbito de sua aplicação à própria administração.

A regra do Decreto nº 10.278/2020 se aplicaria à equiparação dos documentos digitalizados aos físicos, mas não chegou ao ponto de conferir autenticidade ao documento físico convertido digitalmente em ordem à sua registração, i.e., não conjugou as necessárias assinaturas de todos as partes contratantes e testemunhas com o crivo de inequívoca autenticidade e integridade do instrumento. A questão se torna especialmente delicada quando são desconhecidos a matriz e o processo de digitalização de tais documentos – salvo quando apresentado pelo próprio cidadão ao agente público, que o confere e o atesta, para os devidos fins e sob sua estrita responsabilidade (art. 9º do Decreto Federal 9.094/2017). Uma vez mais avulta o aspecto do relacionamento do cidadão com o Estado.

A digitalização entre particulares acha-se prevista no art. 6º e admite “qualquer meio de comprovação da autoria, da integridade e, se necessário, da confidencialidade de documentos digitalizados”. O documento será válido, “desde que escolhido de comum acordo pelas partes ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento”. Ou seja, todos devem formalizar, pelos meios admitidos e reconhecidos em lei, a concordância acerca da eleição da modalidade escolhida. No caso de inexistência de acordo prévio entre as partes, aplica-se o disposto no art. 5º, a sugerir que todos os firmantes devam assinar com a assinatura eletrônica qualificada (inc. I do art. 5º do Decreto). Enfim, isto nada mais é do que prefiguração das modalidades de assinaturas eletrônicas previstas na Lei 14.063, de 23 de setembro de 2020, com todas as limitações ali previstas para a contratação imobiliária.

O quadro legal aplicável aos instrumentos particulares apresentados a registro é inteiramente diverso. O regulamento teve em mira o disposto no inciso X do art. 3º da Lei nº 13.874/2019 e o art. 2º-A da Lei nº 12.682, de 9 de julho de 2012. Apontei que o dito Decreto deve ser interpretado com as delimitações contidas expressamente na própria Lei 13.874/2019, por ele regulamentada. Novamente, esta condiciona a eficácia do disposto no inciso X do caput do art. 3º às seguintes hipóteses, in verbis:

“Art. 18 A eficácia do disposto no inciso X do caput do art. 3º desta Lei fica condicionada à regulamentação em ato do Poder Executivo federal, observado que:

I – para documentos particulares, qualquer meio de comprovação da autoria, integridade e, se necessário, confidencialidade de documentos em forma eletrônica é válido, desde que escolhido de comum acordo pelas partes ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento; e

II – Independentemente de aceitação, o processo de digitalização que empregar o uso da certificação no padrão da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) terá garantia de integralidade, autenticidade e confidencialidade para documentos públicos e privados”.

Parece bastante claro que a regra não se aplica ao registro de atos “de transferência e de registro de bens imóveis” (inc. IV, § 2º do art. 5º da Lei 14.063/2020) pelas razões extensamente desenvolvidas anteriormente[68]. Ainda que o método fosse “escolhido de comum acordo pelas partes”, não se pode colher previamente a aceitação pela pessoa a quem poderá ser oposto o documento, já que a eficácia do registro se estende erga omnes.

Ainda que se admita que a firma eletrônica qualificada possa garantir a “integralidade, autenticidade e confidencialidade para documentos públicos e privados”, não pode mais do que garantir a autoria do próprio agente de digitalização, não de terceiros, eventuais partes contrastantes e intervenientes no negócio jurídico.

Devemos sempre nos lembrar que o inc. X do art. 3º da Lei 13.874/2019 visou tutelar os direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, de poder “arquivar qualquer documento por meio de microfilme ou por meio digital, conforme técnica e requisitos estabelecidos em regulamento, hipótese em que se equiparará a documento físico para todos os efeitos legais e para a comprovação de qualquer ato de direito público”. A pessoa física natural ou jurídica, no resguardo de seus próprios interesses pessoais pode servir-se de mecanismo de produção prévia de prova em seu benefício na relação com o Estado. Assim, seus documentos, digitalizados e assinados, poderão ser arquivados em meios digitais e servirão para “comprovação de qualquer ato de direito público” (inc. X do art. 3º). Não calha neste inciso a tutela dos interesses das partes e intervenientes numa típica relação de contratação privada imobiliária.

Ainda que se admita o acesso de tais documentos, é preciso, ainda, reconhecer que os chamados “requisitos técnicos” dos títulos, exigíveis para ingresso na tábula, devem subordinar-se aos processos de digitalização segura, conforme se verá logo abaixo.

A regra que impera o acesso dos instrumentos particulares ao Registro de Imóveis exige o preenchimento dos requisitos previstos no inc. II do art. 221 da LRP. Não há como se forrar à exigência legal. Definitivamente, não se aplica o dito Decreto 10.278/2020 aos títulos registráveis que devem ser apresentados perante o Oficial de Registro de Imóveis de acordo com as prescrições formais da lei.

Original e cópia – o papel do representante digital

Grassa imensa confusão entre o que seja representante digital (digital surrogate) e original dos títulos, consoante regras bem estabelecidas na comunidade acadêmica e no âmbito do próprio CONARQ. Já tive oportunidade de destacar o aspecto distintivo desta figura:

“Visto com bastante atenção, o representante digital (digital surrogate), previsto no Decreto 10.278/2020, originado de eventual instrumento registrável, não deixará de ser, afinal, mero documento, portanto prova eventual. Uma coisa que representa outra, mas sem a virtude de produzir os mesmos efeitos que o ordenamento prevê – seja como forma essencial ou como prova pré-constituída em ordem a promover a mutação jurídico-real pela inscrição. Uma mera cópia de original (ou de outra cópia) obviamente não se torna, ela mesma, um original”[69].

O Conselho Superior da Magistratura mantém o entendimento de que as cópias de títulos não merecem ingresso no Registro de Imóveis, nem servem para fundamentar o processos de dúvidas, que nesta hipótese são julgadas prejudicadas[70]. Não é concebível que alguém possa “autenticar” no balcão dos cartórios uma cópia simples de um título qualquer, ainda que o apresentante esteja perfeitamente identificado perante o Oficial do Registro. Não será o fato de a operação ocorrer no âmbito dos meios eletrônicos que o resultado poderá ser diferente. Cópia não é título hábil a merecer o ingresso no Registro de Imóveis[71].

Além disso, à míngua de regramento técnico e normatização acerca da gestão documental no âmbito do extrajudicial, ficamos sem referências para a constituição e tratamento adequado do repositório eletrônico das serventias. O art. 3º da Lei 8.159/1991, define a gestão documental como “o conjunto de procedimentos e operações técnicas referentes à sua produção, tramitação, uso, avaliação e arquivamento em fase corrente e intermediária, visando a sua eliminação ou recolhimento para guarda permanente”[72].

O CNJ estabeleceu diretrizes e normas aplicáveis aos órgãos do Poder Judiciário por meio da Resolução CNJ 469/2022. Neste ato administrativo, definiram-se vários conceitos relativos à gestão documental – ato de digitalização, documentos em suas modalidades digital, digitalizado, nato-digital; metadados, avaliação e definição de prazos de guarda e destinação, classificação dos documentos de acordo com um plano de classificação, indexação e taxonomia etc. No mesmo ato normativo, encontramos a especificação dos processos pelos quais se produzem os documentos digitalizados e como se realiza a sua gestão internamente.

Nada disso há no âmbito do extrajudicial. À míngua de regulamentação, surgem algumas dúvidas: o que são e como se coordenam os metadados[73] com os sistemas de gestão documental das Serventias? Como serão mantidos os títulos no acervo do cartório? Como serão recebidos e gerenciados no âmbito do SERP? (inc. VIII do art. 3º da Lei 14.382/2022). Como dar certidão dos títulos digitalizados e registrados (art. 18, in fine, da LRP)? Quais os critérios para classificação de tais documentos? Como estabelecer a tabela de temporalidade dos documentos baseados nos critérios arquivísticos que não ainda existem?

Resolução CONARQ 48/2021

O Decreto Federal 10.278, de 18 de março de 2020, no qual se apoiaram os Provimentos CNJ 94/2020 e 149/2023 (entre outros) foi especificado pela Resolução CONARQ 48, de 10 de novembro de 2021[74]. Entre os requisitos exigidos para a validade (lato sensu) dos documentos digitalizados “com padrões técnicos”, exigem-se:

a) plano de classificação de documento arquivísticos (PCDA) e tabela de temporalidade de documentos arquivísticos (TTDA); 

b) regras de acesso e procedimentos de tratamento de informações com restrição de acesso; 

c) sistema informatizado que atenda a requisitos arquivísticos de gestão de documentos; 

d) repositório digital confiável que permita a manutenção/preservação do representante digital desde sua captura pelo sistema informatizado de gestão, pelo tempo necessário. 

O próprio Decreto 10.278/2020 estabelece que, dentre os metadados de registro do representante digital, estão o código de classificação, prazos de guarda e destinação, reclamando, portanto, a existência de um PCDA e de uma TTDA, simplesmente inexistentes no Extrajudicial. Segue o Manual do CONARQ:

“De uma forma geral, o representante digital produzido a partir do processo de digitalização dos documentos originais deve ser submetido às regras de gestão de documentos, a começar pelo uso do PCDA e da TTDA que devem constar do registro dos metadados mínimos previstos no Decreto nº 10.278/2020. É imprescindível que, ao ser capturado para o sistema em que será gerenciado, o representante digital possua todos os demais metadados requeridos pelos sistemas informatizados que farão a gestão e preservação na instituição produtora, para além daqueles mínimos obrigatórios previstos pelo decreto”[75].

Sem esta especificação preliminar, não tem sentido, absolutamente, exigir-se a indicação de metadados nos títulos enviados a registro. O usuário não sabe o que informar, o registrador não sabe o que examinar. Estabelece-se uma relação de surdos-mudos e o repositório digital dos cartórios tende a converter-se paulatinamente numa construção babélica.

As centrais de serviços compartilhados dos estados e o Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (ONR) têm recepcionado os títulos digitalizados pelos privados, encaminhando-os às serventias para a prática dos atos correspondentes. Entretanto, o que se tem adotado é a recepção de representantes digitais sem comprovação de integridade, autenticidade, autoria dos instrumentos e das partes contratantes, intervenientes e das testemunhas, isto é, sem os requisitos pré-estabelecidos na LRP para validade e eficácia de tais instrumentos. Tal exigência foi reforçada pela Lei 14.650/2023.

Os documentos digitalizados fora dos sistemas internos de gestão podem ocasionar problemas relacionados a sua autenticidade. Não são títulos aptos a produzir os efeitos previstos em lei, mas meras cópias. Novamente, calha a citação de GEORGE FUECHSEL – “garbage in, garbage out”, literalmente: “lixo entra, lixo sai”. O fetichismo tecnicista, de cariz positivista, leva ainda hoje muitos registradores a considerarem que a simples digitalização, como que por encanto, purgaria os instrumentos privados de todos os vícios, saneando-os de nulidades ou outros defeitos. O fato é que, uma vez registrados estes documentos, seus efeitos (ou defeitos) irradiam-se erga omnes.

Um aspecto importante e que merece destaque é a definição do órgão ou instância encarregada de digitalização do título apresentado a registro no microssistema do Decreto 10.278/2020. O processo de digitalização de títulos encaminhados ao registro ocorre fora dos organismos criados e fiscalizados pela autoridade pública. Não há qualquer controle sobre a produção dos documentos digitalizados. Nada se sabe além do representante digital, firmado tão somente pelo autor da digitalização. Original é um documento volante que terá existido nalgum momento e do qual remanesce apenas notícias reveladas pela cópia digital.

No caso da administração, admite-se que os documentos originais possam ser digitalizados dentro ou fora da instituição produtora. No caso de ser produzida externamente, os processos de digitalização podem ser executados através de uma UTDE – Unidade Técnica de Digitalização Externa, que deve possuir “equipe qualificada, espaço físico, equipamentos especializados e infraestrutura”, segundo as recomendações e diretrizes do CONARQ[76]. No caso dos Registros de Imóveis, poderiam ser considerados e aproveitados os núcleos acessórios instrumentais, especificamente o SAEC do SREI[77]. Mas tudo isso depende de regulamentação.

Além da taxonomia e requisitos formais dos títulos digitalizados, o processo de digitalização, para que se adequem às diretrizes do Decreto 10.278/2020, deve observar a classificação prevista na Lei 8.159/1991. Já apontamos que os documentos recepcionados, gerados ou mantidos no acervo dos Registros Públicos, seja em que meio for, são reputados documentos de preservação permanente, assim definidos no § 3º do art. 7º da Lei 8.159/1991. Livros, títulos, documentos, papeis etc. (art. 22 e seguintes da LRP c.c. art. 46 da Lei 8.935/1994), bancos de dados e até mesmo microfilmes  – todos se enquadram na espécie de documentos de preservação permanente; eles não podem ser descartados[78]. O mesmo CONARQ adverte:

“Outra questão que deve ser observada, em todos os fluxos, é a digitalização dos documentos considerados permanentes nas TTDAs da instituição produtora. Como disposto no Decreto nº 10.278/2020, embora possam ser digitalizados, visando, por exemplo, viabilizar a produção e a tramitação de seu representante digital, seus originais não podem ser descartados”[79].

Gestão documental do extrajudicial e o papel da CN-CNJ

É imperiosa a necessidade de regulamentação da gestão documental no âmbito das Serventias Extrajudiciais. Um passo inaugural foi dado ainda na gestão da Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA com o advento da Portaria CN-CNJ 12/2022, de 10.2.2022. Por este ato administrativo, criou-se a Comissão Permanente de Gestão Documental, Preservação Digital e Memória no âmbito do Foro Extrajudicial – CGDEX. Entre os objetivos e atribuições do órgão achavam-se: (a) elaborar e submeter à Corregedoria Nacional de Justiça propostas de regulamentação de procedimentos de gestão e preservação documental do serviço extrajudicial; (b) propor e apoiar a realização de treinamento de servidores e magistrados que atuam nas Corregedorias Gerais da Justiça dos Estados e do Distrito Federal, bem como promover a capacitação de serventuários das diversas especialidades, em questões relacionadas à gestão documental, preservação digital e memória no Foro Extrajudicial; (c) fomentar a preservação da memória, no que diz respeito a livros de registros públicos e notas dotados de relevante valor histórico e cultural para a sociedade brasileira; e (d) outros assuntos de interesse da atividade notarial e registral relacionados à gestão documental e à preservação da memória.

Apesar de constituída a CGDEX (Portaria CN-CNJ 19/2022), não houve tempo hábil para a realização dos trabalhos e apresentação de resultados. Os ditos atos normativos não foram expressamente revogados, embora os indicados para compor a CGDEX tenham colocado a indicação à disposição do novo Corregedor Nacional de Justiça, para que pudesse livremente indicar quem lhe aprouvesse.

Além disso, no âmbito do mesmo CNJ, houve iniciativas pioneiras em que se aprofundaram as questões relacionadas com a gestão documental das serventias extrajudiciais, como a criação da Comissão Especial para Gestão Documental do Foro Extrajudicial, conforme aprovação do Plenário do Conselho Nacional de Arquivos – CONARQ (60ª reunião ordinária, 8/12/2010), pela Portaria CN-CNJ 94, de 21.12.2010[80].

No final de 2019, em São Paulo, realizou-se Prova de Conceito do Sistema de Registro de Imóveis Eletrônico, para cujo evento foram convidados registradores, magistrados do CNJ, juristas, cientistas e especialistas em teoria da informação e comunicação[81]. Naturalmente, a questão da gestão documental do extrajudicial foi ali apreciada.

Em conclusão, pode-se dizer que muito se fez, porém muito mais precisa ser feito para que os cartórios de registro de imóveis do país estejam aptos e capacitados para recepcionar títulos eletrônicos, processar e promover a gestão documental, com a criação de repositórios eletrônicos confiáveis.


Notas

[1] Sobre as distinções entre registro de direitos e registro de títulos, v.  ALIENDE RIBEIRO. Luís Paulo. Registro Imobiliário, contrato, organização social e fortalecimento institucional. In Revista de Direito Imobiliário n. 60, 2006, p. 30; ARRUÑADA. Benito. Organização do Registro da Propriedade em países em desenvolvimento. In Revista de Direito Imobiliário n. 56, 2004, p. 139 et seq. JARDIM. Mónica. Os sistemas registrais e a sua diversidade. In Revista Argumentum, v. 21, n. 1, 2020, Jan.-abr. 2020, p. 437 et seq. Hoje até mesmo o Land Registry do Reino Unido guarda muitas similaridades com o nosso sistema.

[2] O Projeto SREI desenvolve-se desde a década passada. Ao longo do tempo, muitos obstáculos foram vencidos, mas a orientação institucional sempre esteve presente. A prova de conceito pode ser vista aqui: https://near-lab.com/2020/02/14/poc-srei/.

[3] A lei modelo da UNCITRAL, diz ROCHA PINTO E SILVA, apresenta um estilo “muito detalhado” o que leva a “excessos”, o que tornaria, segundo ele, “impossível a adoção direta no Brasil”. O diagnóstico é realista, tanto mais que o dito modelo subverte o eixo sobre o qual repousa toda a dogmática notarial e registral, de cariz latino. SILVA. Fábio Rocha Pinto e. Garantia das Obrigações. São Paulo: IASP ed., 2017, p. 788.

[4] JACOMINO. Sérgio. Extratos, títulos e outras notícias pequenas digressões acerca da reforma da LRP (Lei 14.382/2022. NALINI. J. Renato, org. Sistema Eletrônico de Registros Públicos. São Paulo: Forense, 2022, p. 369, passim.

[5] Os arts. 6º da Lei 14.382/2022 é expressão desta tentativa imperfeita. V. SILVA. Fábio Rocha Pinto e. in ABELHA. André. CHALHUB. Melhim. VITALE. Olivar. Sistema Eletrônico de Registros Públicos. São Paulo: Forense, 2022, p. 37 passim. A origem da iniciativa se pode ver aqui: Dinamização do crédito – índice. São Paulo: Observatório do Registro, 2020, acesso: https://cartorios.org/2020/09/29/dinamizacao-do-credito-indice/.

[6] UNCITRAL. Legislative Guide on Secured Transactions. New York: UN, 2010, p. 151, n. 12.

[7] Loc. cit. p. 47, n. 70.

[8] Sobre o modelo centralizado – “rápido e de baixo custo” – v. JACOMINO. S. Vésperas do SERP – uma ideia fora do lugar – Parte I. São Paulo: Migalhas Notariais e Registrais. 29.5.2023, acesso: https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-notariais-e-registrais/387308.

[9] UNCITAL. Loc. cit. p. 152,n. 16.

[10] DIP. Ricardo. O Registro Público – ser ou deixar de ser, eis a questão. In. NALINI. José Renato. Sistema Eletrônico de Registros Públicos: comentado por notários, registradores, magistrados e profissionais. São Paulo: Forense, 2023, p. 306.

[11] DIP. Ricardo. As causas da fé notarial. São Paulo: Lepanto, 2022, p. 66-7. V. igualmente a propalada CNG – Central Nacional de Gravames in ABELHA. André. CHALHUB. Melhim. VITALE. Olivar, op cit.  p. 27, n. 4.

[12] JACOMINO. Sérgio. MP 1.085 e o Monstro de Horácio. São Paulo: Migalhas Notariais e Registrais, 9.3.2022. Acesso: https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-notariais-e-registrais/361041/mp-1-085-e-o-monstro-de-horacio. Vide também: JACOMINO. Agonia central – ou anomia registral? São Paulo: Observatório do Registro, 23/10/2021, acesso: https://cartorios.org/2021/10/23/agonia-central-ou-anomia-registral/.

[13] JACOMINO. Sérgio. MP 1.085 e o Monstro de Horácio. São Paulo: Migalhas Notariais e Registrais, 9/3/2022. Acesso: https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-notariais-e-registrais/361041/mp-1-085-e-o-monstro-de-horacio.

[14] JACOMINO. Sérgio. MP1.162/2023 – A reforma da reforma da reforma. In Extratos, Títulos e Outras Notícias Pequenas Digressões acerca da Reforma da LRP (Lei 14.382/2022. NALINI. J. Renato, org. Sistema Eletrônico de Registros Públicos. São Paulo: Forense, 2022, p. 379.

[15] A tendência já despontava no STJ. No julgamento do Resp. n. 1.495.920/DF, o tribunal havia reconhecido a possibilidade de mitigação da formalidade das testemunhas instrumentárias nos contratos eletrônicos, quando houvesse o preenchimento de requisitos mínimos acerca da autenticidade e segurança da assinatura digital aposta pelas partes contratantes (REsp 1.495.920/DF, j. 15/5/2018, DJe 7/6/2018). O curioso é que se tratava de documento assinado eletronicamente com certificados de uma empresa que já não existe ou que foi banida da internet…

[16] É parte das obrigações das Autoridades Certificadoras: “manter contrato de seguro de cobertura de responsabilidade civil decorrente das atividades de certificação digital e de registro, com cobertura suficiente e compatível com o risco dessas atividades, e exigir sua manutenção pelas ACs de nível subsequente ao seu, quando estas estiverem obrigadas a contratá-lo, de acordo com as normas do CG da ICP-Brasil”. V. ICP-Brasil. Requisitos Mínimos para as Declarações de Práticas de Certificação Das Autoridades  Certificadoras da ICP-BRASIL. DOC-ICP-05, versão 5.5, 17.4.2020. Acesso: https://www.gov.br/iti/pt-br/central-de-conteudo/doc-icp-05-v-5-5-req-min-para-as-dpc-pdf.

[17] Sobre o sistema de título e modo e, especialmente, acerca da natureza especial dos instrumentos que acedem ao registro, v. JACOMINO. Sérgio. SERP – havia uma pedra no caminho. São Paulo: Migalhas Notariais e Registrais. 9/1/2023. Acesso: https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-notariais-e-registrais/379632/serp–havia-uma-pedra-no-caminho.

[18] Por todos: SERPA LOPES. Miguel Maria de. Tratado, Vol. I, 4ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1960, p. 26-7.

[19] ALMEIDA JR. João Mendes de. Direito Judiciário Brasileiro. 3ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1940, p. 194.

[20] O representante digital (digital surrogate) é a “representação em formato digital de um documento originalmente não digital. É uma forma de diferenciá-lo do documento de arquivo natodigital”. A definição se acha em Glossário – Documentos Arquivísticos Digitais. Conselho Nacional de Arquivos – CONARQ. Câmara Técnica de Documentos Eletrônicos – CTDE, 2020, 8ª rev. V. JACOMINO. Assinaturas Eletrônicas e a Lei 14.382/2022 – parte III. Breves anotações e sugestões para sua regulamentação. São Paulo: Migalhas Notariais e Registrais, 2023, acesso: https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-notariais-e-registrais/382380/assinaturas-eletronicas-e-a-lei-14-382-2022–parte-iii.

[21] Não se desconhece o estranho fenômeno de produção de originais de originais. A partir da matriz nato-digital, assinada com certificados da ICP-Brasil, p. ex., pode-se gerar tantos originais quantas forem suas cópias. “É mais um desses paradoxos”, sentencia o Dr. ERMITÂNIO PRADO, “são como eunucos que não se procriam, mas se reproduzem”.

[22] Processo CG 131.428/2012, São Paulo, parecer de 15/4/2013 de ANTÔNIO CARLOS ALVES BRAGA JR., aprovado na mesma data, DJ: 24/04/2013. Corregedor Geral JOSÉ RENATO NALINI. Acesso: http://kollsys.org/gsk.

[23] Art. 7º, inc. VIII da Lei 14.382/2022: Caberá à Corregedoria Nacional de Justiça do CNJ “a definição do extrato eletrônico previsto no art. 6º desta Lei e os tipos de documentos que poderão ser recepcionados dessa forma”.

[24] No Processo CG 131.428/2012 previu-se que em relação aos instrumentos particulares produzidos pelos agentes financeiros do SFH, SFI e companhias de habitação da Administração Pública bastaria que “apenas um extrato seja encaminhado a registro, em substituição aos contratos, que deverão permanecer arquivados pelo emissor”. (Processo CG 131.428/2012, parecer de 15/4/2013 subscrito por ANTONIO CARLOS ALVES BRAGA JUNIOR aprovado pelo des. JOSÉ RENATO NALINI em 15/4/2013, Dje de 24/4/2013, acesso: http://kollsys.org/gsk. O parecer deu arrimo ao Provimento CG 11/2013, de 16/4/2013, Dje 17/4/2013, Des. JOSÉ RENATO NALINI, acesso: http://kollsys.org/fp7.

[25] Provimento CG 5/2023, de 1/3/2023, Dje 2/3/2023, Des. FERNANDO ANTÔNIO TORRES GARCIA. Acesso: http://kollsys.org/sia.

[26] V. excertos para debates internos da especificação do SREI/ONR. JACOMINO. Sérgio. Interessado e apresentante na vigente LRP. São Paulo: Observatório do Registro, 2021. Acesso: https://wp.me/p6rdW-3gT.

[27] O § 1º do art. 246 reclama legítimo interesse consumação do ato de averbação da mutação do estado civil e do objeto da matrícula. Já o art. 250 aludirá a interessado e partes para o cancelamento de registro. Até mesmo a suscitação de dúvida, nos termos dos incisos V e VI do art. 198 da LRP, alterado.

[28] “O rogado registro stricto sensu (omissis) realmente tem de ser indeferido, porque a apelante, que o pedira, não possui interesse jurídico na sua feitura” (…). “E não se afirme que o art. 217 da Lei n. 6.015/1973 (de 31-12), redigido em termos amplos, lhe concederia tal faculdade. Nesse dispositivo lex dixit magis quam voluit, ficou expresso mais do que se queria significar: ali, de fato, a construção qualquer pessoa está por qualquer interessado, como faz ver a circunstância de que, logo a seguir, o texto tem de explicitar a legitimidade rogatória dos atos gratuitos (cf. art. 218), o que não faria sentido, se na disposição anterior realmente não estivesse dito que a rogação depende de interesse – como, note-se, está no inc. II do art. 13 da própria Lei de Registros”. RICARDO DIP, voto convergente. Ap. Civ. 1090261-29.2016.8.26.0100, São Paulo, j. 15/8/2017, Dje 30/8/2017, Rel. Des. Manoel de Queiroz Pereira Calças. Acesso: http://kollsys.org/l5p

[29] ABRAINC. Sugestões para a regulamentação da Lei 14.382/22: registro por extrato e assinatura eletrônica. 15.1.2023. Acesso no site do Conselho Nacional de Justiça. https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2022/12/associacao-brasileira-de-incorporadoras-imobiliarias-abrainc.pdf. [mirror].

[30] Idem, p. 10, n. 24.

[31] Idem, p. 3.

[32] Idem, p. 3, n. 7.

[33] STF: “O Estado responde, objetivamente, pelos atos dos tabeliães e registradores oficiais que, no exercício de suas funções, causem dano a terceiros, assentado o dever de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa, sob pena de improbidade administrativa.” RE 842846/SC, Tema 777/STF.

[34] “Art. 22. Os notários e oficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus prepostos causem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos.”

[35] Aos tabeliães de notas compete com exclusividade: reconhecer firmas e autenticar cópias (incs. IV e V do art. 7º da Lei 8.935/1994.

[36] Idem, p. 3, n. 7.

[37] Esta questão foi debatida no âmbito do encontro fechado – Documentos eletrônicos – o admirável mundo novo das plataformas digitais, promovido pelo NEAR-lab., 19.9.2023. Sem uma conclusão definitiva entre os registradores presentes, defendeu-se que somente os interessados indicados nos incisos III e IV (notários e instituições financeiras que atuem no crédito imobiliário) poderão usar o mecanismo de extratos. O fato de que § 4º do art. 6º da Lei aluda a “instrumento contratual” deixa de fora todas as modalidades do caput do art. 6º (atos, fatos e negócios…). Além disso, foi unânime a conclusão de que este tema deverá ser objeto de cuidadosa regulamentação pelo CNJ, atentos ao período “quando cabível” do caput do art. 6º e do inciso  VIII do caput do art. 7º da Lei 14.382/2022.

[38] O inc. VIII reza: “O Serp tem o objetivo de viabilizar: (…)  VIII – o armazenamento de documentos eletrônicos para dar suporte aos atos registrais”.

[39] O CONARQ nos traz uma definição bastante sintética, porém não muito precisa: “Informação registrada, codificada em forma analógica ou em dígitos binários, acessível e interpretável por meio de um equipamento eletrônico”. CONARQ. Glossário – Documentos Arquivísticos Digitais, 8ª ver., 2020, p. 24. Acesso: https://www.gov.br/conarq/pt-br/assuntos/camaras-tecnicas-setoriais-inativas/camara-tecnica-de-documentos-eletronicos-ctde/glosctde_2020_08_07.pdf. Não se fez ali clara distinção entre formas analógica e digital, já que a primeira pode ser acessível diretamente por humanos, além das máquinas. Já a informação digital, é constituída por “dígitos ou unidades discretas, ou seja, por unidades que se manifestam separadamente”, como na sequência binária. Sobre as distinções, v. PIGNATARI. Décio. Informação – Linguagem – Comunicação. 10ª ed. São Paulo: Ed. Cultrix, 1981, p. 18, n. 1.6 (Digital e analógico). Por fim, não é a “informação” que é registrada e codificada, pois dados não são informação que não é proclamação jurídica de situações jurídicas. JACOMINO. Sérgio.  Publicidade Registral Imobiliária e a LGPD. São Paulo: Observatório do Registro, 30.3.2021, acesso: https://cartorios.org/2021/03/30/publicidade-registral-imobiliaria-e-a-lgpd/.

[40] JACOMINO. Sérgio. SERP – havia um pedra no caminho. São Paulo: Migalhas Notariais e Registrais, 9.1.2023. V. especialmente Insegurança jurídica entra – insegurança jurídica sai. Acesso: https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-notariais-e-registrais/379632/.

[41] Os documentos eletrônicos assinados na modalidade avançada devem ser previamente aceitos e “admitidos pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento” (inc. II do art. 4º da Lei 14.063/2020. “O caráter excepcional de admissão da assinatura avançada permite sua utilização no caso de as partes (ou a pessoa a quem for oposto o documento) aceitarem-na antecipadamente. O prévio acordo entre as partes – ou a falta de impugnação daquele contra quem foi produzido o documento, ou em relação a quem seus efeitos se produzirão – gera a autenticação, nos termos dos incisos II e III do art. 411 do CPC”. JACOMINO. Sérgio. Assinaturas eletrônicas e a lei 14.382/2022 – Parte I – Breves anotações e sugestões para sua regulamentação. São Paulo: Migalhas Notariais e Registrais, 17.2.2023. Acesso: https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-notariais-e-registrais/381782.

[42] NERY. Nelson. NERY. Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 17ª, ed. 2018 p. 655, n. 4, comentário ao art. 195 do CPC, passim.

[43] Processo CG 100.217/2022, São Paulo, decisão de 16/1/2023, Dje 16/1/2023, Des. Fernando Antônio Torres Garcia. Acesso: http://kollsys.org/so7. No r. parecer, o Dr. JOSUÉ MODESTO PASSOS recobrou artigo de nossa autoria: JACOMINO, Sérgio, Lei n. 14.382/22. SERP e a função pública delegada, Migalhas, 2022, disponível em https://www.migalhas.com.br/arquivos/2022/8/DE43FAD7996827_SERP.pdf.

[44] CARVALHO SANTOS. J. M. Código Civil Brasileiro Interpretado. Vol. III, 14ª ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1991, p. 190 e 191, passim. Vide JACOMINO. Sérgio. Oficina notarial e registral: Instrumento particular. Título inscritível – Certidão de RTD. São Paulo: Migalhas Notariais e Registrais, 9.11.2022. Acesso: https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-notariais-e-registrais/376718/.

[45] PEREIRA. Lafayette Rodrigues. Direito das Cousas. 2ª ed. Rio de Janeiro: Jacintho Ribeiro dos Santos, 1905, p. 589, nota 9. LACERDA DE ALMEIDA. Francisco de Paula. Direito das Cousas. Rio de Janeiro: J. Ribeiro dos Santos, Vol. II, 1903, p. 334, § 184.

[46] JACOMINO. Sérgio. MP 1.162/2023 – a reforma da reforma da reforma. In NALINI. José Renato. Sistema Eletrônico de Registros Públicos. Comentado por notários, registradores, magistrados e profissionais. São Paulo: Forense, 2022, p. 380.

[47] Vide art. 8º da Lei 4.380/1964, Resolução BACEN 4.676, de 31/7/2018. No site a seguir são indicadas as instituições que integram ou são reguladas pelo BC: https://www.bcb.gov.br/meubc/encontreinstituicao.

[48] CAMINHA. Uinie. Securitização. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 12.

[49] Processo 1ª VRPSP 0006136-24.2011.8.26.0100, j. 11/5/2011, Dje 30/5/2011, Dr. Gustavo Henrique Bretas Marzagão. Acesso: http://kollsys.org/dz6.

[50] Processo CG 131.428/2012, São Paulo, decisão de 7/3/2014, Dje 19/3/2014, Corregedor Geral Des. ELLIOT AKEL. Acesso: http://kollsys.org/h2c. Mais tarde, a mesma orientação se manteria: Processo CG 049648-26.2012.8.26.0002, São Paulo, decisão de 20/7/2016, Dje 11/8/2016. Corregedor Geral MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS JUNQUEIRA. Acesso: http://kollsys.org/jh5. Por requisição do CNJ, a CGJSP responderia no Processo CG 83.376/2018, São Paulo, dec. de 5/6/2018, Dje 8/6/2018, Corregedor Geral, GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO. Acesso: http://kollsys.org/ly2.

[51] JACOMINO. Sérgio. A qualificação registral dos instrumentos particulares de alienação fiduciária. In Revista de Direito Imobiliário n. 76, 2014.

[52] JUNQUEIRA. José de Mello. Alienação fiduciária de bem imóvel. In Boletim Eletrônico do IRIB # 360, 23.8.2001.

[53] PCA 0000145-56.2018.2.00.0000, Minas Gerais, j. 8/8/2023, Dje 10/8/2023, Rel. Mário Goulart Maia. Acesso: http://kollsys.org/t40

[54] Vide gravação da 11ª Sessão Ordinária de 2023 do CNJ, realizada a 8 de agosto. Acesso: https://wp.me/p6rdW-3gB.

[55] V. Processo 1VRPSP 1047827-49.2021.8.26.0100, São Paulo, j. 24/6/2021, Dje 28/6/2021, Dra. Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad. Acesso: http://kollsys.org/qg3.

[56] A primeira vez que a expressão ocorre na legislação brasileira parece ter sido no bojo do Decreto 21.499 de 9/6/1932 (art. 12) com a criação de livros de registro de contratos “com força de escritura pública”.

[57] Exposição de Motivos 13/66, datado de 9/2/1966, PL 3.500/1966, subscrito por ROBERTO DE OLIVEIRA CAMPOS, Ministro Extraordinário para o Planejamento e Coordenação Econômica, e que redundou na Lei 5.049/1996 que alterou o § 5º do art. 61 da Lei 4.380/1964.

[58] Os exemplos em que a segurança econômica suplanta a segurança jurídica são conhecidos, por exemplo, nos casos do parcelamento do solo urbano. V. Ap. Civ. 1000025-84.2018.8.26.0480, Presidente Bernardes, j. 4/4/2019, Dje 30/4/2019, Rel. Des. Geraldo Francisco Pinheiro Franco. Acesso: http://kollsys.org/n8m. Ap. Civ. 1000036-33.2018.8.26.0539, Santa Cruz do Rio Pardo, j. 12/11/2018, Dje 30/11/2018, Rel. Des. Geraldo Francisco Pinheiro Franco. Acesso: http://kollsys.org/mhv.

[59] No casos dos tabelionatos de notas, a Tabela de Emolumentos prevê inúmeros benefícios em favor de adquirentes – p. ex. o item 2.6 das notas explicativas anexas à Tabela do Tabelionato de Notas (Lei 11.331/2001). No Registro Imobiliário a regra vem estampada no art. 290 da LRP.

[60] O Colégio Notarial do Brasil, em parceria com a Fundação Getúlio Vargas, realizaram pesquisa em que se busca demonstrar as vantagens não só econômicas, mas na proteção e tutela dos interesses dos consumidores. A publicação dos resultados do trabalho acha-se no prelo.

[61] Mensagem 326, de 13/7/2023. Acesso: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2023-2026/2023/Msg/Vep/VEP-0326-23.htm.

[62] V. o excelente voto do Min. DIAS TOFFOLI demonstrou que a política pública de compartilhamento de recursos entre os registradores “visou implementar um caminho mais racional e, ao mesmo tempo, menos oneroso para a implantação daqueles serviços eletrônicos determinados na lei, uma vez que a esse tempo eles já eram um imperativo legal, ex vi das disposições da Lei Federal 11.977/2009 citada”. PP 0003703-65.2020.2.00.0000, Minas Gerais, j. 23.6.2020, rel. Min. Humberto Martins. Acesso: http://kollsys.org/p2e.

[63] ABRAINC, op. cit. p. 16, n. 42. Note-se aqui a barafunda criada pela lei. O texto fala do RCDE disponibilizado pelo ONR, indicando como fundamento o inc.  VIII do art. 3º da Lei nº 14.382, que trata do SERP.

[64] O rol acha-se detalhado no documento da ABRAIN cit. p. 16.

[65] JACOMINO. Sérgio. Assinaturas Eletrônicas e a Lei 14.382/2022 – parte III. Breves anotações e sugestões para sua regulamentação. São Paulo: Migalhas Notariais e Registrais. 3.3.2023, citado anteriormente.

[66] “Art. 5º  O documento digitalizado destinado a se equiparar a documento físico para todos os efeitos legais e para a comprovação de qualquer ato perante pessoa jurídica de direito público interno”.

[67] Idem, ibidem.

[68] JACOMINO. Sérgio. Assinaturas Eletrônicas e a Lei 14.382/2022 – parte II. Breves anotações e sugestões para sua regulamentação. São Paulo: Migalhas Notariais e Registrais, 28.2.2023. Acesso: https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-notariais-e-registrais/382149/assinaturas-eletronicas-e-a-lei-14-382-2022–parte-ii.

[69] JACOMINO. Sérgio. Assinaturas Eletrônicas e a Lei 14.382/2022 – parte III. Breves anotações e sugestões para sua regulamentação. São Paulo: Migalhas Notariais e Registrais. 3.3.3023, citado anteriormente.

[70] Ap. Civ. 1019062-61.2021.8.26.0361, São Paulo, j. 10.3.2023, Dje 10.5.2023, Rel. Des. Fernando Antônio Torres Garcia. Acesso: http://kollsys.org/sr1.

[71] No bojo do Processo CG 73.931/2010, São Paulo, decisão de 8.10.2010, Des. ANTONIO CARLOS MUNHOZ SOARES ficou consignado: “Quanto à inadmissibilidade de meras cópias é firme a jurisprudência da Corregedoria Geral da Justiça (Processos CG 2009/24761, 2008/108173, 2008/100534, 2008/87737). No mesmo sentido o entendimento do Conselho Superior da Magistratura (Apelação nº 17-6/0, Rel. Des. Luiz Tâmbara, j. 7.11.03; Apelação nº 7.120-0/9, Rel. Des. Sylvio do Amaral, j. 1º.6.87)”. Acesso: http://kollsys.org/dlt.

[72] V. artigo 2º, inciso I, da Resolução CNJ 324/2020: “I – Gestão Documental como o conjunto de procedimentos e operações técnicas referentes à produção, à tramitação, ao uso, à avaliação e ao arquivamento de documentos e processos recebidos e tramitados pelos órgãos do Poder Judiciário no exercício das suas atividades, inclusive administrativas, independentemente do suporte de registro da informação”.

[73] Metadado: Dado estruturado, que permite classificar, descrever e gerenciar documentos e processos (inc. VIII, art. 2º, da Resolução CNJ 469 de 31.8.2022. V. inc. II do art. 3º do Decreto 10.278/2020.

[74] Ato publicado em 11/11/2021, ed. 212, Seção 1, p. 152 do Diário Oficial da União. Ministério da Justiça e Segurança Pública. Arquivo Nacional. Conselho Nacional de Arquivos. Acesso: https://www.gov.br/conarq/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/Diretrizes_digitalizacao__2021.pdf

[75] CONARQ. Diretrizes para a digitalização de documentos de arquivo nos termos do decreto 10.278/2020.  Câmara Técnica Consultiva do CONARQ sobre a técnica e os requisitos para a digitalização de documentos. Rio de Janeiro, 2021, p. 10.

[76] Idem, ibidem, especialmente item 2.2.

[77] O Min. DIAS TOFFOLI qualificava de modo lapidar: os recursos instrumentais “são meras ferramentas de trabalho que podem ser compartilhadas, por simples questão de racionalidade, adequação, eficiência e economicidade. É isso apenas” (CNJ. PP 00003703-65.2020.2.00.0000). Acesso: https://www.kollemata.com.br/36879.html.

[78] No caso de microfilmes, v. art. 13 do Decreto 1.799/1996. No caso dos registros públicos, há previsão de armazenamento dos instrumentos e documentos no SERP, nos termos do inc. VIII do art. 3º da Lei 14.382/2022. Além disso, os artigos 22 e seguintes da LRP, combinados com o artigo 36 da Lei 8.935/1994 estabelecem a responsabilidade dos oficiais pela guarda e conservação dos documentos apresentados.  Os “livros, fichas, documentos, papéis, microfilmes e sistemas de computação deverão permanecer sempre sob a guarda e responsabilidade do titular de serviço notarial ou de registro, que zelará por sua ordem, segurança e conservação”. Vide JACOMINO. Sérgio. CRUZ. Nataly. Gestão documental no Registro de Imóveis. A reforma da LRP pela Lei 14.382/2022. In Revista de Direito Imobiliário: RDI, São Paulo, v. 45, n. 93, p. 13-45, jul./dez. 2022.

[79] Idem, ibidem.

[80] O dossiê com todos os documentos, vídeos, palestras etc. sobre o tema pode ser acessado aqui: https://folivm.com.br/conarq/.

[81] POC – Prova de Conceito do SREI. Realizado a 1.12.2019, organizado pelo NEAR-lab – Laboratório do Núcleo de Estudos Avançados do Registro de Imóveis eletrônico. O documentário do evento pode ser conhecido aqui: https://near-lab.com/2020/02/14/poc-srei/.

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