regularização fundiária

Argentum hoc facit

Estou às tontas com os eventos se sucedendo!

De qualquer maneira, penso que um fórum permanente para discussão da regularização fundiária ainda é oportuno. A (falsa) questão da gratuidade deve ser debatida, sim, fazendo-se abstração das propostas atabalhoadas que espocam aqui e ali erraticamente.

Penso que estão cobertos de razão os que se põem a atacar uma gratuidade plenária, indistintamente irradiada e colhendo todos – quem possa suportá-la ou não, quem queira ou não – ultrapassando (como fez a Lei 10931/2004) os limites constitucionais que estabelecem claramente que a questão dos emolumentos é matéria estadual. Claro! Não é possível tratar os desiguais de forma igual (nem os iguais de forma diferente…) reza o velho aforismo rui-barbosiano. Uma coisa é a regularização a ser feita em São Paulo, Capital. Outra, muito distinta é a que se fará nesse brazilsão afora.

Legitimidade

Basta que saiba que essa questão da gratuidade não foi apresentada aos registradores. Não houve deliberação acerca desse grave assunto. E o mais patético é que nós, os registradores, temos propostas alternativas que não chegaram a ser discutidas, aferrados que todos estão a um modelo que é, em essência, uma aberração jurídica e representa uma violência às regras do jogo. Mas, que regras? – note que a pergunta esconde um ardil ideológico – que regras são essas? Por óbvio (pergunte a qualquer pessoa fora desse nosso contexto) as regras que vedam o Estado, salvo hipóteses extraordinárias, requisitar, compulsoriamente, serviços ou expropriar bens. As políticas públicas que são obrigação do Estado devem por ele ser concretizadas e se o Estado quer deferir a gratuidade, ótimo, deve então cuidar dos meios para estipendiar os serviços prestados, ora bolas!

o sábio aponta para a lua, o tolo olha para o dedo!

O ardil ideológico consiste em confundir o dedo com a lua: quando se nega a possibilidade de o Estado ordinariamente requisitar/expropriar bens e serviços a resposta vem fulminante: “mas o serviço é público… o que dá pode retirar!”. Ora o serviço é público, sim, mas a justa remuneração está aninhada no bojo de um contrato com a administração – que é uma delegação pública. Essa retribuição não pode ser tocada pelo Estado, sob pena de anular, na prática, a substância da delegação.

Em suma: pode o Estado decretar a gratuidade, sim, mas deve cuidar de estipendiar ao menos o custo dos serviços.

Exitus acta probat?

Não sei não, parece que o móvel dessa atitute política é a certeza de que, estando todos envolvidos numa nobre causa (regularização), os fins, bem, os fins haverão de justificar os meios… Isso lembra alguma triste passagem da gloriosa nomenklatura.

E por aí vamos, atropelando direitos, impondo gratuidades, acreditando que devemos trabalhar graciosamente como uma espécie de retribuição às prebendas que se originam das tetas generosas do estado brasileiro. Um castigo, portanto! Que paguem os nababos da administração pública! Que suportem os ônus os que se deliciam com os bônus. Essa elite deve ser abalada pelo rumor das ruas, pelo clamor dos despossuídos… Fala sério, essa visão denuncia simplesmente um preconceito estúpido. Esse discurso transitou cavalgando os idealismos que animaram as loucuras das esquerdas nos trópicos.

Vivemos um outro tempo. Os cartórios são colocados e disputados em concurso. Os melhores acedem a esse posto movidos logicamente por um cálculo que envolve uma opção de vida e um investimento. Legitimamente almejam conquistar esse posto e isso tem garantido um desenvolvimento notável da atividade mundo afora. Os melhores chegam lá. E quem ganha é a sociedade.

A imposição da gratuidade, verticalmente, sem prévio envolvimento dos parceiros, é simplesmente autoritarismo. Pense numa situação análoga, que se pudesse decretar, candidamente, por meio de uma lei de duvidosa constitucionalidade, que os advogados devessem atuar graciosamente nas ações de usucapião, já que estão patrocinando causas de uma população de baixo poder aquisitivo e que não pode suportar os honorários profissionais.

Crônica de uma estupidez anunciada!

Se v. observar bem, muito bem, a gratuidade imposta aos registradores civis (no registro de nascimento) acarretou um aumento do sub-registro – justamente o fenômeno que a medida visava atacar. Os dados são do IBGE. Esta é uma crônica de uma estupidez anunciada. Basta verificar que a Unicef, consciente dos problemas que a gratuitade plenária causou, vem aprofundando o diálogo com os registradores civis para superar a grave situação criada.

Ora, se a gratuidade, por várias razões, é fundamental para enfeixar a série de medidas que se vem tomando, acho que o chamamento à cooperação deveria ser por meio de parcerias, não por imposição vertical, por vontade do príncipe, uma atitude que, no limite, representa grave violência às regras de um estado democrático de direito, não se esquecendo que o modelo em vigor no país, de delegação do serviço público, está previsto na constituição federal e o registrador tem direito aos emolumentos integrais (arg. do art. 28 da Lei 8.935/94).

Temo que, a exemplo do vem ocorrendo no cenário político brasileiro, e parafraseando um escritor considerado decadente (mas de minha especial predileção, A. Huxley), temo que nesse caso não sejam os fins a justificar os meios; longe disso! são os meios que acabarão por determinar os fins. Ou como dizem os mineiros de São Tomás de Aquino: Sabe-se quando uma coisa começa mal… ela termina pior!

Um comentário sobre “regularização fundiária

  1. SJ,

    Registral está bacana, está de parabéns.
    Acrescento que poderia mencionar mais referências, como links de matérias sobre o assunto.
    Também pode ser legal destacar os instrumentos da regularização, o que ocorre hoje, os efeitos que poderá ter, através de pequenas notas também.
    O assunto gratuidade ficou bem claro, e isso é super importante, não vejo ninguém tocar no tema…

    Enfim, está no caminho…

    Abs

    Paty Simão

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