Ou locupletamo-nos todos…

A temperatura subiu no plenário do STF na sessão de 15/2/2006, quando os ministros Marco Aurélio e Cezar Peluso embrenharam-se numa diatribe que, editada pelos zelosos escrivães da corte, ainda assim dá o tom das controvérsias jurídicas. Jurídicas ma non troppo.

Meio a contragosto divulguei a íntegra do acórdão que foi publicado no DJ de 9/6 (ADI 3132/SE – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – DJ 9/6/2006), pois ele fecha uma audiência pública instaurada pelo Irib. Afinal, Roma locuta, causa finita. (http://www.irib.org.br/notas_noti/indiceaudienciaX.asp).

Mas a muitos de nós a decisão causou um mal-estar. Lá pelas tantas, Sua Excelência o ministro Marco Aurélio, confessando-se pouco simpático à modelagem do serviço notarial e registral no Brasil, sentenciou: “Penso haver algo discrepante do que podemos assentar como provido de razoabilidade, tendo em conta, ante um serviço público – ressalto – obrigatório, que titulares cheguem a perceber, por mês, quinhentos, seiscentos, um milhão de reais. No entanto, isso não é argumento para deixar de dar eficácia ao texto primitivo da Constituição de 1988”.

Imediatamente me veio à mente a frase atribuída ao Barão de Itararé, o jornalista Aparício Torelly: “ou restaura-se a moralidade, ou locupletemo-nos todos”.
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É que muitos de nós, notários e registradores – diria que a esmagadora maioria, pouco menos do que a totalidade – recebemos muito menos do que o alvitrado pelo Sr. Ministro. Muitos já estavam se alistando no rol generoso do Sr. Ministro: “locupletemo-0nos todos”.

Ironias à parte, o vezo de julgar a regra pela exceção é um mal juízo. A leitura atenta da interlocução ministerial levar-nos-ia a conclusões paradoxais. Por exemplo, de que a aviação civil deveria ser proibida pela queda de algumas aeronaves. Podemos assentar que esse juízo seria “provido de razoabilidade”.

É certamente deprimente testemunhar um colóquio tão arrevezado instaurado na mais alta corte do país. Tal fato nos dá a medida da necessidade de esclarecer nossos julgadores, apontando o caminho virtuoso.

O tabeliado não morre. Jamais!

um pitoresco julgamento em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, empolga os debates jurídicos no Brasil. Discussões jurídico-metafísicos, se preferirem.

Desde a defesa de uma tese de doutoramento, sustentando os direitos autorais de uma obra psicografada, nunca vi por estas plagas uma discussão tão bizarra.

Trata-se do seguinte: uma carta psicografada foi utilizada em um Júri no município de Viamão, Região Metropolitana de Porto Alegre – o que gerou grande polêmica na Justiça gaúcha. A discussão foi motivada pela decisão que absolveu uma mulher suspeita de mandar matar o tabelião local. Diz a nota publicada no insuspeito Estadão: para buscar a absolvição da acusada, o advogado de defesa “usou, entre outros argumentos, uma carta supostamente ditada pelo morto em um centro espírita da Capital”.

Temos estudado as reminiscências medievais do tabeliado português na atividade notarial brasileira, sustentando a perenidade da instituição. Com a nótula jornalística descobri que, mais profundamente do que imaginamos, a fé pública notarial, mesmo ditada além-túmulo, acaba rendendo uma credibilidade inesperada. Francamente!

Para saber detalhes:
http://www.estadao.com.br/ultimas/cidades/noticias/2006/mai/30/393.htm
http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2006/05/354646.shtml
http://www.debrasilia.com/index2.php?pag=ver_noticia&cod_noticia=4300