RTD – um registro da modernidade

O Registro de Títulos & Documentos nasceu em 1903 (Lei 973, de 2/jan/1903) e de lá para cá esteve equilibrando-se perigosamente entre grandes galáxias originadas do big-bang notarial, prestes a cair no buraco negro da irrelevância.

Uma tarde dessas, como as há na vida de qualquer pessoa – e que a memória registra em forma de rostos empalidecidos, frases estúpidas e desconexas, carros buzinando raivosamente lá fora, o ar condicionado que atiça a rinite, o carpete decadente do Hotel Othon – numa tarde dessas, faz muito tempo (lá pelos idos de 1992, creio eu), ouvi, arrebatado, uma palestra de Ricardo Dip falando para surdos sobre a importância do RTD. Joeirava o hoje desembargador do TJ de São Paulo a tese de que a singularidade do RTD se construia negativamente: o registro residual, não endereçado a qualquer outro ofício, faria a fortuna do RTD.
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Ou locupletamo-nos todos…

A temperatura subiu no plenário do STF na sessão de 15/2/2006, quando os ministros Marco Aurélio e Cezar Peluso embrenharam-se numa diatribe que, editada pelos zelosos escrivães da corte, ainda assim dá o tom das controvérsias jurídicas. Jurídicas ma non troppo.

Meio a contragosto divulguei a íntegra do acórdão que foi publicado no DJ de 9/6 (ADI 3132/SE – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – DJ 9/6/2006), pois ele fecha uma audiência pública instaurada pelo Irib. Afinal, Roma locuta, causa finita. (http://www.irib.org.br/notas_noti/indiceaudienciaX.asp).

Mas a muitos de nós a decisão causou um mal-estar. Lá pelas tantas, Sua Excelência o ministro Marco Aurélio, confessando-se pouco simpático à modelagem do serviço notarial e registral no Brasil, sentenciou: “Penso haver algo discrepante do que podemos assentar como provido de razoabilidade, tendo em conta, ante um serviço público – ressalto – obrigatório, que titulares cheguem a perceber, por mês, quinhentos, seiscentos, um milhão de reais. No entanto, isso não é argumento para deixar de dar eficácia ao texto primitivo da Constituição de 1988”.

Imediatamente me veio à mente a frase atribuída ao Barão de Itararé, o jornalista Aparício Torelly: “ou restaura-se a moralidade, ou locupletemo-nos todos”.
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É que muitos de nós, notários e registradores – diria que a esmagadora maioria, pouco menos do que a totalidade – recebemos muito menos do que o alvitrado pelo Sr. Ministro. Muitos já estavam se alistando no rol generoso do Sr. Ministro: “locupletemo-0nos todos”.

Ironias à parte, o vezo de julgar a regra pela exceção é um mal juízo. A leitura atenta da interlocução ministerial levar-nos-ia a conclusões paradoxais. Por exemplo, de que a aviação civil deveria ser proibida pela queda de algumas aeronaves. Podemos assentar que esse juízo seria “provido de razoabilidade”.

É certamente deprimente testemunhar um colóquio tão arrevezado instaurado na mais alta corte do país. Tal fato nos dá a medida da necessidade de esclarecer nossos julgadores, apontando o caminho virtuoso.

O tabeliado não morre. Jamais!

um pitoresco julgamento em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, empolga os debates jurídicos no Brasil. Discussões jurídico-metafísicos, se preferirem.

Desde a defesa de uma tese de doutoramento, sustentando os direitos autorais de uma obra psicografada, nunca vi por estas plagas uma discussão tão bizarra.

Trata-se do seguinte: uma carta psicografada foi utilizada em um Júri no município de Viamão, Região Metropolitana de Porto Alegre – o que gerou grande polêmica na Justiça gaúcha. A discussão foi motivada pela decisão que absolveu uma mulher suspeita de mandar matar o tabelião local. Diz a nota publicada no insuspeito Estadão: para buscar a absolvição da acusada, o advogado de defesa “usou, entre outros argumentos, uma carta supostamente ditada pelo morto em um centro espírita da Capital”.

Temos estudado as reminiscências medievais do tabeliado português na atividade notarial brasileira, sustentando a perenidade da instituição. Com a nótula jornalística descobri que, mais profundamente do que imaginamos, a fé pública notarial, mesmo ditada além-túmulo, acaba rendendo uma credibilidade inesperada. Francamente!

Para saber detalhes:
http://www.estadao.com.br/ultimas/cidades/noticias/2006/mai/30/393.htm
http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2006/05/354646.shtml
http://www.debrasilia.com/index2.php?pag=ver_noticia&cod_noticia=4300

Reforma agrária e o registro de imóveis – 2

Os informativos do Supremo nesta semana claudicante de feriados religiosos (falo do jogo do Brasil e de corpus christi) estiveram povoados de notas interessantes.

Bem, tenho chamado de interessantes as nótulas publicadas num diário eletrônico que, de interessante mesmo, rigorosamente falando, só mesmo o fato de representar a fonte para se conhecer o pensamento da Suprema Corte constitucional do país acerca de temas que obviamente não mereceriam a abonação de uma Corte derradeira.

Mas vamos lá, haveremos de festejar o fato de que o STF, talvez repentinamente inspirado pela necessidade de legitimar as desapropriações imobiliárias para fins de reforma agrária, venha reiteradamente decidindo que o registro é fundamental para garantia das situações jurídicas. Haveremos de nos animar sim, cum granus salis entretanto, pois o valor do registro, inesperadamente salientado, vem de molde a sustentar a tese que afinal vitoriou.

Mas vamos à nótula suprema.
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O Supremo Tribunal Federal (STF), em reunião plenária e por maioria de votos, manteve a desapropriação para fins de reforma agrária da Fazenda São Roque-Águas Sulfurosas, no município de Lages, em Santa Catarina. A desapropriação havia sido contestada nos Mandados de Segurança 25299 e 25304. Em 29 de março de 2005, o ministro-relator Sepúlveda Pertence deferiu as liminares, por tratar-se de casos com peculiaridades específicas.

Os advogados dos herdeiros do imóvel rural alegaram que a área pertencente a cada um deles não ultrapassa 7,6 módulos fiscais o que, de acordo com a legislação específica, caracteriza média propriedade, não sujeita à desapropriação, segundo o artigo 4º da Lei 8629/93 e o inciso I, do artigo 185 da Constituição Federal. Alegaram também falta de fundamentação para se determinar os índices de produtividade das terras e excesso de prazo para a conclusão do processo de desapropriação que foi decretada antes da conclusão do processo administrativo.

Na sessão plenária de hoje (14/06) Pertence ponderou que para examinar as dimensões da Fazenda São Roque foi necessário avaliar “o estado dos registros públicos do imóvel em questão” que demonstrou tratar-se de bem sujeito ao regime de condomínio, doado a inúmeros herdeiros, a título de adiantamento de herança, com cláusulas de reserva de usufruto, inalienabilidade, impenhorabilidade, incomunicabilidade, entre outras. “Anotação que refutaria a tese do desmembramento do bem”, disse o ministro. Ele acrescentou que os registros e averbações posteriores não indicam divisão ou desmembramento, assim “não há como se imaginar qualquer eficácia de eventual repartição do imóvel”.

O relator disse, ainda, que houve a tentativa da divisão da área, após o decreto de desapropriação, por meio de escritura pública, sem registro. Dessa maneira a fazenda permaneceu unitária, com uma única matrícula no registro de imóveis. Pertence acrescentou que a jurisprudência do Supremo é vasta em casos da espécie.

Em relação à alegação de que a divisão ocorreu de fato porque houve o recolhimento individualizado do Imposto Territorial Rural (ITR), o ministro citou votos do ministro Eros Grau em julgamentos anteriores. O entendimento [sobre a aplicação do parágrafo 6º, do artigo 46 da Lei nº 4504/64 (Estatuto da Terra)] é de que toda norma jurídica deve sua razão a determinada finalidade. Assim, “a expressão ‘para os fins desta Lei’, é a de instrumentar o cálculo do coeficiente de progressividade do Imposto Territorial Rural (ITR) a fim de evitar a solidariedade passiva dos condôminos no pagamento do tributo”.

Para as demais alegações da defesa, o relator adotou os fundamentos do parecer do Ministério Público Federal, que opinou pela denegação dos mandados.

Ao final prevaleceu o entendimento de Sepúlveda Pertence pela denegação da ordem, no que foi seguido pela maioria, vencido o ministro Gilmar Mendes.

Luzes & trevas: como identificar?

Li com vivo interesse as considerações do ilustre Dr. Ildeu Lopes Guerra – “Direito registral imobiliário: luzes e trevas”, BE IRIB # 2.450, de 26/05/2006 [aqui]; as consequentes e ponderosas explanações do Dr. Sérgio Jacomino no mesmo Boletim [aqui], sob o título “Lux in tenebris lucet”, e as posteriores abordagens feitas pelo igualmente ilustre Dr. Helvécio Vieira no blogue – Luz in tenebris lucet – respondeo [aqui]).

E desde já devo dizer que adiro in totum às ponderações do Dr. Sérgio Jacomino. Não por um simples espírito de corporativismo, comodismo ou conveniência. Mas por entender que melhor refletem o âmago do assunto.

Preliminarmente, não acredito que a indignação dos articulistas seja de todo imotivadas. As exigências de que se queiram devem ser reais e inúmeras. Mas a questão é: são infundadas? Somente a resposta positiva a esta indagação justifica a indignação.

Evidente, fazer alusão a “inúmeras e infindáveis exigências, essas, muitas das vezes, imprecisas, vagas e sem parâmetro algum de uniformidade no tocante aos registros de incorporações imobiliárias” não é suficiente para sentenciar a culpa de alguns registradores imobiliários, ainda que minoria, seja em “BH e cercanias”, seja em qualquer outra parte do território nacional, pelo “profundo abatimento e aflição que recai sobre” os bravos empreendedores da construção civil, diga-se de passagem, nem todos tão preocupados com a regularidade de seus empreendimentos, salvo quando a conveniência o exige. Acreditamos, também, que estes representam a minoria.

O certo é que as incorporações imobiliárias não são tão evidentes como os articulistas querem demonstrar, ao dizer: “a lei é uma só” (Dr. Ildeu); e, “uma incorporação que obteve sucesso na sua condição registral junto à determinada serventia imobiliária, em outra, na qual a documentação continha exatamente a mesma uniformidade e elencado de documentos, vê-se absolutamente frustrada” (Dr. Helvécio). Os doutos articulistas sabem que o Direito não é uma fórmula matemática. Se o fosse não teríamos doutrinadores e julgadores com a independência do “livre convencimento”.
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Síndrome do beliche dominial

Há muito tempo venho insistindo na tese de que os graves problemas fundiários que ocorrem na região norte do Brasil são devidos à falta de um bom sistema de registro de direitos. Quando os há, falta um detalhe importante: fazê-los valer, de maneira eficaz.

Pode parecer chocante dizer isso, mas a morte de Doroty Stang foi a crônica de uma morte anunciada, pois as concessões de direitos sobre terras devolutas, sem qualquer mecanismo de transparência e publicidade da situação jurídica, são evidentes fatores de conflitos e disputas.

Títulos precários, concedidos pelo Incra ou pelos Estados, naquela região conflagrada, se perdem na penumbra de uma gaveta e os conflitos originados com essa propriedade são resolvidos violentamente. Há uma verdadeira balbúrdia possessória (e de direitos), com trespasse em títulos precários que são emitidos sem qualquer controle público e social. Você, caro leitor, seria capaz de apontar onde se acha um registro fidedigno dos títulos concedidos pelo Estado ou pelo Incra a centenas de milhares de ocupantes de terras públicas?

A superposição de glebas, fato que ocorre pela falta de mecanismos eficientes de especialização e registro, gera conflitos sucessivos que estão longe de acabar.

A Folha de Boa Vista, na sua edição de 12 do corrente, traz uma confirmação dessa triste situação.
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Diz a matéria que “a sinalização de criação da Reserva Extrativista Baixo Rio Branco-Jauaperi pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama), sobrepondo outra criada no ano passado pelo Estado, será resolvida na Justiça”. A área em litígio envolve o domínio sobre 285 mil hectares.

O curioso, aqui, é que a superposição de áreas decorre da iniciativa do Ibama, que demarca uma uma área destinada reserva ambiental que se acha registrada no cartório em nome do Estado de Roraima.

Diz o procurador: “A área é do Estado. Não existe sequer controvérsia. A interferência da União é totalmente absurda e será barrada pelo Judiciário”, acrescentando que “o Governo Federal vem, de forma reiterada, espoliando a base territorial de Roraima, através de reservas ambientais e indígenas, dificultando o desenvolvimento sócio-econômico”.

Vale a pena conferir a matéria: http://www.folhabv.com.br/noticia.php?Id=10182

Reforma agrária e registro imobiliário

O site do STF publicou ontem interessante nota – “STF mantém desapropriação de imóvel rural em Pernambuco”. A notícia é deveras interessante e vale a pena comentar, já que envolve a necessidade do registro de partilha decorrente de eventual sucessão para livrar a propriedade partilhada da desapropriação para fins de reforma agrária.

Justamente por não ter sido objeto de registro a partilha, o Plenário do Supremo, por maioria de votos, manteve a desapropriação para fins de reforma agrária de imóvel rural em Pernambuco, contestada no Mandado de Segurança (MS) 24573.

Na sessão plenária de 25/05/2005 o ministro Eros Grau votou pela denegação da segurança por divergir do relator, ministro Gilmar Mendes, em relação à aplicação do parágrafo 6º, do artigo 46 da Lei nº 4504/64 (Estatuto da Terra).

Diz a lei: “§ 6º No caso de imóvel rural em comum por força de herança, as partes ideais, para os fins desta Lei, serão consideradas como se divisão houvesse, devendo ser cadastrada a área que, na partilha, tocaria a cada herdeiro e admitidos os demais dados médios verificados na área total do imóvel rural”.

Para Eros Grau toda norma jurídica deve sua razão a determinada finalidade. Assim, “a expressão ‘para os fins desta Lei’, é a de instrumentar o cálculo do coeficiente de progressividade do Imposto Territorial Rural (ITR) a fim de evitar a solidariedade passiva dos condôminos no pagamento do tributo”.

Em seu voto-vista proferido (12/06) a ministra Ellen Gracie acompanhou o relator, ministro Gilmar Mendes, que concedia a segurança para que fosse suspensa a desapropriação do imóvel pelo Incra. O relator entendeu que as partes ideais dos condôminos, médias propriedades, não estariam sujeitas à expropriação. No mesmo sentido votaram os ministros Marco Aurélio e Celso de Mello.

O interessante na nota reside justamente no voto do ministro Eros Grau. Segundo a notícia, para que a desapropriação fosse afastada, a divisão das médias propriedades teria que estar registrada em cartório, assim como informada ao Incra.

O julgamento terminou com cinco votos a quatro, prevalecendo o entendimento de Eros Grau, seguido pelos ministros Joaquim Barbosa, Carlos Ayres Britto, Cezar Peluso e Sepúlveda Pertence.

Vamos aguardar a publicação do aresto, pois a orientação do Supremo pode acarretar uma renovação no entendimento da norma e trazer, com isso, maior segurança ao sistema.

Direito de propriedade ameaçado?

Em artigo publicado hoje no Valor Econômico (legislação & tributos, E2), assinado por Danilo Pieri Pereira, questiona-se o Provimento 1/2006 do TST, que na opinião do autor “ameaça de maneira gravosa o direito do cidadão de dispor de seus bens livremente”.

O Provimento versa sobre a desconstituição da personalidade jurídica a fim de alcançar a responsabilização dos sócios. Pretende o ato normativo “proteger o terceiro de boa-fé contra a má-fé dos sócios executados, que, ao se sentirem ameaçados em seu patrimônio pessoal, buscam se desfazer de seus bens, valendo-se, para tanto, de certidões negativas na Justiça do Trabalho”.

O advogado e articulista também repercute esse tema: “com isso, em tese o terceiro, quando negociar bens com alguém que é ou já foi sócio de alguma empresa, poderá evitar a conclusão do negócio, caso detecte que o alienante é devedor na Justiça do Trabalho”.

Será?
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Basta responder a uma simples pergunta: a quem ocorreria diligenciar pesquisas na JT em nome do alienante (pessoa jurídica) e, além disso, solicitar certidões das juntas comerciais ou registros civis de pessoas jurídicas e, com essa informação, extrair certidões em nome dos sócios, diretores, membros do conselho de administração, gerentes estatutários, diretores, advogados etc.?

Francamente! E o custo de diligência e investigação? E a possibilidade de a ação ser proposta em outras comarcas? A aquisição de bens imóveis passa a ser uma aventura lotérica, logo se vê!

Voltamos pateticamente às discussões que se acham nas origens da legislação hipotecária decimonômica, quando se buscava obviar a existência dos danosos créditos privilegiados e ocultos. É disso que deveríamos estar a tratar – publicidade da constrição judicial pelos meios mais modernos e eficazes de publicidade jurídica. Não deveríamos estar perdendo tempo em reformar a publicidade deficiente dos distribuidores judiciais.

Diligenciar uma certidão negativa para realizar com segurança um negócio jurídico imobiliário é quase uma probatio diabolica. Ordinariamente, não se extraem certidões que abarquem a amplitude de todas as ocorrências possíveis. Algumas vezes a iniciativa é simplesmente inócua. Só por essa razão, o mecanismo alvitrado pelo TST deve ser considerado inadequado e, portanto, insuficiente para garantir o terceiro de boa fé. Estamos incorrendo e maiores custos transacionais para a circulação das riquezas. Isso é genuinamente inflacionar o “custo Brasil”.

Somente com o registro das constrições judiciais vamos alcançar o nível de segurança desejado pelo sistema.

As penhoras e as recentes investidas legislativas (como a disseminação de indisponibilidades decretadas a granel) estão a demandar um estudo detido sobre a imobilização da propriedade, pois, concordando com Danilo Pieri Pereira, o Direito não pode prejudicar nem minorias, nem favorecer maiorias.

O direito de Propriedade está ameaçado

O novo provimento da Corregedoria-Geral do Tribunal Superior do Trabalho (TST) recomenda aos juízes corregedores dos tribunais regionais do trabalho (TRTs) que determinem aos magistrados de primeira instância que, ao optarem pela desconsideração da pessoa jurídica no processo de execução, voltando-se contra o patrimônio dos sócios, ordenem também a retificação da autuação do processo, para que figurem no pólo passivo os nomes das pessoas físicas envolvidas, a fim de que essas não possam obter certidões negativas de débitos trabalhistas em cartório.

Na prática, o juiz da execução, ao deferir o pedido do autor acerca da desconsideração da pessoa jurídica, deverá determinar, no mesmo despacho que ordenar a citação para pagamento, garantia da execução ou penhora de bens, que seja feita a reautuação e inclusão do sócio executado no rol de devedores daquele fórum trabalhista, evitando, assim, a expedição de certidões negativas em seu nome.

Com isso, em tese o terceiro, quando negociar bens com alguém que é ou já foi sócio de alguma empresa, poderá evitar a conclusão do negócio, caso detecte que o alienante é devedor na Justiça do Trabalho, ao solicitar uma certidão negativa. Embora a medida a princípio pareça salutar, resguardando tanto o direito do trabalhador como do terceiro de boa-fé, ela pode também causar graves violações ao direito de propriedade, garantido constitucionalmente.

A desconsideração da pessoa jurídica ganhou notoriedade no país com a edição do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que prevê que “o juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração”.

Tendo em vista que o CDC é de aplicabilidade restrita às relações de consumo, a jurisprudência se dividiu quanto à possibilidade de desconsideração da pessoa jurídica também em litígios de outras naturezas, como os trabalhistas. A discussão perdeu espaço com a entrada em vigor do novo Código Civil que, além de adotar para outras relações obrigacionais o instituto já vigente para as relações de consumo, também ampliou a responsabilidade pessoal das pessoas físicas, atribuindo responsabilidade pela dívida não só ao sócio, mas também aos administradores da sociedade respectiva.

Dada a vasta possibilidade de administração e gestão conferida pelas leis societárias, a jurisprudência trabalhista vem cada vez mais ampliando o grau de incidência da norma e alargando enormemente o conceito de desconsideração da pessoa jurídica, para estabelecer responsabilidade também aos membros do conselho de administração, gerentes estatutários e delegados e diretores das sociedades por ações.

De qualquer sorte, o princípio geral que deve nortear a amplitude da desconsideração da pessoa jurídica de forma justa e racional parece ser o da responsabilidade pessoal do gestor empresarial apenas por seus atos de gestão. Nessa linha, só responde subjetivamente aquele que puder ser responsabilizado pessoalmente pelos eventuais prejuízos causados ao trabalhador decorrentes de uma má-gestão sua no tempo da prestação de serviços ou do pagamento do crédito trabalhista.

Ocorre que, no afã de dar satisfação a créditos trabalhistas não garantidos pela sociedade, muitos credores acabam por obter a determinação judicial de constrição de patrimônio de pessoas que não figuraram no quadro societário à época de prestação de serviços, o bloqueio de bens de sujeitos que sequer possuíam poderes de gestão societária e até mesmo de procuradores dos acionistas, conselheiros e administradores, normalmente advogados, que apenas tiveram poderes de representação em troca de honorários por serviços prestados, nos termos da lei. Há que se ressaltar, ademais, que não é incomum estarem defasadas as informações societárias advindas das juntas comerciais dos Estados.

Assim, embora o Provimento nº 1, de 2006, se apresente bastante salutar quando corretamente aplicado, ele igualmente ameaça de maneira gravosa o direito do cidadão de dispor livremente de seus bens, na medida em que se poderá lançar no rol de devedores da Justiça do Trabalho pessoas que nada têm a ver com a execução trabalhista em questão, antes mesmo que a sua possibilidade de responsabilização seja confirmada, o que viola o direito de propriedade, garantido constitucionalmente.

A parte final do novo provimento, aliás, prevê que, uma vez comprovada a inexistência de responsabilidade desses sócios, seja imediatamente cancelada a inscrição da pessoa judicial da lista negra de devedores. Isso demonstra claramente que a medida tende a acusar primeiro para perguntar depois. Quanto aos eventuais prejuízos sofridos moral e materialmente por aquele que se viu impedido de obter certidões negativas, o provimento nada esclarece.

Como se vê, a nova recomendação do TST, que deverá passar por reformulações e adaptações pelas corregedorias de cada tribunal regional do trabalho do país nos próximos meses, provavelmente ainda causará muita discussão e, até que se chegue a um entendimento razoável de como aplicá-la de forma equânime, o direito de propriedade do cidadão corre o risco de ser vilipendiado. E não venham com estatísticas para justificar que, em mil casos, apenas 50 apresentaram problemas, pois o direito não pode prejudicar nem as minorias e nem favorecer as maiorias.

Danilo Pieri Pereira é advogado da área trabalhista do escritório Demarest e Almeida Advogados

Conselho de notários e registradores – # 4


Ainda comentando o recorte institucional e corporativo da OAB, no Informativo do STF de 9/6/2006, o Tribunal mantém isenção de contribuição sindical descrita no Estatuto da OAB. Uma ação direta de inconstitucionalidade foi ajuizada pela Confederação Nacional das Profissões Liberais (CNPL), que questionava o artigo 47 da Lei Federal nº 8.906/94 do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

A norma isenta o pagamento obrigatório de contribuição sindical para os advogados que já pagam a contribuição anual à Ordem.

O ministro-relator Eros Grau ressaltou: “o texto normativo atribui à OAB a função tradicionalmente desempenhada pelos sindicatos, ou seja, a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, com a ressalva de que a defesa desempenhada pela Ordem ampara todos os inscritos, não apenas os empregados, como o fazem os sindicatos. Não há, destarte, como traçar relação de igualdade entre os sindicatos de advogados e os demais, já que as funções que deveriam, em tese, ser por eles desempenhadas foram atribuídas à Ordem dos Advogados”.

Fica para reflexão.

Certificação digital na Justiça

A empresa Certisign iniciou a comercialização de certificados da AC-Jus.

Regida por um Comitê Gestor, a Autoridade Certificadora do Sistema Justiça Federal (AC-JUS) foi formalizada pela Resolução Conjunta nº 01, de 20 de dezembro de 2004, e tem como função a definição das normas de Certificação Digital, de acordo com a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil), a serem adotadas no âmbito do Poder Judiciário.

A AC-JUS é uma Autoridade Certificadora normativa e não emite certificados digitais. Foi criada para regulamentar e reger as políticas e práticas de emissão e controle de certificados digitais de suas ACs subseqüentes, como a AC CertiSign JUS.

A certificação será utilizada para garantir a autenticidade de documentos eletrônicos que circulam na Justiça brasileira, facilitando a migração de processos em papéis para os meios eletrônicos.

Veja mais: http://www.certisign.com.br/produtos/certJUS/certJUS.jsp