Usucapião extrajudicial – nullum gratuitum prandium

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A decisão que pode ver aqui: Processo 1072167-67.2015.8.26.0100, de 15/3/2016, de lavra do Dr. Paulo César Batista dos Santos, é emblemática dos problemas que todos advinham para o processo de usucapião extrajudicial.

O digno magistrado corajosamente, ressalvando sua convicção pessoal, põe de manifesto o nó górdio do problema: a parte, beneficiária da justiça gratuita, deveria arcar com o valor das despesas para confecção da prova pericial, imprescindível ao julgamento do feito, realizada em seu total benefício.

Segundo o magistrado, a perícia de engenharia, na ação de usucapião, é das mais complexas e onerosas, de modo que o valor pago pela Defensoria Pública, incontestavelmente, não é suficiente para custear as despesas periciais, não sendo razoável aviltar o trabalho pericial com contraprestação desproporcional.

O ressarcimento das despesas tidas com a execução do trabalho visa ao reembolso de materiais, transporte, fotos etc., que não são abrangidos pela gratuidade e não significam acréscimo patrimonial ao expert.

Quem arcará com tais despesas? O estado não o faz; a parte tem o seu direito consagrado na lei e ratificado pelo entendimento majoritário dos tribunais. Como ficam essas ações em que a parte não se dispõe a pagar a perícia? O Estado não provê os recursos; o perito não se submete à situação. Como ficam essas ações? Dormitarão no limbo?

O fenômeno não é novo. Afinal, there ain’t no such thing as a free lunch!

Confiram:

1. Algo está fora da ordem emolumentar. Sérgio Jacomino.
2. Gratuidades – chegaremos aos limites da razoabilidade? Sérgio Jacomino.

Simulação e a qualificação registral – bis

Neste mesmo blogue lançamos a seguinte questão: pode o registrador qualificar um título de venda e compra, de extração notarial, e impedir o seu acesso baseado em elementos que levam à convicção de tratar-se de simulação? O texto pode ser visto aqui.

Posteriormente, no DJe de 12.9.2016, a Corregedoria-Geral de Justiça de São Paulo foi instada a decidir um caso em que o tema da ocorrência de eventual simulação foi enfrentado e a decisão, neste caso concreto, foi em sentido contrário à anteriormente debatida.

Façamos desde logo uma advertência. Não se trata, aqui, de censurar ou de criticar as decisões que os registradores, em sua ordem, tomaram no exercício regular de sua função. Ambas as posições são respeitáveis. A lei garante a independência jurídica do profissional do direito que atua na qualificação dos títulos (art. 28 c.c. art. 3º da Lei 8.935/1994). O objetivo destas breves considerações é eminentemente acadêmico.

O tabelião de notas e o registrador imobiliário devem deter-se, antes da prática de atos de seu ofício, diante de “fundados indícios de fraude à lei, prejuízo às partes, ou dúvidas sobre as manifestações de vontade”. É a dicção das Normas de Serviço de São Paulo. Não será bastante a suspeita fundada em impressões subjetivas – tanto do notário quanto do registrador.

No caso em tela, o fato de terem sido firmados os instrumentos notariais em dias consecutivos não é motivo suficiente para configurar os “fundados indícios” de fraude à lei. “Não se descarta, frise-se, a possibilidade de ter havido simulação. Porém, não compete ao Sr. Oficial investigar elementos subjetivos inerentes à formação do título”, decidiu a CGJSP.

A r. decisão traz à balha o escólio de Narciso Orlandi Neto:

“Problemas relativos ao consentimento das partes dizem respeito ao título, tanto quanto sua representação e a elaboração material do instrumento. Assim, se houve fraude, se a assinatura do transmitente foi falsificada, se o instrumento público não consta dos livros de nenhum notário, se a procuração que serviu na representação de uma das partes é falsa, se o consentimento do alienante foi obtido com violência, são todos problemas atinentes ao título. Podem afetar o registro, mas obliquamente. Só podem determinar o cancelamento do registro, em cumprimento de sentença que declare a nulidade do título e, em conseqüência, do registro.” (Retificação do Registro de Imóveis, Ed. Oliveira Mendes, pág. 192).

O tema é atual e merece dedicada atenção dos profissionais da fé pública.

Procedimento administrativo disciplinar. Tabelião de Notas. Falta funcional. Simulação – vício de consentimento.

PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR – Suposta simulação contratual, como forma de violar direitos sucessórios – Não cabe ao Sr. Oficial fazer análise minudente das declarações de vontade dos contratantes. Eventual simulação há de ser alegada em vias ordinárias, não se podendo impor ao Sr. Oficial que obstasse o registro. Recurso Desprovido. (Processo CG 0012232-84.2014.8.26.0606, Suzano, j. 9/8/2016, DJe 12/9/2016, des. Manoel de Queiroz Pereira Calças).