
A Folha de São Paulo de hoje (2/11/2010, p. A4), em reportagem de Fernanda Odilla, traz importante informação a respeito do crescimento nas taxas de aquisição de imóveis por estrangeiros em todo o país.
Segundo a reportagem, em menos de três anos houve um crescimento do fenômeno em todo o território nacional, em razão dos grandes atrativos que o país oferece aos investidores estrangeiros.
A questão que nos chama a atenção – à parte o incremento nas aquisições – é a existência de uma minuta de projeto que aumenta o controle na aquisição de terras brasileiras por estrangeiros. Segundo a Folha, a última versão já se acha pronta no Palácio do Planalto, pendente de exame de alguns detalhes pela AGU – Advocacia Geral da União.
O projeto, além de tratar da delicada questão dos terrenos de marinha e de territórios de fronteira, visa a aumentar as exigências burocráticas para a aquisição, a fim de combater os “laranjas”.
Aqui entram os Registros de Imóveis e seus Oficiais.
Cadastro e Registro
O controle de aquisição de imóveis rurais por estrangeiros, nas condições estabelecidas pela Lei, deve ser feita pelos Registros de Imóveis, com base em um registro de feição cadastral.
O quadro normativo que serve de referência para a matéria é a Lei 5.709, de 7 de outubro de 1971 e seu regulamento, Decreto 74.965, de 26 de novembro de 1974. Da primeira se extrai o seguinte:
Art. 10 – Os Cartórios de Registro de Imóveis manterão cadastro especial, em livro auxiliar, das aquisições de terras rurais por pessoas estrangeiras, físicas e jurídicas, no qual deverá constar:
I – menção do documento de identidade das partes contratantes ou dos respectivos atos de constituição, se pessoas jurídicas;
II – memorial descritivo do imóvel, com área, características, limites e confrontações; e
III – transcrição da autorização do órgão competente, quando for o caso.
Art. 11 – Trimestralmente, os Cartórios de Registros de Imóveis remeterão, sob pena de perda do cargo, à Corregedoria da Justiça dos Estados a que estiverem subordinados e ao Ministério da Agricultura, relação das aquisições de áreas rurais por pessoas estrangeiras, da qual constem os dados enumerados no artigo anterior.
O primeiro aspecto a ser considerado é a curiosa disposição de criação de um “cadastro especial”, consubstanciado em um livro extraordinário, que se lavraria a latere do registro ordinário a cargo dos Oficiais competentes. A regra se repete no Decreto Regulamentador.
Não deixa de ser curioso e muito relevante o fato de criação de elementos cadastrais no Registro de Imóveis, recuperando antigas ideias defendidas por Afrânio de Carvalho que havia, 24 anos antes, apresentado um projeto de lei instituindo justamente o cadastro ao lado do livro fundiário. Vale a pena a citação e a indicação do projeto:
houve em 1947 uma tentativa de reforma do Registro de Imóveis, mediante a instituição do livro fundiário e do cadastro, mas, inserida em capítulo de Lei Agrária, malogrou, porque não teve andamento no Congresso Nacional o projeto oficial, de minha autoria, para ali remetido pelo Presidente Eurico Gaspar Dutra em 1948 (Diário Oficial de 15 de janeiro de 1948). Conquanto ao editar-se e pôr-se em prática o Código Civil o cadastro fosse considerado inexeqüível no Brasil, em 1948 deixara de sê-lo graças ao aparecimento da aerofotografia para substituir os meios convencionais, motivo pelo qual o projeto logrou, nessa parte, pleno apoio do Conselho Nacional de Geografia, onde, no decorrer de uma conferência, lhe fiz a justificativa”. (Registro de Imóveis. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1982, p. 10 esp. nota 9).
A lei obrigaria a comunicação às Corregedorias Estaduais “relação das aquisições de áreas rurais por pessoas estrangeiras”, mas o controle efetivo da aquisição de imóveis rurais por estrangeiros deveria ser feito pelos Cartórios, com base em elementos cadastrais.
O objetivo da lei era assegurar o controle nacional, já que a soma das áreas rurais pertencentes a pessoas estrangeiras não poderiam ultrapassar um quarto da superfície dos municípios (art. 12 da citada lei). Além disso, as pessoas da mesma nacionalidade não poderiam ser proprietárias, em cada município, de mais de 40% do limite fixado (1/4 da superfície).
O Decreto 74.965, de 1974, é bastante claro:
Art. 5º A soma das áreas rurais pertencentes a pessoas estrangeiras, físicas ou jurídicas, não poderá ultrapassar 1/4 (um quarto) da superfície dos Municípios onde se situem comprovada por certidão do Registro de Imóveis, com base no livro auxiliar de que trata o artigo 15. (g.n.)
Registro Eletrônico
Os Registros Prediais deveriam soltar-se das referências estruturantes que se arrimam em índices básicos (indicadores pessoal e real) e avançar na modelagem de um verdadeiro Registro Eletrônico, como preconizado pela Lei 11.977, de 2009 (art. 36 e seguintes), onde cada variável que articula o discurso narrativo do sistema registral há de ganhar um tratamento sistemático.
No ambiente das mídias eletrônicas, o controle de aquisição de imóveis rurais por estrangeiros se torna perfeitamente controlável. Em primeiro lugar, porque cada informação de caráter variável (e a nacionalidade é um campo importante – cfr. art. 176 da Lei 6.015, de 1973) merece um tratamento na base de dados.
Com essa nova modelagem estruturante, será possível todo tipo de combinatória para se chegar a respostas confiáveis e precisas – como, p. ex., a resposta instantânea à pergunta “quantos cidadãos de nacionalidade tal adquiriram imóvel rural no município X no interregno Y”…
Além disso, é absolutamente necessário estabelecer conexões com os cadastros do INCRA, cumprindo, assim, os ditames da Lei 10.267, de 2001 que alterou a Lei que trata do Sistema Nacional de Cadastro Rural (Lei 5.868, de 12 de dezembro de 1972).
Ao final, é necessário integrar, em um amplo sistema de GIS (Geographic Information System) todos os cartórios, compartilhando dados com a administração pública – INCRA, Receita Federal, FUNAI, IBGE etc.
A chave para a interconexão de todo o sistema já está dada: é o CNIR – Cadastro Nacional de Imóveis Rurais, que precisa ganhar impulso no desenvolvimento de padrões de interoperabilidade do sistema fundiário brasileiro e não deve ser esquecido no projeto que está em fase de discussões preliminares no Governo Federal.
O Registro Imobiliário deve ser ouvido para aportar sua fundamental e original contribuição para os debates, já que o sistema registral, em nosso país, desempenha um papel essencial na aquisição da propriedade imobiliária.
* Imagem gerada a partir da obra do artista Gabriel Lema.
Por mais que não fosse usado, o sistem estava higido até que um determinado parecer o desmontou.
Agora estamos fadados a descobrir, se isso for possível, como ocorreu e quantos são os registros irregulares do parecer para cá.
Seria o caso de um mega cancelamento administrativo (isso me lembra ilha comprida) para fazer valer a lei atual, não no direito positivo, mas em medida administrativa, onde não poder-se-ia proibir a aquisição, mas seria possível e plenamente permitido, conta permiitido controlar os novos proprietários e os imóvei adquiridos.
Fica, porém, uma interrogação: Como ficam as posse nessa nova ordem? Terá o registro de imóveis que controlar o que for registrador pelos RTDs. Seria o caso de uma nova DOI, federalizada?
Deve-se levar em conta o fato de que as autoridades públicas não possuem hoje qualquer estrutura para implementação das regras que a lei determina, criando assim uma insegurança jurídica inadmissível em um Estado de Direito.
Hoje, um investidor estrangeiro que deseje seguir à risca os preceitos da Lei e a interpretação do novo parecer da AGU, não consegue fazê-l,o pois não há um procedimento claro a ser seguido.
Única alternativa assim e procurar outras formas jurídicas de evitar as limitações previstas em lei, seja por instrumentos societários ou contratuais, não abarcados pela nova regulamentação.