Notários na mira

José Serra

José Serra

O Governador Serra é um homem inteligente e sério. Custa crer que possa ter cedido a uma campanha que pode representar simplesmente uma fraude à boa fé dos nossos concidadãos. Falo especificamente da decretação do fim da autenticação e reconhecimento de firmas no âmbito da administração pública estadual.

Essa recidiva governamental lembra a patética intentona do então deputado federal José Roberto Batochio, que visava extirpar a atuação notarial do sistema jurídico pátrio, iniciativa manejada de forma tão inepta que um grande jurista não hesitou em qualificá-la de “teratologia jurídica”. Confiram, aqui mesmo, o post Cartoriobrás.

Pobre Batochio, sua reputação jurídica, a partir daí, se viu comprometida. Ainda o vi, tempos depois, buscando apoio para sua reeleição na Anoreg… requiescat in pace!

A iniciativa do Governo é cínica. “Uma besteira”, registrará na Folha de São Paulo, aliás com bastante realismo, Paulo Tupinambá Vampré.

Ok, tudo muito bom, tudo muito bem; decretemos então o fim do reconhecimento de firma, mas que tal fazer o caminho inverso?

Pense bem: para os privados, o simples reconhecimento de firma pode aliviar o contratante de sofrer com as fraudes endêmicas neste pobre país. Caso ocorram – e sempre ocorrem! – a responsabilidade civil é do notário que reconheceu autenticamente a firma. Nenhum seguro neste e em qualquer outra parte é tão barato e efetivo como este. E paga-se uma só vez.

Mas e o outro lado da moeda? O alegado Custo Brasil se alimenta vorazmente de outro tipo de certificação. É aquela que, para qualquer transação entre privados, o Estado interpõe uma certidão negativa de débitos.

Tente abrir uma empresa, por exemplo. Ou alienar um bem. Experimente obter um crédito hipotecário… A sociedade rende um ônus pesadíssimo a essa extravagância que é a “legitimação” estatal por meio de certificação administrativa.

Esse é o verdadeiro câncer burocrático que vitima o país há décadas.

Pense bem, caro leitor. Não atuamos num mercado ideal, onde as transações ocorrem livres de fraudes e oportunismo. Ao romper certas barreiras preventivas, damos ocasião à inoculação do germe da patologia jurídica no corpo da administração pública. A fraude, nos seus estágios avançados, movimentará a máquina judiciária (§ 3º do art. 2º), com enorme custo para o cidadão.

Somos uma nação que ainda não consegue divisar que é a sociedade que sempre acaba pagando a conta.

Decreto Nº 52.658, de 23 de janeiro de 2008.

Introduz medidas desburocratizantes na recepção de documentos no âmbito da Administração Pública do Estado de São Paulo

JOSÉ SERRA, Governador do Estado de São Paulo, no uso de suas atribuições legais,

Decreta:

Artigo 1º – Fica vedada, na recepção de documentos por órgãos e entidades da Administração direta, autárquica e fundacional, a exigência de reconhecimento de firmas ou de autenticação de cópias.

Artigo 2º – O disposto no artigo 1º deste decreto não se aplica quando haja determinação legal expressa em sentido contrário.§ 1º – Na hipótese de que trata o “caput” deste artigo, o servidor deverá proceder ao cotejo, respectivamente, com a cédula de identidade do interessado ou com o respectivo documento original e, somente se houver dúvida fundada, exigirá o reconhecimento da firma ou a autenticação da cópia.

§ 2º – Eventual exigência do servidor será feita por escrito, motivadamente, com a indicação do dispositivo legal em que ela está prevista e da razão específica da dúvida, presumindo-se, caso não o faça, que não considerou necessário o atendimento da formalidade.

§ 3º – Verificada a qualquer tempo a ocorrência de fraude ou falsidade em prova documental, reputar-se-ão inexistentes os atos administrativos dela resultantes, cumprindo ao órgão ou entidade a que o documento tenha sido apresentado expedir a comunicação cabível ao órgão local do Ministério Público.

Artigo 3º – As Secretarias de Estado, as autarquias e as fundações instituídas ou mantidas pelo Estado:

I – manterão em local visível e acessível ao público relação atualizada das hipóteses, pertinentes aos respectivos âmbitos de atuação, em que há determinação legal expressa de reconhecimento de firmas ou de autenticação de cópias;

II – divulgarão o conteúdo deste decreto em seus sítios eletrônicos, na Rede Mundial de Computadores – Internet.

Artigo 4º – O disposto neste decreto aplica-se, no que couber, às empresas em cujo capital o Estado tenha participação majoritária e às demais entidades direta ou indiretamente controladas pelo Estado.

Parágrafo único – Os representantes da Fazenda do Estado nas entidades mencionadas no “caput” deste artigo e o Conselho de Defesa dos Capitais do Estado – CODEC, da Secretaria da Fazenda, adotarão, em seus respectivos âmbito de atuação, as medidas que se fizerem necessárias ao cumprimento das normas ora editadas.

Artigo 5º – Este decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Palácio dos Bandeirantes, 23 de janeiro de 2008.

3 comentários sobre “Notários na mira

  1. É. O Serra ficou bem na foto.
    Se até o centro de SP há o tal continuísmo na engavetação dos contratos, imagine então como a coisa não campeia país afora…

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